A Repartição De Competências e o Princípio Federativo Na Constituição De 1988

AutorRodrigo Kaufmann
CargoAluno de graduação do Direito da UnB (5o semestre)

O princípio federativo constitui, hoje, uma das idéias fundantes de toda a organização do Estado Brasileiro. Essa relação entre a forma de Estado e o contexto nacional se dá de modo bastante íntimo, visto que, da implantação do sistema da Federação na realidade do país em 1891 até a atual situação constitucional, a consolidação da Federação como forma do Estado Brasileiro se fez de peculiaridades e exclusividades que a tornaram única e, portanto, rica de estudos doutrinários e interpretações constitucionais.

A sua introdução por meio do Decreto nº 1 de 1889 já destoou, por completo, dos moldes e pressupostos utilizados pelos elaboradores da Carta Americana de 1787, documento este que praticamente apresentou a moderna organização federativa ao mundo. Naquele país, o federalismo nasceu da necessidade de reunião de estados pré-existentes com o fim de, abdicando de parte da soberania em nome de um ente central, fortalecerem-se para melhor enfrentarem os desafios internacionais originários de uma realidade mundial de intensas mudanças. É importante notar que os estados que formaram a federação americana já existiam, já tinham uma certa soberania constituindo realidades sociais e políticas diversas e independentes umas das outras. No Brasil, todavia, a recepção da idéia federativa ocorreu da cúpula para a base, ou seja, de um Estado Unitário criaram-se estados-membros para constituírem o novo Sistema Federal. Desse modo, desde o início, a realidade e vida política estadual estiveram sempre condicionadas às decisões da União Federal. É claro que este fator teve influência decisiva em toda a evolução constitucional da divisão de competências entre os entes federados e, por conseguinte, mantém-se ainda evidentes reflexos na atual autonomia dos estados-membros.

A Constituição Federal de 1988, dentro desse contexto, promoveu uma grande reformulação do federalismo brasileiro. Tal modificação envolveu o abandono do sistema previsto pela Constituição de 1967 e pela Emenda nº 1 de 1969 as quais reduziram os estados e os municípios a meros receptores dos preceitos legislados pela União Federal. Essa crise do federalismo brasileiro só encontra equivalência no período de vigência da Carta Política de 1937, momento em que a concepção federal foi substituída pela estrutura unitária de Estado. Dessa maneira, é realmente mérito inegável da Constituição de 1988 a tarefa de promover a reconstrução do federalismo no Brasil. Entretanto, não coube a essa Constituição apenas a função de reestruturar o sistema da Federação no molde das fontes republicanas do federalismo constitucional mundial. A Carta Maior ainda inovou implementando novos fundamentos para o bom funcionamento dessa forma de Estado.

Entre esses novos fundamentos pode-se citar a inclusão dos Municípios no grupo dos corpos que compõem a união indissolúvel da República Federativa, expressa no primeiro artigo da Constituição de 1988. Tal fato é singular, não encontrando correspondência nas antigas Constituições brasileiras e nem tão pouco em Constituições federais estrangeiras como no caso da americana, da argentina e da alemã. Essa novidade adveio do movimento municipalista e de uma evolução do federalismo nacional a partir das Cartas de 1934 e1946, que indicava uma valorização dos temas municipais principalmente no que tange a repartição da receita federal. Desta forma, o Município erigiu-se como ente autônomo formador da República Federativa, muito ao contrário da idéia que existia até então: o município como assunto doméstico do estado-membro.

A segunda grande inovação instituída pela Lei Maior de 88 foi quanto à forma de repartição de competências entre a União, os Estados, os Municípios e o Distrito Federal. Dentro do universo constitucional, a divisão de alçadas é tópico fundamental na caracterização da tendência federalista e do próprio sistema funcional do Estado, isto porque, por essa matéria, verifica-se se, em dado país federalista, a concentração de poder é demasiada com consequente sacrifício da autonomia ou se a Federação é forte e consolidada com proporcionais e razoáveis poderes para cada ente federativo. A Constituição de 1988 sistematizou o tema e distribuiu-o nos domínios da competência geral da União (art. 21, I a XXV), competência legislativa privativa da União (art. 22, I a XXIX), competência comum da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios (art. 23, I a XII, parágrafo único) e a competência de legislação concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal (art. 24, I a XVI, §§ 1º a 4º).

A competência da legislação privativa da União...

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