Novas perspectivas e desafios da aplicação da economia comportamental e da neurociência nas relações de consumo

AutorDionisio Moreno Ferres
Ocupação do AutorPós-graduado em direito do consumidor pela UniFMU
Páginas79-105
NOVAS PERSPECTIVAS E DESAFIOS
DA APLICAÇÃO DA ECONOMIA
COMPORTAMENTAL E DA NEUROCIÊNCIA
NAS RELAÇÕES DE CONSUMO
Dionisio Moreno Ferres
Pós-graduado em direito do consumidor pela UniFMU. Doutorando em comunicação
e semiótica pela PUCSP. Mestre em comunicação e semiótica pela PUCSP. MBA em
Neurociência e comportamento do consumidor pela ESPM. Pós-graduado em neuro-
ciência e comportamento pela PUCRS. Advogado.
Sumário: 1. A economia como ação propositiva da proteção e defesa dos consumidores. 2.
A vulnerability do consumidor como pressuposto orientador e permanente. 3. Desenvolvi-
mento econômico e sua inuência por meio do consumo no bem-estar social. 4. As narrativas
de empowerment do consumidor como justicativa para a exibilização da proteção do
consumidor. 5. Do comportamento do consumidor para a economia comportamental. 6. As
iniciativas pioneiras na proteção e defesa do consumidor sob a perspectiva psicológico de
nossas escolhas que podem ser consideradas irracionais. 7. O neuromarketing e a busca pelos
dados pessoais do consumidor para a criação de algoritmos. 8. A utilização de inteligências
comportamentais em dispositivos legais na proteção e defesa dos interesses do consumidor.
9. Considerações nais. 10. Referências.
1. A ECONOMIA COMO AÇÃO PROPOSITIVA DA PROTEÇÃO E DEFESA DOS
CONSUMIDORES
No livro A Sociedade Justa, de John Kenneth Galbraith, lançado no início da déca-
da de 1990, na mesma época em que no Brasil era promulgado o Código de Defesa do
Consumidor, o autor escrevia de forma categórica que “agora com a expansão e com a
complexidade econômica, os consumidores têm que ser protegidos, assim como o meio
ambiente” (GALBRAITH, 1996, p.12).
Para Galbraith as questões humanas e sociais nunca se afastaram das questões eco-
nômicas. Pode soar desnecessária essa af‌irmação, mas à época, uma parcela considerável
dos economistas havia perdido a sensibilidade para os princípios e valores humanos,
concentrando seus esforços exclusivamente no crescimento econômico.
A af‌irmação de Galbraith foi clara e direta “os consumidores têm que ser prote-
gidos”; essa frase inaugura nossa ref‌lexão para esclarecer de pronto a necessidade de
harmonização permanente dos princípios da ordem econômica: a livre iniciativa e a
defesa do consumidor.
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Tanto a livre iniciativa, como a defesa do consumidor, são princípios constitucionais,
da ordem econômica que apresentam diversos desdobramentos que não podemos mais
ignorar quanto a relevância social de seus impactos no dia a dia das pessoas.
A harmonia entre esses princípios é um desaf‌io permanente devido ao dinamismo
do mercado, que se movimenta em busca de ef‌iciência da produção de bens de consumo,
exigências de redução de custos operacionais com emprego de inovação tecnológica
para alavancar as vendas e aumento dos lucros. Somente nos últimos trinta anos, com
as exigências dos dispositivos do Código de Defesa do Consumidor é que a satisfação
do consumidor entrou no cenário econômico.
Temas como igualdade, equidade, respeito, segurança e informação, começam a
serem inseridos nas relações de consumo, a partir dos anos 1950, quando Galbraith, era
professor em Harvard, e depois atuando como assessor econômico do Presidente John
Kennedy (eram inclusive amigos), que os consumidores foram inseridos institucional-
mente nas preocupações sociais do Estado.
Como professor Galbraith (1996, p 25), se posicionava a favor da expansão das
“oportunidades econômicas para todos os indivíduos”, o que exigiria ações por parte
do Estado para equilibrar a relação de compra e venda, oferta e procura, protegendo os
consumidores, sem, contudo, intervir na ordem econômica, a não ser em casos de abuso.
Em 15 de março de 1962, em mensagem enviada ao Congresso Americano o então
Presidente John Kennedy, explicitou em seu texto a necessidade de proteção dos con-
sumidores. Foi a primeira vez que um presidente dos Estados Unidos defendia publica-
mente políticas de proteção aos consumidores. Na mensagem, foram elencados quatro
direitos básicos: direito à informação, direito a consumir com segurança, direito de escolha
e o direito de ser ouvido. Esses quatro direitos básicos expressam uma preocupação, com
a comunicação, o respeito e o diálogo entre as partes, valores que norteiam a relação de
consumo e hoje, que podemos encontrar em dispositivos legais, específ‌icos, como é o
caso do artigo 10, da Lei 8.078/90, que contém regras para o recall, no Brasil.
No Brasil, um artigo inédito sobre o consumidor, de autoria de Fabio Konder Com-
parato, escrito em 1978, mas publicado somente em 1986, na Revista de Direito Público,
cujo título é Proteção do Consumidor: Importante Capítulo do Direito Econômico, advertia
para a falta de uma noção precisa sobre o quem seria o consumidor para o direito brasi-
leiro à época, pois não havia uma def‌inição jurídica do conceito, o que dif‌icultava uma
proteção mais efetiva (COMPARATO, 1986, p. 186).
A necessidade de def‌inir quem é o consumidor para efeitos jurídicos, foi uma das
prioridades que precisou ser def‌inida pelo legislador dentro do Código de Defesa do
Consumidor, com certa urgência.
Na lição de Filomeno, sob a perspectiva econômica, o consumidor é “todo indivíduo
que se faz destinatário da produção de bens, seja ele ou não adquirente, e seja ou não, a
seu turno, também produtor de outros bens” (FILOMENO, 2007, p. 24), e ainda sob a
perspectiva psicológica de “sujeito sobre o qual se estudam as reações a f‌im de indivi-
dualizar os critérios para a produção e as motivações internas que o levam ao consumo”
(FILOMENO, 2007, p. 25). Essas def‌inições, construídas a partir dos dispositivos do
artigo 2º e parágrafo único, e do artigo 29, da Lei 8.078/90 – O Código de Defesa do Con-
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