Possibilidade de aplicação da mediação ou arbitragem como meios consensuais extrajudiciais de resolução de conflitos no direito do consumidor

AutorJean Carlos Lima
CargoPh.D. em Direito Internacional. Doutor em Ciências Jurídicas, pós-doutor em Direito com ênfase em negociação e mediação de conflitos
Páginas259-284

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1. Introdução

O mundo atual está buscando freneticamente meios alternativos adequados de resolução de conflitos extrajudiciais. Essa busca ocorre porque com o aumento populacional e a facilidade em obter informações tornou-se mais fácil lutar pelos direitos de cada um. Evidentemente, por muitas vezes há exagero nessa luta pelo direito. Por certo, todo cidadão que tiver o seu direito violado ou vilipendiado deve procurar pela sua reparação - desde que não exceda o direito plausível. Contudo, não é isso que se tem visto na sociedade moderna. Tem-se experimentado uma avalancha de processos na esfera judicial por causa da "síndrome do mero aborrecimento".

Nessa esteira, vê-se claramente uma banalização do direito de agir em juízo, causando uma superlotação nos tribunais de justiça com processos judiciais desnecessários. Claro que aquele que se sentir lesado em seu direito deve incessantemente rogar por justiça. Segundo preleciona ihering, todo aquele que ao ver seu direito torpemente desprezado e pisoteado, não sente em jogo apenas o objeto desse direito, mas também sua própria pessoa, aquele que numa situação dessas não se sente impelido a afirmar a si mesmo e ao seu bom direito, será um caso perdido, e não tenho o menor interesse em convencer um indivíduo desse tipo.

Com fulcro no tema em comento, em especial pela busca da restauração de um direito, há um ator no mundo jurídico chamado "consumidor", que visto como hipossuficiente à luz do direito do consumidor, revela-se peça principal para criação de meios alternativos que auxiliem a justiça comum e ao mesmo tempo que sejam céleres, eficientes e eficazes para atender às necessidades daquele que compra bens ou utiliza da prestação de serviços: o consumidor.

Pelas razões enunciadas, a sociedade organizada criou mecanismos para resolução de conflitos que fossem adequados para cada disputa existente entre consumidor e fornecedor de serviço ou produto. Entre esses meios, os que se apresentaram mais usados foram: conciliação, mediação e arbitragem, muito embora existam outros instrumentos de pacificação de conflitos sociais.

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2. O que é ADR?

É uma sigla da língua inglesa usada para designar Alternative Dispute Resolution, que em português que dizer "resolução alternativa de Disputa" RAD, também conhecida como Meios alternativos de resolução de Conflitos, representada pela sigla MASC.

No começo dos anos 1980, um advogado muito renomado nos estados unidos da américa, chamado James Henry, desenvolveu o dispositivo do sistema Alternative Dispute Resolution - ADR, iniciando em 1979 com a sua empresa a Center Public Ressources, uma associação sem fins lucrativos formada por quatrocentos juristas das mais variadas áreas do saber e das ciências jurídicas.

O Alternative Dispute Resolution nasceu da necessidade de acelerar as formas de resolução de disputas extrajudiciais, bem como para diminuir o número de demandas que iam, e ainda vão, para o poder Judiciário. Porém, tendo como objetivo principal promover a paz social e o bem-estar entre os indivíduos de uma sociedade e a restituição dos laços afetivos.

Ainda pode-se dizer que uma das razões para o desenvolvimento dos ADRS é de ordem prática e conjuntural: os ADRS dão uma resposta às dificuldades de acesso à justiça com que se depara um número elevado de países. Essas dificuldades explicam-se pelo aumento dos litígios apresentados aos tribunais e pela crescente morosidade e o aumento dos custos dos processos. A quantidade, a complexidade e a tecnicidade dos textos legislativos contribuem, além disso, para tornar mais difícil o acesso à justiça.

Enquanto existe o aumento das custas judiciais e o acúmulo de serviço nos tribunais e nas cortes, os indivíduos e as empresas buscam uma resolução alternativa de disputa para resolver suas controvérsias e seus conflitos.

Os meios alternativos de resolução de disputas apresentam uma enorme variedade de técnicas, métodos e processos para solução de disputas, sobretudo, na esfera extrajudicial.

Para Helen Bendix, editor chefe da American Bar Association da cidade de los angeles, eua, todos os procedimentos usados pelo ADR têm suas próprias características e geralmente permitem às pessoas envolvidas resolverem suas disputas de forma confidencial,

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estabelecerem prazos e regras de procedimentos para regerem o processo, elegerem quem vai orientar e dirigir os trabalhos de forma neutra e minimizarem os ânimos da contenda, os custos e a possibilidade de manterem uma relação amigável após a resolução do conflito.

