A plena capacidade civil da pessoa maior com deficiência intelectual ou psíquica e a funcionalização do sistema de apoio por meio da curatela

AutorAna Beatriz Lima Pimentel Lopes e Vanessa Correia Mendes
Ocupação do AutorDoutoranda em Direito Constitucional nas Relações Privadas pela Universidade de Fortaleza K(UNIFOR)
Páginas45-64
A PLENA CAPACIDADE CIVIL DA PESSOA
MAIOR COM DEFICIÊNCIA INTELECTUAL
OU PSÍQUICA E A FUNCIONALIZAÇÃO DO
SISTEMA DE APOIO POR MEIO DA CURATELA
Ana Beatriz Lima Pimentel Lopes
Doutoranda em Direito Constitucional nas Relações Privadas pela Universidade de
Fortaleza K(UNIFOR); Mestre em Direito Público – Ordem Jurídica Constitucional pela
Universidade Federal do Ceará (UFC); Especialista em Direito Privado pela Univer-
sidade de Fortaleza (UNIFOR); Graduada em Direito pela Universidade de Fortaleza
(UNIFOR). Professora de Direito Civil do Curso de Direito da Universidade de Fortaleza
(UNIFOR) e do Centro Universitário Christus (UNICHRISTUS). Membro do Grupo de
pesquisa Direito Constitucional nas Relações Privadas – Direito dos danos e proteção
à pessoa do PPGD/UNIFOR.
Vanessa Correia Mendes
Mestre em Direito Constitucional nas Relações Privadas pela Universidade de Forta-
leza (2015). Graduada em Direito pela Universidade de Fortaleza (2012). Professora
e coordenadora adjunta do curso de graduação do Centro Universitário Farias Brito.
Membro do Grupo de pesquisa Direito Constitucional nas Relações Privadas – Direito
dos danos e proteção à pessoa do PPGD/UNIFOR.
Sumário: 1. Introdução. 2. O inuxo da Convenção da Organização das Nações Unidas sobre
os direitos das pessoas com deciência no ordenamento jurídico brasileiro: a pessoa com de-
ciência e o reconhecimento de igual capacidade perante a lei. 3. Regime das incapacidades no
Código Civil: antes e depois do Estatuto da Pessoa com Deciência. 4. Interdição ou curatela?
A promoção do melhor interesse da pessoa com deciência. 5. Conclusão. 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O estudo da proteção da pessoa com def‌iciência demanda um olhar apurado para
antigos conceitos que devem estar remodelados à uma nova sistemática a f‌im de perma-
necerem no sistema jurídico. Parte-se da percepção que o ordenamento jurídico possui
solução para todos os casos que se apresentem à realidade concreta. Seja uma solução
prevista na generalidade da lei, seja uma solução construída por meio da interpretação
de outras fontes do Direito. O fato é que, seja num ou noutro aspecto, o Direito não é
estanque nem nas soluções nem mesmo na problemática que envolve o cotidiano.
Assim também ocorre com o estudo que envolve a pessoa. Há uma inf‌inidade de
questionamentos e situações aguardando a construção de novas soluções pelo intérprete,
o qual f‌ica vinculado aos postulados constitucionais na realização de sua tarefa.
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ANA BEATRIZ LIMA PIMENTEL LOPES E VANESSA CORREIA MENDES
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A presente provocação partiu de uma dúvida um tanto quanto recorrente nos dias
atuais: a pessoa maior de idade com def‌iciência intelectual ou psíquica pode ser consi-
derada incapaz e, assim, ser submetida ao processo de interdição? Para sistematizar a
análise da discussão e oferecer, ao f‌inal, a solução que se entende possível, parte-se da
verif‌icação do impacto decorrente das mudanças na conservadora plataforma da inca-
pacidade civil feitas pela Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos das Pessoas
com Def‌iciência (CDPD) e complementadas pelo Estatuto da Pessoa com Def‌iciência
(EPD), também denominado Lei Brasileira de Inclusão (LBI).
Segue-se com o exame da mudança de eixo no panorama jurídico por meio da alte-
ração das categorias jurídicas da incapacidade, absoluta e relativa, há muito consolidadas
na civilística tradicional e imbricadas à segurança jurídica demandada nas relações pa-
trimoniais. A par do novo viés de aferição da capacidade restrita, inaugurou-se o sistema
de apoio e salvaguardas previsto no texto do documento internacional.
A CDPD não impôs nenhum modelo pronto para o sistema de apoio. Ao contrário,
deixou os Estados signatários livres para modelarem a proposta de modo mais compatível
com o ordenamento jurídico de cada Nação. No Brasil, o EPD trouxe um novo instru-
mento de apoio (tomada de decisão apoiada) e renovou o antigo instituto da curatela
ao prever diversas alterações na forma de constituição e exercício desse múnus público.
A questão central do presente trabalho está focada justamente na (nova) curatela,
sua confrontação com a interdição e a avaliação se esse mecanismo tão antigo – cura-
tela – tem aptidão para servir como apoio da pessoa maior com limitação psíquica ou
intelectual (denominada pessoa com def‌iciência daqui para frente).
Buscou-se, tanto na sistemática da legalidade constitucional como na revisão de
institutos tradicionais do direito civil nacional, a construção da solução que se entendeu
mais adequada para sanar o questionamento de partida.
2. O INFLUXO DA CONVENÇÃO DA ORGANIZAÇÃO DAS NAÇÕES
UNIDAS SOBRE OS DIREITOS DAS PESSOAS COM DEFICIÊNCIA NO
ORDENAMENTO JURÍDICO BRASILEIRO: A PESSOA COM DEFICIÊNCIA E O
RECONHECIMENTO DE IGUAL CAPACIDADE PERANTE A LEI
A Constituição Federal de 1988 (CF/1988) inaugura um novo Estado jurídico no
Brasil cujo cerne principal é a tutela da pessoa. À vista disso, eleva a dignidade da pessoa
humana a um dos fundamentos da República Federativa do Brasil e anuncia como alguns
de seus objetivos a construção de uma sociedade livre, justa e igualitária; a erradicação
da pobreza e a promoção do bem de todos, sem preconceitos de qualquer natureza.
Além de elencar um extenso rol exemplif‌icativo de direitos fundamentais, a CF/1988
estabelece regra de abertura a novos direitos (art. 5º, § 2º).1 Dessa forma, são direitos
fundamentais todos os apresentados no Título II da Constituição, os decorrentes do
regime e dos princípios por ela adotados, desde que vinculados à dignidade humana e
1. De acordo com Tepedino (2001, p. 48), esses princípios constituem cláusula geral de tutela e promoção da pessoa
humana, tomada como valor máximo do ordenamento jurídico.
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