Notas sobre compliance no âmbito das relações de consumo

AutorCecília Dantas e Roberta Densa
Páginas33-51
NOTAS SOBRE COMPLIANCE
NO ÂMBITO DAS RELAÇÕES DE CONSUMO
Cecília Dantas
Pós-graduanda em Direito Administrativo pelo Instituto de Direito Público. Advogada
em São Paulo.
Roberta Densa
Doutora em Direitos Difusos e Coletivos pela Pontifícia Universidade Católica de São
Paulo (PUC/SP), mestre em Direito Político e Econômico pela Universidade Presbiteriana
Mackenzie. Professora de Direito Civil e Direitos Difusos e Coletivos. Professora da
Faculdade de Direito de São Bernardo do Campo. Autora da obra “Proteção jurídica
da criança consumidora” publicada pela Editora Foco, do livro “Direito do Consumi-
dor” publicado pela Editora Atlas (9ª edição) e cocoordenadora da obra “Coronavírus
e responsabilidade civil contratual e extracontratual” publicada pela Editora Foco.
Membro da Comissão dos Direitos do Consumidor da OAB/SP. Advogada em São Paulo.
Sumário: 1. Compliance: conceito e aplicação – 2. O conceito de integridade e os pilares do com-
pliance no espaço corportativo; 2.1 O conceito de integridade – 3. Os pilares de um programa de
compliance e sua aplicação nas relações de consumo; 3.1 Comprometimento e apoio da alta admi-
nistração; 3.2 Instância responsável; 3.3 Análise de risco; 3.3.1 Due diligence; 3.4 Monitoramento
contínuo; 3.5 Elaboração de um Código de Ética e Conduta; 3.6 Treinamento e comunicação; 3.7
Canais de denúncia – 4. O compliance como efetivação das políticas públicas e instrumento de
prevenção de danos aos consumidores; 4.1 A Operação Carne Fraca; 4.2 A fraude do leite – Ope-
ração Leite Compensado – 5. Compliance e atendimento aos consumidores: exemplo a partir das
normas do bacen – 6. Notas conclusivas – 7. Referências.
Dentre os desaf‌ios apresentados aos prof‌issionais da área jurídica que atuam
na proteção e defesa do consumidor, está a efetivação dos direitos estabelecidos em
lei, o estudo constante das novas formas de economia e a melhoria no atendimento
aos consumidores.
O artigo tem por escopo trazer luzes a um tema relativamente novo que está
em voga nas relações de consumo e que pode em muito auxiliar o atendimento aos
consumidores: o compliance. De fato, um dos pontos essenciais da lei consumerista
é o reconhecimento da vulnerabilidade do consumidor, a transparência e harmonia
nas relações e a prevenção de danos aos consumidores.
O compliance, pensado incialmente para coibir a corrupção e a concorrência,
pode ser um instrumento de extremo valor para efetivar a defesa do consumidor,
organizando a empresa desde a alta cúpula, passando pelos seus empregados e
chegando aos prestadores de serviços. De fato, conforme veremos, todo o processo
organizacional introduzido pelo programa de compliance na empresa pode ser uma
ef‌icaz forma de atender aos anseios dos consumidores e efetivar os direitos trazidos
pelo CDC.
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CECÍLIA DANTAS E ROBERTA DENSA
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1. COMPLIANCE: CONCEITO E APLICAÇÃO
O termo compliance deriva do inglês e pode ser traduzido para o vernáculo
como ‘conformidade’. Leia-se conformidade não só com o ordenamento jurídico,
mas também com os anseios de boas práticas advindos da empresa, do consumidor,
da autorregulação do setor e da sociedade como um todo1. Percebe-se que a cres-
cente importância da matéria vem tomando o meio corporativo em diversos setores
empresariais para se adotar procedimentos éticos e de conformidade.
Nesse sentido, Milena Donato e Rodrigo da Guia esclarecem que:
Estipulam-se normas de conduta a serem seguidas, de maneira a se garantir o respeito à legalidade,
à transparência, bem como a ausência de conivência com qualquer tipo de infração ou ilícito
praticados pelos funcionários ou representantes da sociedade. Cuida-se da adoção de sistemas
para assegurar o bom funcionamento do ambiente corporativo à luz não apenas das políticas
internas de cada sociedade, como também das normas legais em vigor 2.
Destarte, o compliance evoluiu e passou a ser pauta no mundo corporativo como
um todo, trazendo ef‌icácia às normas, tanto jurídicas quanto éticas, em virtude da
crescente necessidade de se encontrar o seu efetivo cumprimento. Assim, tornou-se
instrumento capaz de superar as def‌iciências normativas no ambiente corporativo,
e foi além dos modelos regulatórios tradicionais de controle até então existentes.
Isso porque a regulação estatal não é suf‌iciente para a solução de todas as ques-
tões evocadas pela sociedade, nem mesmo para alcançar com a agilidade necessária
os novos desaf‌ios trazidos pela tecnologia.
De fato, a regulação estatal e a autorregulação possuem vantagens e desvanta-
gens e sugere-se que deva ser pretendida uma medida adequada de dosagem de cada
uma dessas modalidades de disciplina da publicidade no Brasil, muito embora, na
prática, essa justa medida não seja fácil de ser encontrada. O objetivo, aqui, com a
autorregulação e o compliance é concretizar a harmonia das relações de consumo
Nesse sentido, Juliana Martins e Raphael Silva af‌irmam que
1. De acordo com o guia do CADE def‌ine-se compliance como sendo “um conjunto de medidas internas que
permite prevenir ou minimizar os riscos de violação às leis decorrentes de atividade praticada por um agente
econômico e de qualquer um de seus sócios ou colaboradores. Por meio dos programas de compliance, os
agentes reforçam seu compromisso com os valores e objetivos ali explicitados, primordialmente com o
cumprimento da legislação. Esse objetivo é bastante ambicioso e por isso mesmo ele requer não apenas
a elaboração de uma série de procedimentos, mas também (e principalmente) uma mudança na cultura
corporativa. O programa de compliance terá resultados positivos quando conseguir incutir nos colabora-
dores a importância em fazer a coisa certa. Disponível em: http://www.cade.gov.br/acesso-a-informacao/
publicacoes-institucionais/guias_do_Cade. Acesso em: 06 jun. 2020).
2. OLIVA, Milena Donato; SILVA, Rodrigo da Guia. Origem e evolução histórica do compliance no direito
brasileiro. In: FRAZÃO, Ana; CUEVA, Ricardo Villas Bôas. Perspectivas e desaf‌ios dos programas de confor-
midade. Belo Horizonte: Editora Fórum, 2019. Edição do Kindle.
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