O crescente uso dessas técnicas, a economia de tempo e dinheiro, a ciência do tratamento e a obtenção de resultados satisfatórios têm consagrado os ADRS. No mundo inteiro este processo está ganhando força com aplicação de novas formas, fazendo mudar os paradigmas sociais de uma "cultura de confrontação" para uma "cultura de cooperação".

Importa lembrar que os meios alternativos de resolução de disputas têm suas restrições quando da sua efetiva aplicação. Há situações em que não é possível fazer a autocomposição, tendo em vista alguns impedimentos de ordem psicológica e de autonomia da vontade. Vejamos abaixo algumas situações em que não é aplicável, digo, não é recomendável o uso dos meios alternativos de resolução de disputas:

- quando as pessoas envolvidas exigem de forma imperiosa o meio judicial;

- se as pessoas em contenda não acreditam nos meios alternativos de resolução de disputas;

- no caso de um dos envolvidos querer manter todos os direitos da disputa, ou seja, quando um não quer permitir o ganha-ganha na resolução do conflito;

- em face da existência da necessidade de uma resolução pública, para servir de exemplo para que não haja outras contendas do gênero.

3. Historiografia da mediação

Muitas pessoas acreditam que a mediação é um método de resolução de conflitos da modernidade, porém esta vem de muito tempo.

Os fenícios e os gregos que reconheciam o mediador como "proxanetas" faziam uso da mediação no comércio, e os romanos reconheceram a sua aplicação por lei. A civilização romana já admitia o uso da mediação. Chamavam os mediadores por uma variedade de nomes, a saber, internuncius, médium, intercessor, philantropus, interpolator,

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conciliador, interlocutor, interpres e mediador. Frequentemente os romanos usavam a mediação para solucionar os seus conflitos e introduziram-na em sua lei que iniciou com o Digesto de Justiniano de 530-533.

O mestre Confúcio já ensinava que a melhor forma de resolver um conflito era por meio do acordo em vez da coação. Nas comunidades do Japão e da áfrica os membros mais respeitados ajudavam as pessoas a resolverem os seus conflitos.

O processo de mediação, também, foi largamente empregado em diversos seguimentos religiosos. No Judaísmo foi de grande importância. A cultura islâmica tem uma longa tradição no uso da mediação e da conciliação como forma preferencial de resolução de disputa. Durante a idade média, o clero cristão costumeiramente mediava os conflitos.

A palavra mediação é de origem da língua latina - vem do verbo "mediare" que significa etimologicamente "dividir em partes iguais".

Mediação é um meio alternativo de resolução de disputa

Os estudiosos da mediação ao redor do mundo veem este meio alternativo de resolução de disputas, geralmente, segundo a sua ótica, baseados em suas experiências pessoais ou alicerçados pelos resultados obtidos por intermédio de pesquisas de campo e experimentos.

Mediação é um meio alternativo de resolução de disputa, preferencialmente privado, em que duas ou mais pessoas que estão vivendo um conflito buscam uma pessoa neutra e imparcial, de sua confiança, capaz perante a legislação de seu país, e que, sobretudo, seja qualificada profissionalmente para facilitar a comunicação entre elas.

Para Worchel e lundgren: "La mediación implica con frecuencia la actuación de una tercera parte como simplificador en el proceso de negociación."1 nas palavras de Duffy: "Es la intervención en un conflicto de una tercera parte neutral que ayuda a las partes opuestas a manejar o resolver su disputas."2 ainda sobre mediação, assevera Malhadas:

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Em síntese, a mediação surge como método mais adequado para a abordagem de conflitos, em que os elementos de natureza emocional envolvidos podem e devem ser considerados na busca das melhores alternativas pelas partes, que assumem a responsabilidade pelo acordo.

Segundo o professor de mediação irlandês Frank Hanna:

A mediação é um processo conduzido por uma pessoa neutra e inteiramente independente cujo trabalho consiste em assistir as pessoas envolvidas a encontrarem um denominador comum para suas desavenças e ajudar a estas pessoas a entenderem os seus reais interesses, e para dirimir opiniões desnecessárias e difíceis assumidas por elas.

Em tempo, é importante trazer à baila que há um consenso entre os doutrinadores de que a mediação é um ato voluntário, no qual as pessoas que a buscam têm total liberdade e controle sobre o processo.

4. Mediação versus conciliação

São inúmeros os debates concernentes à diferença entre mediação e conciliação. Até hoje há muita divergência e ainda não se chegou a um consenso.

Os dois processos guardam entre si similaridades. Tanto na conciliação como na mediação existe a presença de um terceiro imparcial que não tem poderes para decidir a solução do conflito.

A principal diferença entre a mediação e a conciliação é o fato de os conciliadores possuírem conhecimento jurídico. O conciliador...

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