Novo modelo institucional de prestação de abastecimento de água e esgotamento sanitário no Brasil

AutorAntônio Carlos Parlatore
Páginas29-67
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NOVO MODELO INSTITUTICIONAL
DE PRESTAÇÃO DE ABASTECIMENTO
DE ÁGUA E ESGOTAMENTO
SANITÁRIO NO BRASIL
ANTÔNIO CARLOS PARLATORE
O modelo aqui proposto para água e esgoto é perfeitamente aplicável
ao saneamento básico tal como definido pela Lei Federal n. 11.445/2007,
portanto alcançando o manejo de resíduos sólidos e a drenagem de águas
pluviais em bacias urbanas. Mais do que isso, pode e deve ser extensível
ao saneamento ambiental como um todo, incluindo adicionalmente o
controle de vetores de transmissão de doenças e a disciplina sanitária e
ambiental do uso e ocupação do solo. Como corolário, a proposta traz
importantes implicações para a modernização da gestão de recursos
hídricos.
Para melhor assimilação do seu conteúdo é importante ter pre-
sente que a competência constitucional para a prestação de qualquer
serviço público se realiza mediante o exercício integrado de três funções
básicas: Planejamento, Regulação e Gestão/Operação, as duas primeiras
indelegáveis por constituírem a essência da titularidade dos serviços
sendo, entretanto, a terceira delegável, conforme preceitua o Art. 175
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ANTÔNIO CARLOS PARLATORE
Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamen-
te ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de
licitação, a prestação de serviços públicos.
Parágrafo único – A lei disporá sobre:
I – o regime das empresas concessionárias e permissionárias de
serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua
prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização
e rescisão da concessão ou permissão;
II – os direitos dos usuários;
III – a política tarifária;
IV – a obrigação de manter serviço adequado.
A realidade atual do saneamento básico brasileiro é o resultado de
um processo histórico cumulativo inteiramente condicionado e
determinado, a partir de meados da década de 19601, pela instituição,
implementação, evolução e deterioração do Plano Nacional de
Saneamento – PLANASA, gerido pelo Banco Nacional da Habitação
– BNH. Quaisquer que tenham sido os arranjos institucionais vigentes
no saneamento básico dos Municípios e Estados brasileiros naquele
momento, os mesmos foram modificados para ajustarem-se plenamente
às características desse plano.
Provavelmente a mais incisiva e radical cirurgia político-
institucional ocorreu no Estado de São Paulo a partir de 1973 com a criação
da Companhia de Saneamento Básico do Estado de São Paulo – Sabesp2
e a transformação do Centro Tecnológico de Saneamento Básico –
Cetesb em instituição de gestão ambiental, atualmente denominada
1 Quando se iniciou o período autocrático dos governos militares no Brasil.
2 Resultado da fusão das seguintes organizações criadas em 1967: Companhia
Metropolitana de Águas de São Paulo – Comasp, Companhia Metropolitana de
Saneamento de São Paulo – Sanesp, Superintendência de Água e Esgoto da Capital –
Saec, Companhia de Saneamento da Baixada Santista – SBS, Companhia de Saneamento
do Vale do Ribeira – Sanevale (criada em 1971) e Fomento Estadual de Saneamento
Básico do Estado de São Paulo – Fesb (inclusive o Centro Tecnológico de Saneamento
Básico – Cetesb, a ele vinculado).
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NOVO MODELO INSTITUCIONAL DE PRESTAÇÃO...
Companhia Ambiental do Estado de São Paulo3, em face da diversidade
do arranjo concebido em 1967 pela gestão do Governador Abreu Sodré
e seu Secretário de Estado Professor Eduardo Riomey Yassuda.
Como consequência da robustez desse arranjo, o PLANASA no
Estado de São Paulo não se impôs totalmente4 deixando, entretanto,
sequelas importantes nos Municípios que não aderiram ao mesmo, em
face das expressivas perdas institucionais determinadas pelo desapareci-
mento das duas organizações daquele arranjo, concebidas precipuamen-
te para o suporte aos mesmos, o Fomento Estadual de Saneamento
Básico – Fesb e o Centro Tecnológico de Saneamento Básico – Cetesb,
ambos criados em 1967, o primeiro extinto e o segundo modificado em
1973.
Quanto aos Municípios que se engajaram ao plano, concedendo,
pela força da pressão financeira do Governo Federal, a exploração de
seus serviços de água e esgoto à Sabesp, o resultado é sua total submissão
ao totalitarismo planasiano, determinando a vigência de um estado atual
de completo despreparo para exercerem suas prerrogativas de titulares
de seus serviços de saneamento. Por óbvio, essa implicação alcança
igualmente todos os Municípios brasileiros submetidos a esse regime,
marcado pela criação de todas as companhias estaduais de saneamento.5
A realidade político-institucional do saneamento básico brasileiro
é inteiramente incompatível com as necessidades de desenvolvimento
do País, impondo-se aos poderes constituídos a implementação de me-
didas drásticas e urgentes destinadas à sua reversão, de modo a erradicar
todos os fatores que inibem seu progresso, especialmente a ineficiência
desses serviços quando prestados por organismos operadores públicos,
sejam municipais ou estaduais.
3 Após sucessivas e distintas denominações conforme a evolução da perspectiva
governamental quanto ao objeto da gestão ambiental em cada momento a partir de 1973.
4 Dos 645 municípios do Estado de São Paulo, a Sabesp presta os serviços de
abastecimento de água e esgotamento sanitário em 366. Atende a pouco mais de 28
milhões de habitantes, de um total aproximado de 44 milhões do Estado de São Paulo.
5 Lembrando que os Estados do Mato Grosso e Acre já extinguiram suas companhias.

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