A necessidade de uma lei geral do espaço no Brasil (the need for a brazilian space law)

AutorMárcia Alvarenga dos Santos, Petrônio Noronha de Souza, Ian Grosner
CargoAnalista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Doutora pela Universidade Católica de Santos (UNISANTOS). Mestre pela Universidade de Taubaté (UNITAU). E-mail: marcia.alvarenga@inpe.br https://orcid.org/0000-0003-4225-7659 - Tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE). Doutor pelo Cranfield Institute of ...
Páginas106-138
Revista Direito.UnB | Setembro – Dezembro, 2020, V. 04, N. 03 | ISSN 2357-8009 | pp. 106-138
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A NECESSIDADE DE UMA LEI GERAL DO ESPAÇO NO
BRASIL
THE NEED FOR A BRAZILIAN SPACE LAW
Márcia Alvarenga dos Santos
Analista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Doutora pela Universidade Católica de Santos (UNISANTOS).
Mestre pela Universidade de Taubaté (UNITAU).
E-mail: marcia.alvarenga@inpe.br
https://orcid.org/0000-0003-4225-7659
Petrônio Noronha de Souza
Tecnologista do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
Doutor pelo Cranfield Institute of Technology, Inglaterra.
Mestre pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE).
E-mail: petronio.souza@inpe.br
https://orcid.org/0000-0001-8465-1393
Ian Grosner
Procurador Federal.
Mestre em Direito Aeronáutico e Espacial pela Universidade de Leiden, Holanda.
E-mail: ian.grosner@presidencia.gov.br
https://orcid.org/0000-0002-1730-8023
RESUMO
A dependência dos produtos e serviços advindos das atividades espaciais tornam-
se cada vez mais premente. O setor espacial é um mercado pujante. Embora existam
atuações já bem assentadas mundialmente, há um universo de possibilidades ainda a se
explorar. Para o Brasil, esse panorama não é diferente. Movimentos políticos, jurídicos e
até acadêmicos tornam evidente que o país ambiciona alcançar metas mais ousadas. No
entanto, como a maior parte dos países latino-americanos, o país parece não dispor de
um arcabouço jurídico inspirador e seguro para garantir as atividades no setor. Este artigo
pretende analisar a legislação espacial nacional de modo a identificar sua efetividade e
propor medidas que sustentem as presentes e futuras iniciativas espaciais brasileiras.
Para alcançar esse objetivo, serão verificados alguns exemplos de estatutos produzidos
pelos Estados que possam servir, de algum modo, de referência para o legislador brasileiro,
além das recomendações de organismos internacionais. Finalmente, pretende-se propor
um instrumento regulador mínimo, que fomente o setor espacial do país, e sirva de ponto
de partida para outras iniciativas do gênero.
Palavras-chave: Direito Espacial. Lei Nacional do Espaço. Lei Espacial Brasileira.
Recebido: 12/10/2020
Aceito: 26/12/2020
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ABSTRACT
The dependence on products and services arising from space activities is becoming
increasingly urgent. The space sector is a promising market, with activities already well
established worldwide, but also a universe of possibilities yet to be explored. This scenario
is no different for Brazil. Political, legal and even academic actions make it evident that
the country aspires to achieve more daring goals. However, like most Latin American
countries, the country does not seem to have an inspiring and secure legal framework
for activities in the sector. This article intends to analyze the national space legislation
in order to identify its effectiveness and propose measures that support present and
future Brazilian space initiatives. In order to achieve this objective, some examples of
statutes produced by the states that may serve, in some way, as a reference for the
Brazilian legislator, will be verified, in addition to the recommendations of international
organizations. Finally, it is intended to propose a minimum regulatory instrument that
promotes the country’s space sector and serves as a starting point for other initiatives of
its kind.
Keywords: Space Law. National Space Law. Brazilian Space Law.
Introdução
O constituinte originário já definiu que o direito espacial deve ser tratado de forma
autônoma e independente como ramo do direito público. Assim, nos termos do art. 22,
I, da Constituição Federal (CF), compete privativamente à União legislar sobre o direito
espacial. Portanto, a Carta Magna brasileira, de modo muito claro, estabeleceu uma
competência exclusiva do ente central da federação para normatizar sobre o assunto.
O Brasil possui um programa espacial longevo, que teve início nos anos 1960, ainda
durante a corrida espacial travada entre duas grandes potências espaciais mundiais
da época: os Estados Unidos da América (EUA) e a União das Repúblicas Socialistas
Soviéticas (URSS). Ao longo dos anos, o Brasil estabeleceu-se como importante ator
no setor, por meio do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (INPE), do Ministério
da Ciência, Tecnologia e Inovações (MCTI), do Departamento de Ciência e Tecnologia
Aeroespaciais (DCTA), e do Instituto de Aeronáutica e Espaço (IAE), estes dois últimos
do Ministério da Defesa (MD). Assim, o país consolidou infraestrutura para integração
e testes de satélites, que está entre os melhores e os maiores laboratórios do mundo,
projetou, produziu e operou satélites de coleta de dados e de sensoriamento remoto,
concebeu e produziu um conjunto de veículos de sondagem, e avançou pesquisas básicas
em praticamente todas as áreas de conhecimento relativas ao setor espacial.
