Óbito - Acidente - Indenização - Responsabilidade objetiva

AutorJuiz José Antônio Ribeiro de Oliveira Silva
Páginas76-81

Page 76

Processo n. 133.600-50.2008.5.15.0146 RT

Autoras: Marília Daniela Guerra de Carvalho e Maria Eduarda Guerra de Carvalho

Rés: Açúcar e Álcool Oswaldo Ribeiro de Mendonça Ltda e Segurança e Vigilância Sudeste Ltda.

Submetido o processo a julgamento, foi prolatada a seguinte

SENTENÇA I - RELATÓRIO

Marília Daniela Guerra de Carvalho e Maria Eduarda Guerra de Carvalho, esta última menor, representada pela primeira, sua genitora, ajuízam ação de indenização por acidente do trabalho em face de Açúcar e Álcool Oswaldo Ribeiro de Mendonça Ltda. e Segurança e Vigilância Sudeste Ltda., alegando, em síntese, que Ernani Alexandre de Carvalho, esposo da primeira autora e pai da segunda, foi contratado pela primeira ré em 1.12.2007, para exercer as funções de zelador patrimonial, tendo sido atingido por um disparo de arma de fogo efetuado por um empregado da segunda ré, que resultou em seu falecimento; por estas e pelas demais razões de fato e de direito expostas na petição inicial de fls. 2/44, pleiteiam o pagamento das indenizações descritas às fls. 43/44; requerem honorários de advogado, os benefícios da justiça gratuita e atribuem valor à causa (R$ 1.639.251,00). Juntam instrumento de procuração, declaração de pobreza e documentos.

Termo de audiência una às fls. 415/416, na qual foi rejeitada pelas partes a primeira proposta conciliatória.

A primeira ré apresenta contestação, alegando que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima; aduz que são indevidas as verbas postuladas, pelas razões que expõe, e pugna pela improcedência dos pedidos. Junta instrumento de procuração, carta de preposição e documentos.

A segunda ré apresenta contestação, argüindo preliminares de inépcia da petição inicial e de ilegitimidade ativa e passiva; no mérito, aduz que são indevidas as verbas postuladas, pelas razões que expõe, e pugna pela improcedência dos pedidos. Junta instrumento de procuração, carta de preposição e documentos.

Réplica às fls. 684/715 e 733/745.

Em audiência de prosseguimento, foram dispensados os depoimentos pessoais, tendo sido ouvida uma testemunha das autoras (fls. 761/763).

Determinada a expedição de carta precatória para a oitiva das testemunhas das rés.

A primeira ré argúi exceção de incompetência em razão da matéria (fls. 765/767).

Testemunhas ouvidas às fls. 812/813 e 843/844.

Encerrada a instrução processual (fl. 845).

Razões finais da segunda ré às fls. 847/850, das autoras às fls. 853/888 e da primeira ré ás fls. 889/925.

Tentativa conciliatória final infrutífera.

II - FUNDAMENTAÇÃO PRELIMINARES

INCOMPETÊNCIA EM RAZÃO DA MATÉRIA

Não há falar em exceção de incompetência em razão da matéria, tendo em vista que a questão deve ser apresentada como preliminar da contestação, nos termos dos arts. 112 e 301, II, do CPC.

A primeira ré argúi incompetência ex ratione materiae, dizendo que esta Justiça Especializada não é competente para julgar o presente feito, por ser o dano moral de natureza civil, requerendo a remessa dos autos ao Juízo Cível. E invoca a Súmula n. 366 do E. STJ.

Sem razão, contudo. A Justiça do Trabalho é competente para processar e julgar as ações de indenização por dano moral ou patrimonial, decorrentes da relação de trabalho, nos termos do art. 114, inciso VI, da Constituição Federal. Inclusive as ações ajuizadas pelos herdeiros, conforme remansosa jurisprudência do E. STF. Tanto que o E. STJ cancelou a equivocada Súmula n. 366, em 2009.

Rejeitada a argüição.

INÉPCIA DA PETIÇÃO INICIAL

A segunda ré procura taxar de inepta a petição inicial, quando da contestação aos pedidos nela formulados.

