Perspectiva contratual da relação de emprego

AutorAugusto César Leite de Carvalho
Ocupação do AutorPossui mestrado em Direito Constitucional pela Universidade Federal do Ceará e doutorado em Direito das Relações Sociais
Páginas388-521

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12. 1 A índole (também) patrimonialista da regência laboral

No capítulo anterior, ressaltamos a contribuição da Constituição brasileira de 1988 e da ordem jurídica que a ela sobreveio quanto ao propósito de conferir à relação de emprego um conteúdo mais ainado com o catálogo de direitos fundamentais e de direitos da personalidade exigíveis em todos os ambientes de convivência humana, natural e juridicamente vocacionados a conigurar-se como biomas ecologicamente equilibrados.

Por sua vez, o contrato é a categoria jurídica que permite, a partir de um ajuste entre interesses e vontades de pessoas ou entes diferentes, a permuta entre bens da vida revestidos de conteúdo patrimonial. Regra geral, o contrato não serve ao intercâmbio entre direitos desvestidos de conteúdo econômico como a identidade, a honra, a imagem, a liberdade, a vida.

A relação de emprego não se descola inteiramente de sua origem contratual, assim sucedendo ao menos por três razões: a) a teoria dos contratos oferece conceitos e regras, historicamente construídos, que são vinculativos de efeitos jurídicos relevantes; b) a regência dos contratos sofreu igualmente a inluência dos postulados da eticidade e da socialidade de modo a sintonizá-la com as expectativas de boa-fé e de função social próprias a uma visão humanitária das relações interpessoais ou coletivas; c) o núcleo contratual, ao revelar a ascética troca entre trabalho e salário, apresenta um nicho de interesses contrapostos cujas projeções econômicas devem manter-se em constante equilíbrio (ou em justo grau de assimetria)1018, independentemente da incidência de direitos imateriais.

Essas são razões suicientes, ao que nos parece, para que não descuidemos da perspectiva contratual do liame empregatício. Dela cuidaremos nos subitens seguintes.

12. 2 Natureza jurídica da relação de emprego

No âmbito do direito civil, as fontes de relação jurídica1019, ou seja, da obrigação, são a lei, os atos jurídicos – unilaterais ou bilaterais – e o ato ilícito. Há autores que acrescentam a essas fontes o risco proissional, que obrigaria o empregador, com ou sem culpa, a ressarcir os danos padecidos pelo empregado, por ocasião do trabalho. Arnoldo Wald1020 redarguia, faz algum tempo, essa orientação, ao argumento de “que se trata de obrigação estabelecida pela lei, em que o risco proissional é apenas o fundamento sociológico da obrigação”.1021

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12.2. 1 As teorias anticontratualistas

Seria o ajuste de vontades o motor inicial do vínculo de emprego? Já vimos a dificuldade de se conceber o momento em que empregado e empregador combinariam as condições do contrato, tanto pela debilidade daquele quanto pela despersonalização deste.

São duas as principais manifestações do pensamento anticontratualista: a teoria da relação de trabalho e o institucionalismo.

12.2.1. 1 A teoria da relação de trabalho

Conforme Mascaro Nascimento1022, aos relacionistas se integram todos os teóricos do direito do trabalho que negam a importância da vontade na constituição e no desenvolvimento da relação laboral, preferindo “entender que a prática de atos de emprego verificada no mundo físico e real é a fonte da qual resultam todos os efeitos previstos na ordem jurídica e que recairão imperativamente sobre os sujeitos empregados. Daí substituírem a ideia de convenção ou acordo pela de inserção, engajamento ou ocupação de trabalhador pela empresa, querendo com isso expressar que não existe ato volitivo criador de direitos e obrigações, mas sim um fato objetivo e independente de qualquer manifestação subjetiva, na constituição da relação jurídica trabalhista”.

Entre os relacionistas enumerados por Amauri Mascaro Nascimento1023 está Mario de la Cueva, cuja teoria do...

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