A observância dos conceitos jurídicos de direito privado no âmbito tributário

AutorEdvaldo Brito
Páginas343-392
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A OBSERVÂNCIA DOS CONCEITOS JURÍDICOS
DE DIREITO PRIVADO NO ÂMBITO
TRIBUTÁRIO
Edvaldo Brito1
Dedico este estudo a PAULO DE BARROS CARVALHO, pela con-
tribuição à moderna interpretação jurídico-tributária no Brasil e
pelo nosso recíproco afeto que o tempo, de quase 50 anos, vem tor-
nando mais forte a cada dia.
O método lógico-linguístico para investigar o objeto
jurídico. Os axiomas.
Há trinta anos o autor deste estudo escreveu um tex-
to investigativo utilizando-se, pela primeira vez, do método
lógico-linguístico2.
Esse primeiro estudo é contemporâneo da demonstração
da utilidade do constructivismo lógico-semântico de PAULO
1. Professor Emérito UFBA e Mackenzie. Livre-docente USP.
2.
cf. Edvaldo Brito. O conceito atual de tributo. In. Sergio Novais Dias, et.
al. Coords. - Revista dos Mestrandos em Direito Econômico da UFBA. nº1
(jan./jun. 1991) - Salvador: Centro Editorial e Didático da UFBA, 1991 – Se-
mestral, pp.27-33 .
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IBET - INSTITUTO BRASILEIRO DE ESTUDOS TRIBUTÁRIOS
DE BARROS CARVALHO, tanto que, a convite do autor deste
estudo, ele ministrou o I Curso de Lógica Jurídica na Facul-
dade de Direito da Universidade Federal da Bahia3 e, explo-
rando essa metodologia, o subscritor deste trabalho obteve o
título de Doutor na Faculdade de Direito da Universidade de
São Paulo – USP – com a tese O Conceito Tributo4.
Esses exemplos dão a medida da busca de uma interpreta-
ção jurídico-tributária arrimada em um método que ofereça uma
redução das ambiguidades na transmissão da mensagem do
emissor para o destinatário, no âmbito tributário, tendo em vista
a proximidade do rigor que se obtém, na comunicação dos con-
teúdos semânticos dos signos da linguagem jurídico-tributária,
com a utilização da teoria da linguagem, integrada pela Lógica.
O Direito, como objeto do conhecimento, não é lingua-
gem, nem é elemento constitutivo dos saberes da Lógica.
O Direito é um fenômeno, por isso, manifesta-se nos fatos,
isto é, nos episódios de natureza social: “ex facto oritur jus”.
DANIEL DEFOE5 mostra isto, ao descrever o fato de o
náufrago, que estava sozinho, antes, na ilha deserta e domina-
va toda a sua área, até que apareceu um outro homem, “sex-
ta-feira”, e esta natureza social fez perceber aos dois que ha-
via, doravante, condutas em interferência intersubjetiva com
a possibilidade de troca de determinações de comportamento:
o fazer de um com o omitir do outro; o fazer de um com o fazer
do outro; o omitir de um com o omitir do outro, etc.
Surge, aí, o fenômeno, que se expressa mediante a des-
crição de prerrogativas e sanções e, assim, é fonte do direito
3.
cf. Paulo de Barros Carvalho. I curso de lógica jurídica. 77pp. Publicação
em comemoração ao centenário da Faculdade de Direito da Bahia e em
homenagem à memória do Professor A. L. Machado Neto. Coord. Prof. Ed-
valdo Brito. Salvador 1991.
4.
cf. Edvaldo Brito. O conceito tributo. Faculdade de Direito da USP. São
Paulo 1997.
5.
cf. Robinson Crusoé: a conquista do mundo numa ilha. Trad. e adaptação
em português de Werner Zotz. São Paulo: Scipione, 2001.
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CONSTRUCTIVISMO LÓGICO-SEMÂNTICO
E OS DIÁLOGOS ENTRE TEORIA E PRÁTICA
positivo; razão, por isso, tem SAVIGNY6, ao dizer que o legis-
lador (fonte do direito positivo) tem uma tarefa de descobri-
mento e não de criação.
O direito positivo é, assim, o pensamento (a norma jurídi-
ca) que a sua fonte faz da conduta humana na sua interferência
intersubjetiva, para usar-se uma expressão de CÓSSIO7.
O exposto já permite afirmar-se, de logo, que o direito po-
sitivo “é cultura e cultura é realidade”, por entender-se que a
norma emitida pelo legislador é expressa através do costume
e originada no espírito do povo, daí submeter-se às variações
da temporalidade8.
Um objeto do conhecimento, com esse caráter cultural,
como o é o Direito, exige que se socorra da ideia de EDMUND
HUSSERL, para distingui-lo daqueles que habitam o espaço
designado, por esse pensador, como natural, ideal ou metafísi-
co, conforme o seguinte resumo feito por CARLOS CÓSSIO9:
Ontologias Regionais
Objetos caráter I caráter II caráter III
Ideias
irreais: não têm existência
não estão na experiência
neutros ao valor
Naturais reais: têm existência estão na experiência neutros ao valor
Culturais reais: têm existência estão na experiência valiosos positiva ou
negativamente
Metafísicos reais: têm existência
não estão na experiência
valiosos positiva ou
negativamente
O Direito, reafirme-se, é um objeto cultural, portanto, nes-
sa concepção ontológica, tem existência, está na experiência e
6. cf. Federico C. de Savigny. Système de droit romain. Paris, Libr. de Firmin. Didot
Frères, 1855.
7.
cf. Carlos Cossio. La teoria egologica del derecho y el concepto jurídico
de libertad. Segunda edicion. Buenos Aires: Abeledo-Perrot. 1964, p. 531.
8.
cf. Gerhart Husserl., cit. por Karl Larenz. Metodologia da ciência do di-
reito. 2ª ed. Trad. de José Lamego. Lisboa: Fundação Calouste Gulbenkian,
1989, p.134; cit. por Carlos Cossio. Ob. cit. p. 245.
9. cf. ob. cit. p. 56.

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