De se ponderar que no processo do trabalho não é aplicável o art. 282 do CPC, vez que a CLT tem norma própria, inserida no § 1 º do art. 840. Este dispositivo legal exige apenas "uma breve exposição dos fatos de que resulte o dissídio". Estão preenchidos os requisitos da petição inicial trabalhista. Por isso, não há falar em inépcia, mesmo porque a segunda ré pôde oferecer defesa em relação a todos os pleitos.

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ILEGITIMIDADE ATIVA

A segunda ré argúi ilegitimidade das autoras, vez que quem deveria figurar no pólo ativo da ação é o espólio, na pessoa de seu inventariante. Aduz que há vício de representação no tocante à segunda autora, que é menor incapaz.

Sem razão, contudo, pois restou comprovado nos autos que as autoras são herdeiras legítimas do de cujus, conforme documento de fl. 65, restando atendidas as exigências da Lei n. 6.858/80. E a menor está devidamente representada por sua genitora.

Tratam-se de meras formalidades do processo civil, inaplicáveis ao processo do trabalho.

Rejeito.

ILEGITIMIDADE PASSIVA

Pretende a segunda ré ver declarada sua ilegitimatio ad causam, ao fundamento de não ter mantido qualquer vínculo de emprego com o de cujus.

A legitimidade de parte é uma das condições da ação, cuja falta acarreta a extinção do processo sem apreciação de seu mérito.

Traduz-se na titularidade ativa e passiva da causa, ou seja, é a pertinência subjetiva da ação. Tem legitimidade ativa o titular da pretensão deduzida em juízo (res in iudicio deducta). A legitimidade passiva recai na pessoa em face da qual formula o autor sua pretensão.

No entanto, de se notar que na processualística moderna o direito de ação é autônomo e abstrato, isto é, desvinculado do direito material deduzido. Assim, ainda que se reconheça ao depois que o postulante não tem o direito invocado, não é o caso de se considerá-lo carecedor da ação.

Neste caso concreto as autoras pleiteiam a condenação da primeira ré ao pagamento das verbas que elen-cam, com a responsabilidade solidária da segunda ré, cujo empregado foi o causador do acidente em questão. Assim, mesmo que no mérito se verifique improcedente seu pedido, de se concluir que elas são as titulares da pretensão trazida a juízo, deduzida em face da segunda ré.

Rejeito.

MÉRITO

ACIDENTE DO TRABALHO E RESPONSABILIDADE DAS RÉS

É incontroverso que o de cujus foi vítima de acidente fatal, causado pelo disparo de uma arma de fogo, efetuado pelo Sr. Lucas Francisco, vigilante contratado pela segunda ré para prestar serviços de segurança para a primeira, nas dependências desta.

A alegação das autoras é a de que o Sr. Lucas estava brincando de "roleta russa" com a arma de fogo, apontando-a para vários colegas, quando efetuou o disparo fatal em direção ao de cujus, que estava fazendo uma ronda no local de trabalho, em cima de sua moto.

A primeira ré alega que o acidente ocorreu por culpa exclusiva da vítima, que aceitou participar da brincadeira de "roleta russa", já que poderia ter se esvaído do local e não o fez. Afirma que o de cujus poderia ter repelido o perigo iminente, mas não o fez. Afirma, também, tratar-se de caso fortuito, já que as condições de trabalho oferecidas ao de cujus não eram perigosas, tendo o acidente sido causado por ação de terceiro estranho a seu poder diretivo e de comando. Por fim, alega que o empregador é responsável pelos atos de seus empregados e prepostos no exercício do trabalho quer lhes competir, ou em razão dele, o que não ocorreu no caso em tela, já que o acidente ocorreu quando o expediente já havia terminado.

A segunda ré se defende, asseverando que não mantinha qualquer relação empregatícia com o de cujus, motivo pelo qual não pode ser responsabilizada pelo acidente ocorrido. Esclarece que sempre adotou medidas preventivas de segurança, fornecendo equipamentos e instruindo seus colaboradores a evitarem acidentes de trabalho.

Poisbem,primeiramente,pensoquearesponsabilidade do empregador pela indenização decorrente de acidente do trabalho deve ser objetiva, porque até mesmo na seara comum a responsabilidade civil tem cada vez mais sido definida como tal diante da teoria do risco. Veja-se, a propósito, o art. 927, parágrafo único, do Código Civil, que...

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