Neoliberalismo e o sistema da dívida: como a financeirização da dívida pública pode afetar os direitos previdenciários no estado de pernambuco

AutorAline Araújo de Albuquerque Melo - Juliana Teixeira Esteves
CargoGraduanda em Direito, CCJ, UFPE - Docente/pesquisador do Depto de Direito Público Especializado, CCJ, UFPE
Páginas23-38
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Edi
çã
o Comemorativa dos 1 30 anos da Revista Acad
ê
mica
MELO, Aline Araújo de Albuquerque; ESTEVES, Juliana Teixeira. NEOLIBERALISM O E O SISTEMA DA DÍVIDA: COMO A
FINANCEIRIZAÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA PODE AFETAR OS DIREITOS PRE VIDENCIÁRIOS NO ESTADO DE
PERNAMBUCO. Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, Edição Comemorativa dos 130 anos
da Revista Acadêmica, p. 23-38. Nov. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/252568>
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NEOLIBERALISMO E O SISTEMA DA DÍVIDA: COMO A
FINANCEIRIZAÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA PODE AFETAR OS DIREITOS
PREVIDENCIÁRIOS NO ESTADO DE PERNAMBUCO
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NEOLIBERALISM AND THE DEBT SYSTEM: HOW THE FINANCIALIZATION OF
PUBLIC DEBT CAN AFFECT SOCIAL SECURITY RIGHTS IN THE STATE OF
PERNAMBUCO
Aline Araújo de Albuquerque Melo*
Juliana Teixeira Esteves**
RESUMO
Analisando dados disponíveis no site do Banco Mundial, desde 1979 o estado de
Pernambuco tomou quinze empréstimos para projetos de desenvolvimento social. Foram
identificadas nos contratos críticas tecidas pelo Banco Mundial ao sistema previdenciário
brasileiro e estadual, fazendo referências à necessidade de uma reforma previdenciária. As dívidas
externas do Estado de Pernambuco cresceram continuamente, sendo seu pagamento obrigação
fiscal prevista anualmente pela Lei Orçamentária Anual. A teia de dívidas acarreta a
desregulamentação das condições de trabalho e flexibilização dos direitos sociais, ou seja, pela
guinada das prioridades na alocação de recursos públicos: do bem-estar social para a lubrificação
da engrenagem neoliberal, mantendo em movimento o moinho da financeirização. Em 2019 o
Estado de Pernambuco aprovou a Lei Complementar nº 423, criando um fundo de capitalização
complementar para novos servidores sem deixar evidenciado se será público ou se poderá vir a ser
privado. As reformas no âmbito previdenciário são interessantes para as instituições financeiras,
visto que o dinheiro da previdência é rentável e seguro, descontado mensalmente do salário dos(as)
trabalhadores(as). Mas para que o sistema financeiro tenha acesso à essa poupança, e obtenha
rendimentos a partir dela, é necessário privatizar os direitos sociais.
Palavraschave: dívidas públicas; reforma previdenciária; neoliberalismo; financeirização.
ABSTRACT
Analyzing data available on the World Bank website, since 1979 the state of Pernambuco
has borrowed fifteen loans for social development projects. Criticisms of the Brazilian state
pension system were identified in the contracts made by the World Bank, making references to the
need for a social security reform. The external debts of Pernambuco grew continuously, and their
payment is a fiscal obligation provided for annually by the Lei Orçamentária Anual. The debt
system results in deregulation of working conditions and the flexibilization of social rights,
happens the shift in priorities in the allocation of public resources: from social welfare to the
lubrication of the neoliberal gearing, keeping the financialization wheel in motion. In 2019, the
State of Pernambuco approved Lei Complementar nº 423, creating a complementary capitalization
fund for new employees without making it clear whether the funds would be public or private.
Social security reforms are interesting for financial institutions, as the pension money is profitable
and safe, deducted monthly from the workers' wages. But for the financial system to have access
* Graduanda em Direito - CCJ UFPE. E-mail: aline.araujom@ufpe.br
**Docente/pesquisador do Depto de Direito Público Especializado CCJ UFP E. E-mail: juliana.esteves@ufpe.br.
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Pesquisa desenvolvida em Iniciação Científica e com apoio do CNPQ.
