Planejamento sucessório e possíveis instrumentos

AutorDaniele Chaves Teixeira
Páginas299-338
PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO
E POSSÍVEIS INSTRUMENTOS
Daniele Chaves Teixeira
Doutora e Mestre em Direito Civil pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro-UERJ;
Especialista em Direito Privado Patrimonial pela Pontifícia Universidade Católica do Rio
de Janeiro; Especialista em Direito Civil pela Università degli Studi di Camerino, Itália;
Pesquisadora Bolsista do Max-Planck-Institut für ausländisches und internationales
Privatrecht, Alemanha; Professora de Cursos de Pós-Graduação Lato Sensu de Direito
Civil .Parecerista e Advogada.
Sumário: 1. Notas introdutórias: questões relevantes sobre o planejamento sucessório –
2. Alguns instrumentos que viabilizam o planejamento sucessório; 2.1. Testamento; 2.2.
Seguro de vida; 2.3. Usufruto; 2.4. Doação; 2.5. Partilha em vida; 2.6. Previdência Privada;
2.7. Trust; 2.8. Holding; 2.9. Fundação; 2.10. Fundo de rendimento – 3. Considerações sobre
planejamento sucessório – 4.Referências Bibliográcas.
1. NOTAS INTRODUTÓRIAS: QUESTÕES RELEVANTES SOBRE O
PLANEJAMENTO SUCESSÓRIO1
O direito sucessório trata de uma questão muito delicada para as pessoas, que
é exatamente, encarar a finitude humana, ou seja, a própria morte, pois a morte é
inexorável. O contraditório é que a única certeza que pode-se ter na vida é que todo
ser humano morre, contudo, essa certeza vem acompanhada de outra incerteza
que é precisar o momento exato do fim. Assim, tratar da sucessão em vida sempre
representou um enorme tabu. Entretanto, as características da sociedade brasileira
atual demanda por uma estruturação patrimonial, desta maneira, o planejamento
sucessório vem atender essa procura por uma organização e propicia que as pessoas
enfrentem essa dificuldade humana, de lidar com a morte.
O Código Civil brasileiro, na parte do livro do Direito das Sucessões, pouco avan-
çou; reflete ainda institutos que não se coadunam com a sociedade contemporânea,
com todas as complexidades sociais, porque muitas vezes o sistema atual das suces-
sões “não atende aos anseios finais dos indivíduos, detenham eles vasto patrimônio
ou não”2. O Código Civil de 2002, no que concerne ao direito sucessório, tem como
base uma família que não corresponde com o perfil das famílias da atual sociedade
1. Uma análise mais profunda sobre o tema planejamento sucessório V. TEIXEIRA, Daniele. Planejamento
Sucessório: pressupostos e limites. 2. ed. Belo Horizonte: Fórum, 2019.
2. GAYA, Karyna Saraiva Leão. PLANEJAMENTO Sucessório: uma Saudável Preocupação com o Futuro,
Revista Síntese –Direito de FAMÍLIA. Ano XIII – No 70 – Fev./Mar 2012, p. 124.
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brasileira, pode-se entender que o planejamento sucessório é a consequência maior
do fenômeno da pluralidade familiar da sociedade3.
O surgimento de novos institutos e reinterpretações dos antigos com a despa-
trimonialização e a funcionalização dos institutos de Direito Civil, em especial no
direito sucessório frente à legalidade constitucional vem ampliar as potencialidades
de um planejamento sucessório com a flexibilização dos instrumentos jurídicos.
Principalmente, porque o planejamento pode servir como meio para corrigir distor-
ções causadas pelas regras legais.
A sucessão que é a transmissão de direitos pode ocorrer em vida (inter vivos)
ou após a morte (causa mortis)4. Contudo, o direito sucessório é todo dedicado à
sucessão causa mortis, que se verifica a título universal ou singular. No caso a título
universal há a herança e quem a recebe é o herdeiro, já quando é a título singular é
o legado e quem o recebe é o legatário5. Com a morte ocorre a abertura da sucessão
é nesse momento que nascem os direitos hereditários.
Vale destacar que o sistema sucessório adotado pelo Código Civil brasileiro é
dual, ou seja, existem a sucessão testamentária e a sucessão legítima6. Dessa forma,
a sucessão mortis causa é deferida por testamento ou por lei, chama-se sucessão
testamentária quando deriva do ato de ultima vontade praticado pela forma e nas
condições estabelecidas na lei. Já a sucessão quando se dá em virtude de lei chama-se
legítima ou legal, a sucessão legal ou legitimaria não pode ser afastada pela vontade
de quem lhe dá causa7 e a ordem de vocação vem definida em lei. Assim, pretende-se
demonstrar a insuficiência do sistema sucessório brasileiro, pois, tem uma estrutura
rígida para atender às demandas atuais dos autores de herança.
O objetivo do planejamento sucessório é determinar a sucessão, pois, é uma
atividade “preventiva com o objetivo de adotar procedimentos, ainda em vida do
titular da herança, com relação ao destino de seus bens após a sua morte”8. Assim,
se faz necessário a busca de novas ferramentas, para “compor [a] sucessão de modo
3. HIRONAKA, Giselda. Planejar é preciso: planejamento sucessório para as novas famílias. Entrevista. In:
Revista Ibdfam – Instituto Brasileiro de Direito de Família. Ed. 10 – Abril de 2014, Belo Horizonte: IBDFAM,
2014, p. 6.
