A norma jurídica como resultado do discurso concretizador

AutorTatiana Aguiar
Páginas111-128
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CAPÍTULO 6
A NORMA JURÍDICA COMO RESULTADO DO
DISCURSO CONCRETIZADOR
6.1 Teoria Estruturante da norma
Como vimos nos capítulos anteriores, a teoria retórica re-
alista crê na construção da realidade por meio da linguagem.
Transpondo esses ensinamos para o âmbito jurídico, vimos
que o Direito e, por conseguinte, as normas jurídicas, também
se constituem linguisticamente.
Partindo dessas premissas, optamos por estudar a norma
jurídica a partir de um referencial teórico que se coadunasse
com aquelas e que nos auxiliasse a melhor compreender as
superposições de discursos vencedores no sistema jurídico
brasileiro, que é o que ocorrerá no último capítulo desta tese.
Em contraposição ao positivismo de Kelsen e ao decisio-
nismo de Schmitt, Müller propõe uma teoria estruturante da
norma. Sua tese tem como uma de suas premissas a ideia de
que norma e texto legal não se confundem. Dessa forma, rom-
pe com a ideia positivista de que o texto da lei contém a norma
pronta e acabada e que qualquer indivíduo que tenha acesso
a ele poderá extrair a mesma regra.
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A SUPERPOSIÇÃO DE DISCURSOS VENCEDORES
Olivier Jouanjan, em interessante artigo, em que compa-
ra as teorias kelseniana e estruturante de Müller, ao avaliar
o processo interpretativo de Kelsen, na qual a moldura é que
serve de “limite” para a construção da norma jurídica, aduz
o seguinte:
A interpretação torna-se uma operação puramente volitiva
desde o instante em que se mostra impossível fixar o momento
cognitivo. A motivação da decisão de “aplicação” pode ter como
único objetivo mascarar o processo real de decisão: um remendo
a posteriori. O “normativismo” kelseniano abre em realidade a
porta para o puro “decisionismo.
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Segundo Müller, a sua teoria traria um equilíbrio entre
o sociologismo, o qual, ao focar no âmbito da norma, ignora
o programa da norma, o normologismo, que por sua vez, ca-
minhando para o lado oposto, não dá a importância devida ao
âmbito da norma e o decisionismo, que ignora a ambos por
visar exclusivamente à decisão soberana.
Para os decisionistas, o texto sequer fixa limites para a
interpretação, quando muito serve de fundamento a posterio-
ri para uma decisão já tomada com base em normas que o
próprio procedimento tratou de esconder.
Até então, as ideias deste doutrinador alemão não desto-
ava do que alguns pós-positivistas já defendiam. Isto porque,
após o giro linguístico, quando a linguagem ganhou novo sta-
tus em relação à realidade, muitos passaram a defender que a
norma era construída a partir do texto, dentre eles, o próprio
Kelsen, como dissemos acima.
Tais estudiosos se distanciaram, principalmente, no mo-
mento em que Kelsen afirmou acreditar na incomunicabilida-
de entre o ser e o dever ser, de modo que, segundo ele, do ser
não se chegava ao dever-ser. É aí que Müller também se afasta
116. Müller, Friedrich. O novo paradigma do direito –Introdução à teoria e metódica
estruturantes do direito “De Hans Kelsen a Friedrich Muller – Método Jurídico sob
o paradigma pós-positivista”. São Paulo: Ed. RT, 2007, p. 250.

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