A participação das ciências sociais na produção de conhecimento sobre mudanças climaticas

AutorAllan Rogério Veltrone - Thales Haddad Novaes de Andrade
CargoDoutorando em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos, Brasil - Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil
Páginas143-162
http://dx.doi.org/10.5007/1807-1384.2016v13n3p143
R. Inter. Interdisc. INTERthesis, Florianópolis, v.13, n.3, p.143-162 Set.-Dez. 2016
A PARTICIPAÇÃO DAS CIÊNCIAS SOCIAIS NA PRODUÇÃO DE
CONHECIMENTO SOBRE MUDANÇAS CLIMATICAS
Allan Rogério Veltrone
1
Thales Haddad Novaes de Andrade2
Resumo
O objetivo deste artigo é discutir a participação das ciências sociais na produção de
conhecimento sobre mudanças climáticas. Para este fim, analisaremos a produção
científica de Roger Jones, um dos autores-coordenadores do capítulo 2 do quinto
relatório do grupo de trabalho II do IPCC (Intergovernmental Panel on Climate
Change) que versa sobre dimensões humanas das mudanças climáticas, e assim
discutir a contribuição das ciências sociais em torno deste debate. Além disso,
apresentaremos e discutiremos diversos levantamentos cienciométricos. Nossa
hipótese é a de que a participação das ciências sociais ainda é muito pequena e que
somente as vertentes das ciências sociais que participam da produção de
conhecimento sobre mudanças climáticas são aquelas que se valem dos mesmos
parâmetros utilizados pelas ciências dominantes neste campo
Palavras-Chave: Mudanças Climáticas. Interdisciplinaridade. Paradigmas
científicos. Metodologias de Pesquisa
1 INTRODUÇÃO
Seria muito improvável alguém hoje em dia nunca ter ouvido expressões
como mudança climática, aquecimento global, etc.. Estas expressões estão
presentes na ciência, na mídia, na politica, e em diversas outras instancias, e não
são questões de fácil aceitação, havendo debates e discordâncias. Sendo assim,
trata-se de um tema social, e não somente meteorológico ou geológico.
A Grande visibilidade que o tema tem tido, pode ser em parte creditada ao
Intergovernmental Panel on Climate Chance (IPCC). Trata-se de um órgão das
Nações Unidas, que conta com delegações de 130 países e que tem como objetivo
realizar avaliações periódicas do estado do clima na Terra. O IPCC não faz
pesquisa, apenas compila dados de pesquisas existentes, contando com a ajuda de
diversos colaboradores. Os relatórios são produzidos em quatro etapas. A primeira
1 Doutorando em Ciência, Tecnologia e Sociedade da Universidade Federal de São Carlos, São
Carlos, SP, Brasil. Bolsista CNPQ. E-mail: allanveltrone@gmail.com
2 Doutor em Ciências Sociais pela Universidade Estadual de Campinas, Campinas, SP, Brasil.
Professor associado do Departamento de Ciências Sociais da Universidade Federal de São Carlos,
São Carlos, SP, Brasil E-mail: thales@sigmanet.com.br
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delas mostra evidências científicas de que a mudança climática esta ocorrendo. Na
segunda, são apresentadas as consequências destas mudanças, e a terceira propõe
soluções. A quarta seria uma síntese das anteriores. Esta ultima etapa deve antes
ser discutida entre os chefes de Estado. E os relatórios do IPCC, nesta ultima etapa,
vem sido contestados por diversos governos. Além disso, o IPCC expressa o grau
de incerteza em torno do conhecimento em seus relatórios. Utiliza, por exemplo,
terminologias como “provável”, “muito provável” e “extremamente provável” quando
realiza previsões climáticas (IPCC, 2015). Portanto, o IPCC se configura como um
arranjo cientifico-politico, operando com certo grau de incerteza.
O IPCC possui três grupos de trabalho. O primeiro é composto pelas ciências
físicas, e visa medir as mudanças climáticas. O segundo grupo tem como objetivo
medir as vulnerabilidades sócio-ambientais e econômicas causadas pelas mudanças
climáticas, enquanto o terceiro se foca nas ações de mitigação (IPCC, 2015). Com
exceção dos temas que são de estrito domínio das ciências naturais, pode-se
perceber que as ciências sociais podem atuar dentro do órgão.
No momento de inicio do presente artigo, o relatório mais recente do IPCC
datava de 2014. O relatório do grupo de trabalho II (aquele cujas competências mais
se aproximam das ciências sociais) foi presidido por Chris Field, da Universidade de
Stanford e Vicente Barros da Universidade de Buenos Aires (IPCC, 2014). Chris
Field é Ph.D. em biologia, diretor e fundador do Instituto Carnegie para a ciência,
parte do Departamento de Ecologia Global da Universidade de Stanford. No site
desta instituição, é apresentado como um pesquisador ambiental interdisciplinar com
foco nas mudanças climáticas (STANFORD, 2006-2008). Vicente Barros, por sua
vez, é Ph.D. em ciências meteorológicas, e membro do conselho cientifico argentino.
Nenhum dos dois coautores do II grupo de trabalho do IPCC tem formação em
algum domínio de ciências sociais ou outras humanidades, e Vicente Barros sequer
tem formação interdisciplinar. Não obstante, o relatório se propõe a analisar as
dimensões humanas das mudanças climáticas, como os mais afetados por elas e
oportunidades de mitigação, repetindo, diversas vezes, a expressão “sistemas sócio
ecológicos” (IPCC, 2014).
A questão climática demanda cooperação cientifica entre diferentes áreas, e
no atual estágio da modernidade em que nos encontramos, estas questões se
mostram complexas e compostas de multi-fatores, onde somente as expertises dos

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