Pequenas e médias empresas e o mercado de trabalho em transformação - um olhar sobre a questão social

AutorMaria Cecília Máximo Teodoro/Márcio Túlio Viana/Cleber Lúcio De Almeida/Sabrina Colares Nogueira
Páginas244-250

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Apresentação

A globalização trouxe consigo a abertura dos mercados, que, além de aumentar a concorrência entre as empresas, também tem provocado mudanças significativas no mercado de trabalho. Com o fim do chamado emprego pleno, no período pós-guerra, novas formas de trabalho surgiram, sendo crescente o incentivo à livre iniciativa e ao empreendedorismo. Assim, assiste-se ao crescimento do número de empresas de pequeno e médio porte, as quais passam a ocupar lugar de relevo na criação de empregos, sem contar, contudo, com o necessário suporte para manutenção da produtividade e melhor qualidade dos empregos gerados. As práticas desleais de concorrência, passam a exigir maior flexibilização por parte das empresas por elas atingidas, culminando por prejudicar ainda mais a parte hipossuficiente da relação, o trabalhador, que se vê exposto a condições abaixo do mínimo aceitável, sem qualquer perspectiva. Diante da expressiva prevalência destas empresas no mercado nacional e mundial, considerando-se o número de postos de trabalhos delas advindas, verifica-se a necessidade de um olhar diferenciado para aqueles que dali retiram seu sustento, através, principalmente, do diá-logo e de políticas de incentivo, priorizando a preservação do emprego, a realização efetiva de sua função social e a efetivação das garantias previstas, em especial, no art. 23 da Declaração Universal dos Direitos Humanos.

1. Introdução

O fenômeno da globalização, constatado principal-mente a partir da metade do século XX até o começo do século XXI, aproximou as relações humanas em todas as suas áreas e incentivou o surgimento dos blocos econômicos, nos quais se tem um intercâmbio de pessoas e mercadorias mais intenso, chegando até o patamar no qual se encontra a União Europeia, exemplo mais avançado da integração regional, que possui autoridades políticas e administrativas supranacionais.

A abertura dos mercados, com o domínio de grandes grupos, vem acirrando a cada dia a concorrência entre as grandes empresas, quem competem entre si pelo domínio do mercado, e as pequenas empresas, que enfrentam os gigantes na busca pela sua sobrevivência.

A política de incentivo ao empreendedorismo, com a criação de micro e pequenas empresas no Brasil, vem gerando resultados consideráveis na economia nacional. Segundo dados do Sebrae Nacional, em 2002, haviam 6,4 milhões de estabelecimentos no país, sendo 99% destes micro e pequenas empresas, as quais, juntas, respondiam por 52% dos empregos formais no Brasil.

Conforme levantamentos da OIT, realizado em 18 países da OCDE (Organização para Cooperação e Desenvolvimento Econômico), as pequenas e médias empresas, incluindo neste rol as microempresas, respondem por 63% do total de postos de trabalho.

Com números tão expressivos, estas empresas, que garantem 16,1 milhões de empregos no país, demandam uma atenção especial, como forma de auxílio na manutenção de sua existência e garantia de tratamento digno das relações de trabalho por elas mantidas.

A busca pelo menor custo de produção, como forma de maximizar os lucros e alavancar a situação da empresa no atual mercado, alcançando vantagens sobre as concorrentes, ou, até mesmo, como forma de lhe garantir a sobrevivência, dadas as formas desleais de concorrência, acaba por gerar danos às relações de trabalho, as quais são tomadas como verdadeiras mercadorias, passíveis de barganha, como saída para a minimização dos gastos.

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Enfim, diante da diversidade de práticas possíveis, como forma de garantir a permanência da empresa no mercado, garantindo-lhe sua subsistência ou, no caso das grandes incorporações, o lugar de ponta na escala da concorrência, é fato que as relações do trabalho, pela influência que geram no preço final do produto, também são alvo das manobras adotadas pelo mercado atual.

Necessário, portanto, analisar as condições de criação e subsistência destas empresas, diante das transformações pelas quais passa o mundo do trabalho e o mercado mundial, tendo como escopo principal, sob a ótica dos direitos humanos, promover a tutela jurídica adequada a esta categoria.

2. O mundo do trabalho em transformação

O mundo do trabalho passa por constantes modificações, motivadas, principalmente, pelas novas tecnologias, pela abertura dos mercados e pelo crescente processo de globalização. A forma de produção capitalista impõe-se cada vez mais, levando o cenário atual a vertentes completamente divergentes daquelas experimentadas no período pós-guerra até o início da década de 70. Época marcada pelas altas taxas de criação de empregos, caracterizada, principalmente, pela presença de grandes indústrias, assentadas no modelo fordista de produção, em que predominava a contração por prazo indeterminado, com jornada integral.

Neste período, marcado pelo crescimento da produtividade e a geração de empregos, nasce a legislação trabalhista, que surge para regulamentar as relações entre empregadores e empregados, tendo como pano de fundo a manutenção das condições econômicas e políticas estabelecidas. Nesta época, a negociação coletiva exerceu papel relevante para a regulamentação das condições de trabalho, traduzindo a importância e a força das entidades sindicais no momento.

A proteção aparente do trabalhador tem, também, o objetivo de manter o controle da situação como estava posta, e a manutenção do poder.

Após este período, entretanto, em meados da década de 70 e início dos anos 80, com a abertura dos mercados e a aplicação de novas tecnologias, o cenário do pleno emprego passa por mudanças significativas.

As novas formas capitalistas passam a exigir das empresas ainda mais capacidade de competir no mercado. A ordem, doravante, é produzir cada vez mais por menos, o que afetou os países em desenvolvimento, em detrimento das grandes economias, contribuindo para o distanciamento entre as duas e a instalação de crises econômicas.

Surge, então, o paradoxo das relações de trabalho: o trabalhador ganha cada vez mais importância no processo produtivo e se torna cada vez mais vulnerável, notadamente em função das novas formas de produção que passam a existir.

Isso porque o trabalho, entendido pela OIT como uma virtude, fonte de justiça social e de igualdade, é tratado, contrariando seus princípios, como mercadoria, sendo moeda de troca para as empresas que pretendem exterminar a concorrência das pequenas indústrias, para controle soberano do mercado e alcançar as maiores e melhores vantagens sobre seus reais concorrentes, de mesmo porte e poderio que o seu.

Diante desta realidade do capitalismo sem reciproci-dade, emerge a necessidade da proteção do trabalhador, da luta pela manutenção das suas conquistas e, principalmente, pelo alcance da justiça social.

O cenário global atual, as tendências do mercado e as constantes alterações do cenário econômico são motivo de grande preocupação para o mundo do trabalho, justificando-se a grande preocupação da OIT, levada a discussão da 104ª Sessão da Conferência Internacional do Trabalho.

Fazendo-se uma retomada histórica dos modos de produção, é possível verificar-se as alterações sofridas pelo mundo do trabalho. Tal contexto traduz sua importância na viabilidade de análise das tendências e, ainda, em virtude do conhecimento que agrega, possibilitando um olhar mais crítico e construtivo para as medidas a serem postas em prática.

O modelo taylorista, que privilegiava a produtivi-dade, em detrimento da aplicação de novas tecnologias, traduzindo-se em um modelo eminentemente capitalista. A força de trabalho, explorada ao máximo, em virtude do modo de remuneração baseado na produção individual de cada trabalhador, não detinha qualquer ligação com as atividades intelectuais.

A responsabilidade pelo planejamento, estudos e organização da empresa era exclusiva dos detentores de cargos de gestão, o que, segundo o modelo, permitia o controle máximo dos...

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