Penal e processo penal

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PRINCÍPIO DA INSIGNIFICÂNCIA NÃO PODE SER APLICADO EM CRIME CONTRA O SISTEMA FINANCEIRO

Superior Tribunal de Justiça Recurso Especial n. 1580638/RS Órgão Julgador: 6a. T.

Fonte: DJ, 31.08.2017 Relator: Ministro Ne? Cordeiro

EMENTA

Recurso especial. Penal e processo penal. Art. 19 da lei 7.492/86. Financiamento em instituição finan-ceira mediante fraude. Crimes con-tra o sistema financeiro. Princípio da insignificância. Impossibilidade de aplicação. Multa. Prestação pecuniária substitutiva. Parcelamento. Limite de 30% da renda declarada. Possibilidade. Valor fixado. Súmu-la 7/STJ. Revolvimento em matéria fático-probatória. Recursos improvidos. 1. Firmou-se a jurisprudência desta Corte no sentido de que inaplicável o princípio da insignificância aos crimes contra o sistema financeiro, tendo em vista a neces-sidade de maior proteção à sua estabilidade e higidez (AgRg no AREsp 975.414/TO, Rel. Ministro Sebastião Reis Júnior, sexta turma, DJe 30/05/2017). Precedentes. 2. Não há ilegalidade na fixação, com es-teio em informações constantes dos autos, de parcelamento do valor em montante que não ultrapassa ao limite de 30% da renda declarada pelos sentenciados. 3. Tendo o Tribunal Regional sopesado elementos e considerado as particularidades fáticas dos autos na fixação dos dias-multa e da pena pecuniária, o acolhimento do pleito de revisão do valor estabelecido demandaria reexame de matéria fático-probatória, inviável em sede de recurso especial, ante o óbice da Súmula 7 desta Corte Superior. 4. Recursos especiais improvidos.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos os autos em que são partes as acima indicadas, acordam os Ministros da Sexta Turma do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos votos e das notas taquigráficas a seguir, por unanimidade, negar provimento aos recursos especiais, nos termos do voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Antonio Saldanha Palheiro, Maria Thereza de Assis Moura, Sebastião Reis Júnior e Rogerio Schietti Cruz votaram com o Sr. Ministro Relator.

Brasília, 22 de agosto de 2017 (Data do Julgamento)

MINISTRO NEFI CORDEIRO Relator

RELATÓRIO

O EXMO. SR. MINISTRO NEFI CORDEIRO (Relator):

Trata-se de recursos especiais interpostos por R. F. D., L.D. S. e C. A. D. S., todos com fundamento na alínea "a" do permissivo constitucional, em face de acórdão do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, assim ementado:

Penal e processo penal. Apelação criminal. Artigo 19 da Lei n. 7.492/86. Obtenção de financiamen-to mediante fraude. Pronaf. Prejuízo financeiro. Desnecessidade. Princípio da insignificância. Inaplica-bilidade. Materialidade. Autoria. Dolo. Comprovação. Condenação mantida. Multa. Prestação pecuniá-ria. Condições financeiras. Análise da compatibilidade. 1. Praticam o delito do artigo 19, caput e parágrafo único, os agentes que obtêm financiamentos concedidos pelo Banco do Brasil através do PRONAF - Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultora Familiar, mediante fraude, consistente na utilização de interposta pessoa e na apresentação de contrato de arrendamento falso.

2 . O tipo penal do artigo 19 da Lei 7.492/86 se consuma indepen-dente do prejuízo financeiro que possa ser causado, tendo em conta que o referido regramento objetiva zelar pela solidez das instituições financeiras, mantendo a credibili-dade das aludidas instituições e a proteção do investidor, de forma a garantir e normatizar a atividade do Estado em levantar recursos finan-ceiros e administrar seu dispêndio, tutelando a boa e segura condução da política financeira, a fim de evi-tar condutas espúrias. Entendimento firmado pela e. Quarta Seção deste Tribunal no julgamento dos EINUL n. 5004384-51.2010.404.7200 (Relatora Des. Federal Cláudia Cristina Cristofani, juntado aos autos em 05/02/2015). 3. O bem jurídico tutelado pelo artigo 19 da Lei dos Crimes contra o Sistema Financeiro Nacional não se traduz em um determinado valor econômico, sendo inaplicável o princípio da insignificância. 4. Materialidade, autoria e dolo devidamente comprovados. 5. A pena de prestação pecuniária deve ser arbitrada em valor excessivo de modo a não tornar o réu insolvente ou irrisório, que sequer seja sentida como sanção, permitindo-se ao magistrado a utilização do conjunto de elementos indicati-vos de capacidade financeira, tais como a renda mensal declarada, o alto custo da empreitada criminosa, o pagamento anterior de fiança ele-vada. 6. Somente o excesso desproporcional representa ilegalidade na fixação da prestação pecuniária e da multa e autoriza a revisão fundamentada pelo juízo recursal. 7. Apelações criminais desprovidas.

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R. F. D. pretende, inicialmente, a aplicação do princípio da insignificância, sob o argumento de que não houve lesão significativa ao bem jurídico - patrimônio da União -, não se justificando a intervenção pe-nal do Estado. Impugna o entendimento quanto à impossibilidade de aplicação do princípio da bagatela ao crime descrito no art. 19, caput e parágrafo único, da Lei n. 7.492/86, aduzindo que presentes, na hipótese, os vetores objetivos para a sua incidência.

Sustenta excesso na aplicação da pena de multa, defendendo interpretação equivocada do art. 49, § 1º, do Código Penal.

Argui, ainda, ofensa aos arts. 44, 45 e seguintes do CP, inobservância ao princípio da proporcionalidade, bem como ao real sentido da pena pecuniária, aduzindo que o seu valor deve ser sopesado dentro da situação econômica do réu e pela sua culpabi-lidade (art. 59 do CP), cujos parâme-tros não foram devidamente aplicados, porque, a despeito da valoração positiva das circunstâncias judiciais, com a fixação da pena-base no míni-mo legal, a prestação pecuniária imposta foi cinco vezes maior do que o valor mínimo legal, e que corresponde a quase cinco vezes mais do que sua renda mensal. Assinala que somente será possível o pagamento da reprimenda se houver o seu parcelamento, dado o valor despropor-cional fixado, o que não encontra amparo na legislação penal (?. 785). Argumenta que, por estar assistido pela Defensoria Pública, presumida estaria a hipossuficiência.

Requer o provimento do recurso para que reconhecida a atipicidade da conduta, bem como para fins de redução da multa ao mínimo legal, tanto no que toca ao valor quanto à quantidade, e para que estabelecida a pena de prestação pecuniária em patamar proporcional à renda e à culpabilidade do acusado.

L.D. S. alega, em suas razões, interpretação equivocada dos arts. 171 do CP e 383 do CPP, sob o argumento de que o princípio da insig-nificância deve ser aferido por meio da análise casuística da adequação material da conduta humana ao tipo penal, deduzindo se de fato afeta o bem jurídico tutelado (?. 802). Sa-lienta que, na hipótese, o mútuo realizado - que não ultrapassa R$ 5.000,00 - não...

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