Posse sobre imóveis

AutorValdemar P. Da Luz
Ocupação do AutorAdvogado; Doutor em Direito Civil
Páginas19-39
Direito Imobiliário: Fundamentos teóricos e práticos
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1 CONCEITO DE POSSE
Em face da teoria subjetiva de Savigny, a qual destaca o elemento
in tencional como caracterizador da posse, posse é “o poder direto que
a pessoa tem de dispor sicamente de um bem com a intenção de tê-lo
para si e de defendê-lo contra a intervenção de quem quer que seja”.
De tal conceito permite-se destacar, desde logo, dois elementos que,
a nosso ver, encontram-se necessariamente inseridos no conceito de
posse: o corpus e o animus.
Constitui-se o corpus no elemento material, ou seja, no poder físico
que a pessoa exerce sobre a coisa. Já o animus caracteriza a intenção
de exercer o direito de propriedade. Assim, em ocorrendo apenas o
animus, deixa o direito de incidir em face da inexistência da coisa, de
tal sorte que ninguém poderá pleitear qualquer direito sobre algo que
apenas tenciona possuir.
Por outro lado, se determinada pessoa tão-somente conserva a
coisa ou o corpus, sem a intenção de possuí-la como sua, congura-se a
detenção em nome alheio, instituto que ganha guarida no art. 1.198 do
Art. 1.198 Considera-se detentor aquele que, achando-se em relação de
dependência para com outro, conserva a posse em nome deste e em
cumprimento de ordens ou instruções suas.
A detenção, considerada “uma relação de fato entre pessoa e
coisa que não gera efeitos jurídicos”, constitui-se caso típico em que
apenas se verica a existência do corpus sem que ocorra, por parte do
detentor, o animus de possuidor.
Como judiciosamente sustenta o Tribunal de Justiça de Santa
Catarina, há substancial diferença entre o simples detentor e o possuidor
dire to:
Todo possuidor direto é detentor, mas nem sempre o detentor é também
possuidor direto. Serão possuidores diretos, por exemplo, o usufrutuário,
o comodatário, o locatário, o arrendatário, o inventariante, o credor
pignoratício, o depositário e todos os demais que exerçam um po der de
guarda ou detenção fundado em título jurídico. Por sua vez, não serão
possuidores diretos, mas simples detentores, aqueles que conservai! a coisa
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Valdemar P. da Luz
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em nome de outrem, a título precário, em cumprimento de ordem ou
instruções dele recebidas, como é o caso do mandatário. Em decorrên cia da
distinção jurídica entre as duas situações criadas, a lei indica os que podem
se valer das ações possessórias, dispondo, no art. 1.210 do Cód. Civil, que
o possuidor tem direito de ser mantido na posse, em caso de turbação, e
restituído no de esbulho, e segurado de violência iminente, se tiver justo
receio de ser molestado. Logo, somente podem se valer dos interditos
possessórios, para se manterem na posse ou neles serem restituídos, os
legítimos possuidores. Os simples detentores não podem se va ler dessas
ações, porque juridicamente não são possuidores, isto é, não tem posse.
Assim, na posse direta, o possuidor exerce um poder próprio, fundado em
título jurídico, ao passo que ao detentor de coisa alheia ne nhum poder próprio
assiste, pois o fâmulo da posse é aquele que, em razão de sua situação de
dependência em relação a uma outra pessoa - ao dono -, exerce sobre a
coisa não um poder próprio, mas dependente. Está a serviço da posse de
outro, é instrumento mecânico de posse, mas não possuidor”.1
Como exemplos de detenção, podemos citar as re lações jurídicas
das quais fazem parte a gura do capataz, que administra imóvel rural
alheio, e a do caseiro, que cuida de sítio de recreio, ambos em nome e
por ordem dos proprietários que, em regra, residem na cidade.
Na teoria objetiva de lhering, ao revés, é suciente a existência do
corpus para se ter como constituída a posse, uma vez que se subenten-
de que o animus encontra-se ínsito no poder exercido sobre a coisa.
Nessa linha de pensamento, ao passo que o corpus é entendido como
a manifestação externa da posse, o animus é tido apenas como sua
manifestação interna.
Como elemento histórico, vale lembrar que a posse foi a primeira
forma de apropriação das coisas. Primeiro o homem se apossou dos
bens para depois passar a adonar-se dos mesmos. A própria história do
Brasil registra a fase da posse de terras, período transcorrido do ano
de 1822 a 1850 e no qual não se tinha mais acesso à propriedade de
direito, passan do a posse a constituir-se na única forma de aquisição da
propriedade por pessoas humildes e pequenos agricultores. Essa fase,
diz-se, consagrou a posse como pressuposto da propriedade privada.
1 TJ-SC - Ac. unân. da 3- Câm. Cív. publ. no DJ de 29.03.89 -Agr. 4.391 - Rel. Des. Wilson
Guarany.
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