Policiamento a eventos de protesto no Brasil: repertórios e modelos policiais no ciclo de protestos de Junho de 2013 na cidade de Porto Alegre

AutorEduardo Georjão Fernandes, Gabriel Guerra Câmara
CargoDoutorando e Mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS)/Doutorando e Mestre em Sociologia pela UFRGS
Páginas368-395
DOI: http://dx.doi.org/10.5007/2175-7984.2017v17n39p368/
368368 – 395
Direito autoral e licença de uso: Este artigo está licenciado sob uma Licença Creative
Commons. Com essa licença você pode compartilhar, adaptar, para qualquer fim, desde que
atribua a autoria da obra, forneça um link para a licença, e indicar se foram feitas alterações.
Policiamento a eventos de
protesto no Brasil: repertórios e
modelos policiais no ciclo
de protestos de Junho de 2013
na cidade de Porto Alegre
Eduardo Georjão Fernandes1
Gabriel Guerra Câmara2
Resumo
O trabalho apresenta como tema o policiamento a eventos de protesto no Brasil. Especificamen-
te, questiona: quais os repertórios utilizados pelo aparato policial durante o ciclo de protestos de
2013? Qual(is) o(s) modelo(s) de policiamento colocados em ação? A necessidade do estudo
justifica-se pela ausência de um campo de estudos consolidado no País sobre policiamento a pro-
testos; por outro turno, há diversos estudos de âmbito internacional que tratam dessa temática.
Metodologicamente, analisou o caso do policiamento aos protestos de Porto Alegre no ciclo de
manifestações de 2013. Foram analisadas notícias do jornal Zero Hora e realizadas entrevistas
com agentes policiais. Identificou-se a diversidade de repertórios policiais e a coexistência de dois
modelos principais de policiamento, que se guiam por diferentes critérios de valor a ser protegido
no protesto: um baseado na defesa da integridade física dos manifestantes e um segundo pauta-
do pela defesa do patrimônio.
Palavras-chave: Policiamento. Repertórios. Ciclo de protestos de 2013.
1 Doutorando e Mestre em Sociologia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul (UFRGS). Bacharel em
Ciências Jurídicas e Sociais pela UFRGS. Bacharel em Psicologia pela Pontifícia Universidade Católica do
Rio Grande do Sul (PUCRS). Integrante do Grupo de Pesquisa Associativismo, Contestação e Engajamento
(GPACE), da UFRGS, e do Centre on Social Movement Studies (Cosmos), da Scuola Normale Superiore, Itália.
E-mail: eduardo.g.fernandes@gmail.com.
2 Doutorando e Mestre em Sociologia pela UFRGS. Integrante do Grupo de Pesquisa Magistratura, Sociedade
e Política, da UFRGS, e do Grupo de Pesquisa Social Movements in the Global Age (SMAG), da Universté
Catholique de Louvain, Bélgica. E-mail: gabrielgcamara@gmail.com.
Política & Sociedade - Florianópolis - Vol. 17 - Nº 39 - Mai./Ago. de 2018
369368 – 395
Introdução
O presente trabalho tem como objetivo central produzir uma reexão
acerca da(s) forma(s) como o policiamento, no Brasil, tem atuado diante
de eventos de protesto. No estudo dessa temática é possível identicar duas
lacunas teóricas: uma de caráter teórico e outra de âmbito empírico. Em
termos teóricos, verica-se que, no País, abordar o tema da atuação policial
em protestos pressupõe, nas ciências sociais, a intersecção de duas grandes
áreas de estudo, as quais têm produzido conjuntos distintos de pesquisas:
a sociologia da ação coletiva e os estudos de sociologia da violência e sua
reexão sobre a segurança pública. Em virtude de diferentes contextos de
formação e das delimitações teórico-metodológicas de cada campo, essas
subáreas da sociologia brasileira pouco ou praticamente não dialogaram,
vericando-se, hoje, poucos trabalhos que produzem intersecções entre es-
sas duas áreas e temáticas.
Por um lado, os autores dedicados aos estudos da ação coletiva no
Brasil tendem a adotar os movimentos sociais como objeto a ser analisado,
colocando o foco em questões relacionadas exclusivamente aos atores cole-
tivos e aos agentes sociais, ativistas e militantes, os quais constroem e com-
põem os movimentos. Esse campo de estudos apresenta uma pluralidade
de abordagens teórico-metodológicas que focam, cada uma à sua maneira,
diferentes dimensões constituintes da ação coletiva, cada qual apresentan-
do possibilidades e limites analíticos em suas construções teóricas, as quais
estão em constantes reformulações no sentido de potencializar sua capaci-
dade de análise do mundo social contemporâneo (ALONSO, 2009), com-
plexo em seu conjunto de mudanças sociais, políticas, culturais.
No Brasil, o campo de estudo da ação coletiva constituiu-se, de forma
mais ampla, no período de redemocratização, no curso dos anos 1980 e
início dos anos 1990. À época, a principal referência teórica era a sociolo-
gia de Touraine para explicação do surgimento dos “novos” movimentos
sociais. Essa perspectiva, denida como teoria dos novos movimentos so-
ciais (TNMS), atribui relevância às demandas simbólicas em torno da ação
coletiva, com ênfase em questões de identidade e reconhecimento. Além
de Touraine, destaca-se a apropriação de ideias de autores como Habermas
e Melucci (ALONSO, 2009). Depois de um período de relativa baixa na

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT