Três parcerias do ministério público com ONGs: novos diálogos entre estado e sociedade

AutorMario Luis Grangeia
CargoPesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Desigualdade (NIED), da Universidade Federal do Rio de Janeiro
Páginas67-95
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 12 - Nº 23 - Jan./Abr. de 2013
6767 – 95
Três parcerias do Ministério
Público com ONGs: novos diálogos
entre Estado e sociedade1
Mario Luis Grangeia2
Resumo
O artigo investiga motivações, estratégias e resultados de três parcerias entre o Ministério Público
(MP) e organizações não governamentais (ONGs) para efetivar direitos no Brasil. Inicialmente,
analisa-se o ativismo do MP e das ONGs e os requisitos ao diálogo entre eles. Estudam-se, então,
alianças do MP Federal com: o Instituto Brasileiro dos Direitos da Pessoa com Def‌iciência (IBDD),
pela acessibilidade aos edifícios públicos no Rio de Janeiro; a Escola de Gente, pela inclusão de
alunos com def‌iciência no ensino regular; e a SaferNet, pelo combate à pedof‌ilia e à discriminação
na internet. Após considerações sobre os proponentes das alianças, suas dinâmicas, resultados
e diferenciais das ONGs, são apontados, numa apropriação livre de modelo de Tilly, repertórios
de int eração entre MP e ONGs, como as proposições de ações, consultorias e termos de cooperação.
Palavras-chave: Cidadania. Ministério Público. ONG. Sociedade civil. Repertórios de interação.
1.Introdução
Desde a década de 1980, processos como o m de regimes autoritários na
América Latina e no Leste Europeu e a proliferação de organizações civis ge-
raram e reetiram mudanças no Estado, na sociedade e em suas relações. Tais
1 Este artigo resulta da pesquisa da dissertação Em nome da cidadania: Ministério Público, ONGs e efetivação
de direitos no Brasil, orientada pela professora Elisa Reis no Programa de Pós-Graduação em Sociologia e An-
tropologia (PPGSA) da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Sou grato a ela e aos dois pareceristas
de Política & Sociedade.
2 Pesquisador do Núcleo Interdisciplinar de Estudos sobre Desigualdade (NIED), da Universidade Federal do Rio
de Janeiro (UFRJ), analista de comunicação social do Ministério Público Federal. Doutorando e mestre em So-
ciologia (UFRJ), especialista em Sociologia Política e Cultura pela Pontifícia Universidade Católica (PUC-Rio)
e bacharel em Comunicação Social/Jornalismo (UFRJ). E-mail: mario.grangeia@gmail.com.
http://dx.doi.org/10.5007/21757984.2013v12n23p67
Três parcerias do Ministério Público com ONGs: novos diálogos entre Estado e sociedade | Mario Luis Grangeia
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mudanças associam-se à solidariedade, princípio que rege a sociedade civil –
Estado e mercado são regidos por autoridade e interesses – e ganhou espaço
com atores fora de associações tradicionais, como os sindicatos e partidos, e
em formatos como as organizações não governamentais (ONGs).
No Brasil, as ONGs proliferam na defesa de direitos e na execução de po-
líticas, por meio de diálogos variados com o Estado. Com demandas sociais e
por igualdade ou reconhecimento de diferenças, elas suscitam questões como
as de Reis (2011, p. 12, tradução livre): “A quem prestam contas? Como xam
prioridades? Como interagem com Estado e mercado? Quais são os seus pleitos
por legitimidade para afetar a agenda política?” Esse processo é paralelo à reno-
vação do Ministério Público (MP) após a Constituição de 1988. De órgão em
defesa do Executivo, ele tornou-se autônomo e advogado da sociedade, com
mais recursos para tutelar direitos coletivos. O MP “encontra-se em processo de
transformação; armou-se como ator político expressivo; estreitou laços com a
população; e sua atuação tem produzido efeitos positivos na implementação dos
direitos que compõem a cidadania” (SADEK, 2000, p. 37).
Novos atores sociopolíticos no Brasil, o Ministério Público e as ONGs
têm participado mais da agenda pública desde a Constituinte, assumindo pa-
péis de relevo após a volta à democracia ter sido liderada por personagens
familiares na política nacional. Sobram motivos, portanto, para ampliar a
compreensão sobre o MP e as ONGs e sobre estímulos e limites de seus diálo-
gos para efetivar direitos. Essa é a intenção deste artigo, que discute parcerias
entre tais agentes e seus possíveis efeitos a partir da revisão da literatura e de
três estudos de caso.
A próxima seção debate o ativismo do MP e das ONGs, examinando suas
causas, como a ampliação de poderes do órgão estatal e a redemocratização,
e seus efeitos, como a judicialização da política e a aproximação entre ONGs
e Estado. Tais circunstâncias, como se verá, favorecem as uniões sob análise.
Na seção 3, a predisposição de MP e ONGs para se unirem é debatida
com base na revisão de literatura e numa apropriação livre do modelo de
ação coletiva de Tilly (1978), que tem quatro fatores: interesses, organização,
mobilização e oportunidade. Criado para estudar a conversão de lutas pelo

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