Precedentes e Separação dos Poderes

AutorArthur José Jacon Matias
Ocupação do AutorMestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público
Páginas115-143
Precedentes: Fundamentos, Elementos e Aplicação 115
Capítulo IV
Precedentes e Separação dos Poderes
1 Considerações preliminares
Nos termos do art. 16 da Declaração de Direitos do Homem
e do Cidadão, “ A sociedade em que não esteja assegurada a
garantia dos direitos nem estabelecida a separação dos poderes
não tem Constituição”. A positivação do princípio da separação
dos poderes na Carta de Direitos mais in uente de todas revela
o status por ele alcançado enquanto garantia fundamental da
liberdade: trata-se de valor universal dos Estados Democráticos
e instrumento essencial de restrição do poder do Estado sobre
direitos e garantias do indivíduo. Sem ele, não se pode conceber
uma Constituição democrática, que assegure o pluralismo e a
diversidade de orientações cientí cas, religiosas e políticas. É ele
refúgio, fortaleza, baluarte, fundamento e instrumento da insti-
tuição, da instrumentação e da preservação das mais elementares
liberdades públicas.
Pela separação dos poderes concebem-se três funções
estatais típicas: a legislativa, a administrativa e a jurisdicional. Por
ela não se concebe que essas funções sejam monopolizadas ou
concentradas em um órgão ou em uma pessoa. Por ela, as funções
estatais devem ser cuidadosamente, rigorosamente distribuídas.
Por ela, órgãos estatais diversos se controlam e contêm-se, mutua-
mente. Por ela, cada um dos Poderes deve preservar a essência
de suas funções típicas. Por ela, o Poder Executivo só julga e
legisla em caráter excepcional; o Poder Legislativo só administra
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Arthur José Jacon Matias
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e dirime conitos extraordinariamente; e o Poder Judiciário não
pode interferir nas opções políticas e administrativas eleitas pelos
Poderes Legislativo e Executivo, respectivamente. Quid juris um
direito criado pelos juízes? A separação dos poderes é um bloqueio
à atividade normativa do Poder Judiciário?
O estudo da separação dos poderes é útil para vericar se
a distribuição da capacidade de produção normativa, aquinhoada
por órgãos e poderes distintos do Poder Legislativo, é legítima;
se essa distribuição é um dos instrumentos de que se vale a técnica
da separação dos Poderes para refrear hipertroas e conferir
segurança aos agentes públicos e particulares; se, preservando-se
o núcleo essencial de cada Poder, pelo qual ao Poder Executivo
compete dar consecução à Administração Pública, ao Poder
Legislativo a criação de normas de caráter geral providas de
coerção, e ao Poder Judiciário a aplicação dessas normas na solu-
ção de conitos intersubjetivos, é lícito prever exceções norma-
tivas que se voltem ao objetivo de impedir o surgimento de um
“superpoder”, inspiradas no lema le pouvoir arrêt le pouvoir, são
formal e materialmente válidas. Enm, se o direito criado por
precedentes realmente se conforma à separação dos poderes.
É este o objetivo do presente tópico.
2 Fundamentos teóricos da separação dos poderes
2.1 A separação dos poderes em John Locke
Não é possível tecer comentários acerca das proposições
teóricas a respeito da distribuição de funções estatais sem sumariar
– se é que isso é possível – o tema de acordo com os pensadores
que elaboraram as correspondentes teorias essenciais, cuja inu-
ência até hoje se faz sentir fortemente. Tal esforço é necessário
para que o presente trabalho contenha mínimo sentido lógico.
John Locke é considerado o precursor e indutor do próprio
Estado liberal, propiciando subsídios para a teoria formulada por
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