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Edi
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o Comemorativa dos 1 30 anos da Revista Acad
ê
mica
MELO, Aline Araújo de Albuquerque; ESTEVES, Juliana Teixeira. NEOLIBERALISM O E O SISTEMA DA DÍVIDA: COMO A
FINANCEIRIZAÇÃO DA DÍVIDA PÚBLICA PODE AFETAR OS DIREITOS PRE VIDENCIÁRIOS NO ESTADO DE
PERNAMBUCO. Revista Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, Edição Comemorativa dos 130 anos
da Revista Acadêmica, p. 23-38. Nov. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível em:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/252568>
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to these savings, and to obtain income from them, it is necessary to privatize social rights.
Keywords: public debts; social security reform; neoliberalism; financialization.
1 INTRODUÇÃO
Há uma profunda relação entre a história da dívida pública brasileira e o desenvolvimento
econômico do Brasil. O endividamento externo brasileiro se inicia com a proclamação da
Independência, quando em 1823 o país negociou seu primeiro empréstimo em Londres
(STACHLER, p. 124). Desde então, os empréstimos contraídos pelo Brasil seriam pagos através
de novos empréstimos, utilizados para o financiamento dos déficits orçamentários, pagamento dos
juros e das amortizações de empréstimos anteriores.
Esse processo foi expandido significativamente durante o período da Ditadura Militar
(governo juridicamente ilegal), com o intuito de financiar o “milagre econômico” (STACHLER,
p. 127). Em 1964 a dívida externa brasileira era de US$ 3,294 bilhões no final do período militar,
em 1985, totalizava US$ 105,171 bilhões, conforme dados da Auditoria Cidadã da Dívida (2016).
Esse cenário foi duramente agravado com a política de juros aplicada pelos Estados Unidos da
América no final dos anos 1970. Com o fim da paridade ouro-dólar decretada pelos Estados Unidos
em 1971 houve uma emissão ilimitada de dólares no mercado financeiro, essa grande oferta de
créditos influenciou o endividamento não só do Brasil, mas também dos estados brasileiros, que
buscavam financiamentos para desenvolver-se.
É a partir desses processos que o Fundo Monetário Internacional e o Banco Mundial, este
último principalmente através do Banco Internacional para Reconstrução e Desenvolvimento
(BIRD), passam a influenciar politicamente a economia dos países latino-americanos para garantir
que o pagamento da dívida externa seja devidamente pago. Em 1983 o Brasil assinou a primeira -
entre diversas - Cartas de Intenções com o Fundo Monetário Internacional, organismo que passou
a interferir abertamente em assuntos internos do País, com repercussões na economia estaduais e
municipais.
Assim, objetiva-se compreender como esse tipo de intervenção se deu, especificamente, no
Estado de Pernambuco e sua possível relação com o aprofundamento de políticas neoliberais no
estado, bem como os efeitos da financeirização na seara previdenciária estadual. Importa demarcar
que desde o término da segunda guerra mundial o capitalismo em seu campo econômico é
capitaneado pelo setor financeiro, a partir da especulação, esse setor alimenta o mecanismo de
acumulação capitalista. Do ponto de vista ideológico e social, o capitalismo neoliberal atua a partir
de mecanismos de construção do trabalhador-empresa e Estado-empresarial.
A cientista política norte-americana, Wendy Brown, define a financeirização como cria do
neoliberalismo, sendo este um sistema caracterizado a um conjunto de políticas que “privatizam a
propriedade e os serviços públicos, reduzem radicalmente o Estado social, amordaçam o trabalho,
desregulam o capital e produzem um clima de impostos e tarifas amigáveis para investidores
estrangeiros” (BROWN, 2019, p. 29). Nos países do sul global o neoliberalismo tem uma
especificidade, as imposições pelo FMI e BM de ajustes estruturais, vinculados à reestruturação
dos empréstimos e da dívida.
Uma das características de Estados tipicamente neoliberais é a prioridade em sustentar a
integridade do sistema financeiro em detrimento do bem-estar da população e do meio ambiente,

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