Planos de saúde usam congresso para subverter lei

AutorAna Paula Souza Cury
CargoAdvogada
Páginas17-18
TRIBUNA LIVRE
REVISTA BONIJURIS I ANO 30 I EDIÇÃO 650 I FEVEREIRO 2018 17
va bastante limitada e incipiente,
também pelo fato de que a cultura
jurídica brasileira sempre foi alta-
mente abstrata e formalista.
Shirley noticiou também que,
além do acima exposto, uma outra
área está em desenvolvimento no
mundo ocidental – o estudo socio-
lógico e antropológico das institui-
ções jurídicas, incluindo tribunais,
advogados e a polícia. O referido
autor realizou estudo comparativo
das instituições jurídicas, com espe-
cial relevância para a antropologia,
por considerar ser esse um aspecto
fundamental da ciência.
Robert Weaver Shirley foi pos-
sivelmente o pioneiro, no Brasil, a
conceituar “antropologia legal”, res-
salvando que tal empreitada não
seria possível se se prescindisse
das teorias formuladas por Thomas
Hobbes (Leviathan), Eugen Ehrli-
ch (Fundamental principles of the
sociology of law), Wilhem Aubert
(Sociology of law), Jean Carbon-
nier (Flexible droit), Hans Kelsen
(General theory of law and state), L.
A . Hart (The concept of law), Max
Weber (Economy and society), An-
thony F. C. Wallace (Administrative
forms of social organization).
A antropologia, de uma maneira
geral, tem um vasto campo de estu-
dos, centrando suas atenções sobre
o homem e a cultura; o que por si
só já é sobremaneira vasto, abran-
gendo quase tudo o que existe. Isto
a faz ter algo em comum com o di-
reito, que pretende abarcar toda a
realidade social.
MARIA FRANCISCA CARNEIRO
Pós-doutora em Filosofi a pela Universi-
dade de Lisboa. Doutora em Direito pela
UFPR; mestre em Educação pela PUC/
PR.Advogada (licenciada) e bacharel em
Filosofi a pela UFPR.
Ana Paula Souza Cury AdvogAdA
PLANOS DE SAÚDE USAM CONGRESSO PARA SUBVERTER LEI
Apresentada pela pri-
meira vez no ano de
2006, tramita hoje em
regime de urgência
na Câmara dos Depu-
tados o Projeto de Lei
7.419/2006, o qual con-
ta com mais de uma
centena de emendas e encontra-se
capitaneado pela Comissão Espe-
cial sobre Planos de Saúde.
A proposta, que se iniciou com
o humilde escopo de inserir na Lei
dos Planos de Saúde a necessida-
de de cobertura das despesas dos
acompanhantes de menores de 18
anos, foi passando por diversas me-
tamorfoses e crescendo em comple-
xidade e alcance, chegando em 2017
como uma proposta apta a repagi-
nar todo o setor de saúde suplemen-
tar, afetando os quase 50 milhões de
usuários e as dezenas de empresas
que oferecem estes serviços.
Longe de ser vista como positiva
aos usuários, a proposta vem sendo
duramente criticada por entidades
de defesa do consumidor, já que en-
tre as mudanças constam a possibi-
lidade de se liberar o livre reajuste
dos planos individuais e de acabar
com o rol mínimo de coberturas
obrigatórias, aumentar a copartici-
pação dos usuários, criar uma nova
defi nição do rol de cobertura como
forma de reduzir os custos das em-
presas, e até mesmo proibir a apli-
cação do Código de Defesa do Con-
sumidor nos contratos de planos de
saúde, o que signifi caria que as deci-
sões judiciais em ações contra o se-
tor não poderiam mais se basear no
CDC, o qual protege o consumidor
como a parte mais fraca da relação.
Segundo estudo da Faculdade
de Medicina da USP, divulgado em
fevereiro de 2017, as ações contra
os planos de saúde, em São Paulo,
aumentaram 631% entre 2011 e 2016,
sendo que a exclusão de cobertura,
negando a realização ou o reembol-
so de procedimentos e medicamen-
tos, é a razão que move quase meta-
de das demandas.
Para o relator do projeto, é pre-
ciso “racionalizar” o sistema de
saúde suplementar, dando equilí-
brio econômico-fi nanceiro para as
empresas. Em sua visão, o Judici-
ário
“transborda” o que determina
a Constituição e passa obrigações,
que a seu ver seriam estaduais,
para os operadores privados. Além
disso, acredita que a modernização
do atendimento médico, com a in-
corporação de novas tecnologias às
coberturas, seria um ponto negati-
vo ao impactar as operadoras que,
então, repassam os custos a todos
os usuários e tornam os valores
abusivos.
Ecoando o que pensa o relator –
ou vice-versa –, o diretor-presidente
da Unimed afi rmou que o cresci-
mento da judicialização do setor
prejudica o equilíbrio econômico
nanceiro das operadoras, que esta-
riam operando com reajustes abai-
Revista_Bonijuris_NEW.indb 17 23/01/2018 21:05:16

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