Mesmo não tendo ainda sido alcançado o objetivo maior de operar um veículo
lançador de satélites nacional, a partir de uma base de lançamentos também nacional,
vale ressaltar os esforços brasileiros para o desenvolvimento de lançadores. Ressalta-
se o VLS-1 (Veículo Lançador de Satélites) e o atual VLM (Veículo Lançador de
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Microssatélites), e o desenvolvimento do Centro de Lançamento de Alcântara (CLA),
agora também denominado Centro Espacial de Alcântara (CEA). O CEA está localizado
em posição estratégica e bastante competitiva para o país1. Próximo a linha do Equador,
alguns tipos de lançamento, como os de baixa inclinação, beneficiam-se do ganho de
energia relativo à velocidade tangencial proporcionada pela rotação da terra. Segundo
a FAB (2020), esse atributo do centro aumentaria a capacidade de satelização entre
13 e 31% se comparada a do mesmo veículo lançado de outros centros localizados em
latitudes mais elevadas2.
Além desses avanços, o Programa Espacial Brasileiro desenvolveu relevantes
e longevas cooperações internacionais. Destaca-se o caso da cooperação de mais de
30 anos com a China – que resultou no lançamento de seis satélites da série CBERS
(Satélites Sino Brasileiro de Recursos Terrestres) de observação da Terra3. A cooperação
de quase cinco décadas com a Alemanha também surtiu resultados expressivos, como o
desenvolvimentos dos veículos de sondagem VSB-30, desenvolvidos pelo IAE, utilizados,
inclusive, pelo Programa Europeu de Microgravidade4,5.
Recentemente, acompanhando a tendência mundial, o Brasil passou a participar
de projetos de pequenos satélites, o que amplia a participação de atores não estatais,
bem como da Agência Espacial Brasileira (AEB), que coordena do Sistema Nacional de
Desenvolvimento das Atividades Espaciais (SINDAE) e publicou chamamento para a
realização de atividades de lançamento no CEA no Maranhão. No âmbito das ciências
jurídicas, destaca-se a Associação Brasileira de Direito Aeronáutico e Espacial (SBDA)
fundada em 19506, sob os auspícios do então Ministério da Aeronáutica, sendo mais
antiga até do que o renomado e internacionalmente reconhecido Instituto de Direito
Espacial e Aeronáutico da Universidade McGill (McGill University’s Institute of Air and
1 Com vistas a viabilizar a exploração comercial de Alcântara, e tendo em conta que uma fração
significativa dos objetos lançados ao espaço contém componentes de origem americana, e que aquele país
autoriza o lançamento desses objetos somente a partir de bases de lançamento que ofereçam salvaguardas
contra a disseminação inapropriada de suas tecnologias e conhecimento, o Brasil firmou com os Estados
Unidos, em 18 de março de 2019, um Acordo de Salvaguardas Tecnológicas (AST), cuja finalidade é dar ao
governo americano tais garantias. O AST foi promulgado por meio do Decreto no. 10.220, de 5 de fevereiro
de 2020.
2 FORÇA AÉREA BRASILEIRA (FAB). Operacionais. Disponível em: https://www2.fab.mil.br/cla/
index.php/vantagens2. Acesso em: 27 set. 2020.
3 INSTITUTO NACIONAL DE PESQUISAS ESPACIAIS (INPE). CBERS: História. Disponível em: http://
www.cbers.inpe.br/sobre/historia.php. Acesso em: 27 set. 2020.
4 AGÊNCIA ESPACIAL BRASILEIRA (AEB). Cooperação Internacional: Alemanha. Disponível em:
https://www.gov.br/aeb/pt-br/programa-espacial-brasileiro/cooperacao-internacional/alemanha. Acesso
em: 10 out. 2020.
5 INSTITUTO DE AERONÁUTICA E ESPAÇO (IAE). VSB-30. Disponível em: http://www.iae.cta.br/
index.php/todos-os-projetos/todos-os-projetos-desenvolvidos/menu-vsb-30. Acesso em: 10 out. 2020.
6 ASSOCIAÇÃO BRASILEIRA DE DIREITO AERONÁUTICO E ESPACIAL (SBDA). Denominações
Sucessivas da SBDA. Disponível em: https://sbda.org.br/sucessivas-denominacoes/. Acesso em: 19 set.
2020.

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