4. Na sucessão inter vivos trata da transferência de direitos e obrigações entre pessoas vivas, como exemplo
à doação. Na segunda forma, da sucessão causa mortis, ocorre que com a morte os direitos e obrigações de
uma pessoa são transferidos aos seus herdeiros legítimos, testamentários e legatários. V. TEIXEIRA, Silvia
Maria Benedetti. Planejamento Sucessório: Uma Questão de Reflexão, Revista Brasileira de Direito de Família.
Ano VIII – N°31 – Ago-Set, Porto Alegre: Síntese, 2005, p. 6.
5 . TEPEDINO, Gustavo; BARBOZA; Heloisa Helena; MORAES, Maria Celina Bodin de. Código Civil interpretado
conforme a Constituição da República IV. Rio de Janeiro: Renovar, 2014, 529.
6. PEREIRA, Caio Mario da Silva. Instituições de direito civil – Direito das sucessões. VI. 15. ed. ver. e atual. por
Carlos Roberto Barbosa Moreira. Rio de Janeiro: Forense, 2005, p. 2.
7. GOMES, Orlando. Sucessões. 12. ed. rev. atual. e aumen. por Mario Roberto Carvalho de Faria. Rio de Janeiro:
Forense, 2004, p.8.
8. TEIXEIRA, Silvia Maria Benedetti. Planejamento Sucessório: Uma Questão de Reflexão, Revista Brasileira
de Direito de Família. Ano VIII – N°31 – Ago-Set, Porto Alegre: Síntese, 2005, p. 6.
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a atender a vontade dos titulares do patrimônio”9, existentes em outros ramos do
direito privado, para auxiliarem nas novas exigências sociais, que evidenciam a ne-
cessidade crescente de se “planificar a transferência do patrimônio pessoal de uma
forma racional e segura, respeitados os comandos da legislação vigente”10.
No ordenamento jurídico brasileiro, segundo a Constituição da República Fe-
derativa do Brasil de 1988 (CRFB/1988), art. 5º, XXX em relação à sucessão causa
mortis, a herança é uma garantia fundamental11. Os bens do finado serão transmitidos
aos seus sucessores, conforme as prescrições legais. Pela primeira vez esse direito
vem expresso em uma Constituição brasileira, embora se compreendesse implici-
tamente essa garantia como decorrência do direito de propriedade. Pode-se afirmar
que o reconhecimento da sucessão mortis causa constitui garantia constitucional do
direito à propriedade (CRFB/1988, art. 5º, caput, XXII e XXIII)12.
Assim, a função do Direito das Sucessões é estabelecer o destino das situações
jurídicas do autor da herança transmissíveis em consonância com os ditames consti-
tucionais. Contudo, embora o direito de herança seja uma garantia fundamental no
Direito brasileiro, pode-se afirmar que poucas mudanças foram registradas quanto ao
Direito das Sucessões, diferentemente do que ocorreu em outras áreas do Direito Civil.
Com efeito, tem que se analisar o que é um planejamento sucessório e para qual
finalidade? Então, o que é um planejamento sucessório? É instrumento jurídico que
permite a adoção de uma estratégia voltada para a transferência eficaz e eficiente do
patrimônio de uma pessoa após a sua morte13, vale destacar que o planejamento é
realizado em vida e sua completa aplicabilidade vai ocorrer com a sua morte. Ele
é essencial para quem quer a realização de sua vontade após sua morte, e pode ser
realizado por meio de diversos instrumentos jurídicos: o testamento é só um deles.
O planejamento sucessório, envolve várias áreas do direito civil, como o pró-
prio direito das sucessões, direito de família, direito dos contratos, entre outros
institutos civis, conjugado também, ao direito empresarial, com questões de direito
9. DIAS, Maria Berenice. Manual das Sucessões. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009, p. 382.
10. MADALENO, Rolf. Planejamento sucessório, Revista IBDFam: Famílias e Sucessões. v. 1, jan./fev. Belo
Horizonte: IBDFam, 2014, p. 12.
11. Judith Martins-Costa questiona sobre se a introdução da herança como garantia em sede constitucional
modifica o seu conteúdo ou as suas funções, pois, em sentido lato, a “palavra herança designa o acervo de
bens, direitos e obrigações atribuíveis a alguém em virtude da sucessão mortis causa, significando a univer-
salidade dos bens que alguém deixa por ocasião de sua morte e que os herdeiros adquirem.” (MARTINS-
-COSTA, Judith. O direito sucessório na Constituição: a fundamentalidade do direito à herança, Revista do
Advogado – AASP. São Paulo: AASP, ano XXXI, n. 112, jul. 2011, p. 81).
12. NEVARES, Ana Luiza Maia. A função promocional do testamento: tendências do Direito Sucessório. Rio de
Janeiro: Renovar, 2009, p. 7-8.
13. Euclides de Oliveira define planejamento sucessório como “a organização em vida da divisão do patrimônio,
entre o cônjuge e os herdeiros, preparação dos gestores e dos investidores, criação de mecanismos de admi-
nistração societária, empresarial e fiscal” (OLIVEIRA, Euclides de. Planejamento sucessório: regime de bens
e seu reflexo na transmissão da herança. FIESP. Disponível em: <http://www.fiesp.com.br/irs/conjur/pdf/
transparencias_reuniao_conjur_25_10_10_-_euclides_benedito_de_oliveira_planej_sucess_palest_conjur.
pdf. Acesso em: 14 jul. 2011).
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