A natureza contratual dos acordos de colaboração premiada e suas repercussões no direito civil brasileiro

AutorGustavo Tepedino e Paula Greco Bandeira
Ocupação do AutorProfessor titular de Direito Civil e ex-diretor da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sócio do escritório Gustavo Tepedino Advogados/Professora Adjunta da Faculdade de Direito da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sócia do escritório Gustavo Tepedino Advogados
Páginas235-259
A natureza contratual dos acordos de
colaboração premiada e suas repercussões
no direito civil brasileiro
Gustavo Tepedino1
Paula Greco Bandeira2
Sumário: – 1. A natureza contratual dos acordos de colaboração
premiada; – 2. Critérios de interpretação dos acordos de colabora-
ção premiada; – 3. Incidência dos princípios contratuais; – 4. A
disciplina do adimplemento e inadimplemento; – 5. Conclusão.3
1. A natureza contratual dos acordos de colaboração
premiada
Os acordos de colaboração premiada foram incorporados ao
ordenamento jurídico brasileiro pela Lei n.º 12.850/2013, que
dispõe sobre crime de organização criminosa, investigação pe-
nal, meios de obtenção da prova e procedimento criminal. De-
senvolvido com vistas a maior efetividade na persecução penal,
tal instrumento representa mecanismo de justiça consensual.
A colaboração premiada traduz, nessa direção, modalidade
de cooperação no processo criminal, em que se busca a obtenção
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1 Professor titular de Direito Civil e ex-diretor da Faculdade de Direito
da Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ). Sócio do escritório
Gustavo Tepedino Advogados.
2 Professora Adjunta da Faculdade de Direito da Universidade do Estado
do Rio de Janeiro (UERJ). Sócia do escritório Gustavo Tepedino Advogados.
3 Os autores agradecem à Mestranda em Direito Civil da UERJ, Bruna
Vilanova Machado, pela pesquisa jurisprudencial e doutrinária e gentil revi-
são do original.
de provas de difícil esclarecimento, especialmente quanto à au-
toria e materialidade dos crimes de organização criminosa e cor-
relatos, por meio de mecanismo premial para os infratores.4
Por representar encontro de vontades entre o colaborador e
o Ministério Público ou delegado de polícia, destinado à produ-
ção de efeitos jurídicos, o acordo de colaboração premiada tra-
duz verdadeiro contrato, celebrado intuitu personae, segundo a
figura do colaborador, e firmado no âmbito do processo penal.
Pode-se afirmar, assim, que, do ponto de vista técnico-jurídi-
co, o acordo de colaboração premiada consiste em negócio jurídi-
co de natureza processual,5 personalíssimo,6 atípico e sui generis,
como, de resto, já reconheceu o Supremo Tribunal Federal.
Em tal perspectiva, a Orientação Conjunta n.º 1/2018, for-
malizada pelas 2ª e 5ª Câmaras de Coordenação e Revisão de
Combate à Corrupção do Ministério Público Federal, determina
que “o acordo de colaboração premiada é negócio jurídico pro-
cessual, meio de obtenção de prova, que pressupõe utilidade e
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4 Sobre o ponto: “Uma das razões propulsoras desse protagonismo da
colaboração premiada é o também protagonismo assumido por uma política
criminal de combate à criminalidade complexa, especialmente envolvendo
agentes políticos. Nesses casos, lança-se mão da colaboração premiada como
um privilegiado meio de obtenção de prova relativamente a fatos de dificíli-
mo esclarecimento – seja em relação à materialidade, seja em relação à
autoria e sua delimitação” (André Luis Callegari, Introdução. In: André Luis
Callegari (Coord.), Colaboração Premiada: aspectos teóricos e práticos, São
Paulo: Saraiva, 2019, pp. 9-10).
5 Nesse sentido, v. STF, AgR no Inq 4.619/DF, 1ª T., Rel. Min. Luiz Fux,
julg. 10.9.2018; STF, Questão de Ordem no Inq 4.483/DF, Tribunal Pleno,
Rel. Min. Edson Fachin, julg. 21.9.2017; STF, Questão de Ordem na Pet
7.074/DF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Edson Fachin, julg. 29.6.2017 e STF,
HC 127.483/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, julg. 27.8.2015.
6 Nessa direção, cfr. STF, RE 1.103.435/SP, Dec. Monocrática, Rel. Min.
Ricardo Lewandowski, julg. 28.2.2019; STF, MC na Rcl 30.674/RJ, Dec.
Monocrática, Rel. Min. Edson Fachin, julg. 1.6.2018; STF, AgR no Inq
4.405/DF, 1ª T., Rel. Min. Roberto Barroso, julg. 27.2.2018; STF, AgR na
Pet 6.138/DF, 2ª T., Rel. Min. Edson Fachin, julg. 21.2.2017; STF, AgR no
Rcl 21.258/PR, 2ª T., Rel. Min. Dias Toffoli, julg. 15.3.2016 e STF, HC
127.483/PR, Tribunal Pleno, Rel. Min. Dias Toffoli, julg. 27.8.2015.

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