Pinguço', 'Cachaça', 'Bebum': a sociodinâmica da estigmatização no trabalho naval
| Autor | Elizabeth Espindola Halpern - Ligia Costa Leite |
| Cargo | Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro/RJ, Brasil |
| Páginas | 329-351 |
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R. Ci. Hum., v. 48, n. 2, p. 329-351, jul-dez 2014
Um estudo de casos múltiplos e explanatório
foi realizado entrevistando 13 pacientes de um am-
bulatório de dependência química da Marinha do
Brasil, objetivando examinar o papel da instituição
na construção do alcoolismo dos pacientes. O ob-
jetivo central deste artigo foi discutir um dos resul-
tados da pesquisa central: as razões que envolvem
a atribuição dos rótulos aos pacientes e seus efei-
tos. A amostragem, a coleta, análise e interpretação
dos dados foram feitas de forma circular. Dentre os
resultados, constatou-se que existe uma sociodinâ-
mica da estigmatização resultante de conjunturas
peculiares ao funcionamento da instituição naval,
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ses indivíduos e que podem exacerbar o curso do
envolvimento com o álcool. O esclarecimento so-
bre os diversos aspectos envolvidos na construção
do alcoolismo ajuda a ver esses pacientes livres de
rótulos, permitindo a adoção de medidas de prote-
ção ao trabalhador.
Palavras-chave: alcoolismo; estigma; militares;
condições de trabalho.
A multiple case study and an explanatory re-
search were carried on by interviewing 13 patients
of an outpatient clinic for chemical dependency of
the Brazilian Navy, in order to exam the institu-
tion’s role in the construction of the patients’ al-
coholism. The central objective of this article was
to discuss one of the aspects of the main research:
the reasons involving the attribution of labels to
patients and their effects. Sampling, data collec-
tion, analysis and interpretation of data were con-
ducted in a circular manner. Amongst the results, it
could be observed the social dynamics of stigmati-
zation, resulting from the peculiarities of the naval
institution functioning that helps to post a label of
inferiority in these individuals, and that exacerba-
tes the course of their involvement with alcohol.
The elucidation on the various aspects involved in
the construction of alcoholism allows perceiving
these patients free of tags, enabling the adoption of
protective measures to the employee.
Keywords: alcoholism; stigma; military; working
conditions.
Introdução
A relação do ser humano com o álcool esteve presente na história da civi-
lização de diferentes formas, atrelado a hábitos, crenças e práticas individuais,
místicas e religiosas, ou pelo lado das sensações de bem-estar e de prazer”
(SANTOS, 2006, p. 65).
“Pinguço”, “Cachaça”, “Bebum”: a sociodinâmica da estigmatização
no trabalho naval
“Pinguço”, “Cachaça”, “Bebum”: sociodynamics stigmatization in
naval work
http://dx.doi.org/10.5007/2178-4582.2014v48n2p329
Elizabeth Espindola Halpern e Ligia Maria Costa Leite
Universidade Federal do Rio de Janeiro, Rio de Janeiro/RJ, Brasil
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HALPERN, E. E.; LEITE, L. M. C. “Pinguço”, “Cachaça”, “Bebum”: a sociodinâmica da estigmatização...
Embora a prática do beber tenha sido bem aceita por muito tempo, a per-
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culo XVIII. Com a urbanização das cidades europeias, e em resposta às mu-
danças advindas com a era moderna, ocorreu um fácil acesso às bebidas mais
concentradas pela inovadora destilação do um efeito
sobretudo entre os pobres e excluídos socialmente, fazendo emergir os primei-
Sáad (2001), a embriaguez teria assumido o status
mormente relacionada aos novos conceitos de tolerância e de abstinência. Per-
cebida como problema, passou das mãos do clero e dos moralistas, ocupando
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dico Benjamim Rush, em 1810, derivou da própria construção da medicina
ocidental contemporânea. Com efeito, o alcoolismo foi enquadrado em uma
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temporânea ocidental que emergiu com a Renascença, fruto de uma medicina
o alcoolismo está diretamente referida aos padrões de consumo do álcool,
mormente associados à frequência e quantidade do uso (McLEOD; STO-
CKWELL; STEVENS; PHILLIPS, 1999; VALENCIA-MARTÍN; GALÁN;
RODRÍGUEZ-ARTALEJO, 2008).
A despeito de essa visão ser dominante, este estudo procurou ampliar o
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VES, 2004), ou melhor, o alcoolismo visto como um evento urbano dentre os
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do de múltiplos processos que facilitam a sua constituição. Como Venâncio e
(p. 9).
Descrição do campo
A Marinha do Brasil (MB) criou, em 1997, um ambulatório especializado
no tratamento da dependência química, o Centro de Dependência Química
(CEDEQ), sediado em um hospital militar, incumbido de tratar militares por
meio de terapia de grupo ou individual e acompanhamento medicamentoso.
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