Precedentes vs. ponderação: contradição interna do código de processo civil vigente

AutorManoel Pedro Ribas de Lima
CargoAdvogado. Mestre em Direito Constitucional pela UniBrasil. Ponta Grossa/RS
Páginas393-436
Revista Eletrônica de Direito Processual REDP.
Rio de Janeiro. Ano 11. Volume 18. Número 2. Maio a Agosto de 2017
Periódico Quadrimestral da Pós-Graduação Stricto Sensu em Direito Processual da UERJ
Patrono: José Carlos Barbosa Moreira. ISSN 1982-7636. pp. 393-436
www.redp.uerj.br
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PRECEDENTES VS. PONDERAÇÃO: CONTRADIÇÃO INTERNA DO CÓDIGO
DE PROCESSO CIVIL VIGENTE
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PRECEDENTS VS. BALANCING: INNER CONTRADICTION OF CURRENT
PROCESS CIVIL BRAZILIAN STATUTE
Manoel Pedro Ribas de Lima
Advogado. Mestre em Direito Constitucional pela UniBrasil.
Ponta Grossa/RS. manoel@ribasdelima.com.br
RESUMO: Investiga-se a contradição entre paradigmas do vigente Código de Processo
Civil. De um lado está o efeito de vertical dos precedentes, cujo pressuposto é a identidade
entre caso para a replicação da decisão e objetivo é a segurança jurídica. De outro lado está
a ponderação, cujo pressuposto é a singularidade da decisão para o caso concreto e assume
a contingência como ônus inesgotável. Para tanto, partiu-se da análise da norma jurídico-
positiva e da história institucional de procedimentos anteriores que se assemelham aos
postulados investigados para, então, adentrar na recente doutrina sobre os temas. Identificou-
se a contradição mencionada, seus efeitos próximos e as possibilidades iniciais de soluções.
Além do exame bibliográfico e de leading cases, valeu-se do método crítico. Constatou-se
o divórcio entre do discurso normativo, do qual os precedentes estão contidos, e o ato de
decisão jurisdicional do litígio atual.
PALAVRAS-CHAVE: Processo civil, precedentes, efeito vertical, ponderação, norma e
decisão.
ABSTRACT: It investigates the contradiction between paradigms of the current Process
Civil Statute. On the one hand is the vertical effect of precedents, whose assumption is the
identity between case for the replication of the decision and objective is legal certainty. On
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Artigo recebido em 05/05/2017 e aprovado em 28/06/2018.
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Rio de Janeiro. Ano 11. Volume 18. Número 2. Maio a Agosto de 2017
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the other hand is the balancing, whose assumption is the uniqueness of the decision for the
case and takes the contingency as an endless burden. To do so, it was based on the analysis
of the legal-positive norm and the institutional history of previous procedures that resemble
the investigated postulates to then enter into the recent doctrine on the themes. The
mentioned contradiction was identified, as well as its near effects and close the initial
possibilities of solutions. In addition to the literature review and leading cases, the critical
method was used. It was found the divorce between the normative discourse, of which the
foregoing are contained, and the act of judicial decision of the current dispute.
KEYWORDS: Process, precedents, vertical effect, balancing, norm e decision.
SUMÁRIO: Definição do debate: a duplicidade paradigmática do novo CPC; 2. Concepção
jurídico-positiva dos precedentes e enquadramentos típicos; 3. Ponderação e o caso concreto
como fator efetivo da decisão; 4. O resultado da convivência entre os efeitos dos precedentes
e a ponderação; 5. Conclusão; Referências Bibliográficas.
1. DEFINIÇÃO DO DEBATE: A DUPLICIDADE PARADIGMÁTICA DO NOVO CPC
Como produto da assimilação das diretrizes da Constituição da República de 1988,
sem dúvidas sob a matiz neoconstitucionalista, o novo Código de Processo Civil (Lei 13.105
de 16 de março de 2015) positiva como basilares dois postulados: os efeitos verticais dos
precedentes (CPC, art. 927) e a exigência de ponderação das decisões (CPC, art. 8º).
Os efeitos verticais dos precedentes possuem um papel de aperfeiçoamento. Os
precedentes suprimiriam lacunas legais e zonas cinzentas, dirigindo hermeneuticamente a
construção da norma. Além disto, os precedentes forneceriam uma previsibilidade à
resolução de casos particulares, o que as normas legais, marcadas por sua abstração, não
poderiam proporcionar. Haveria, então, tanto uma possibilidade concreta de uma totalidade
ao ordenamento quanto segurança aos negócios e atos jurídicos.
O exame de ponderação (Abwägung ou Balancing), também chamado de princípio
de proporcionalidade (Verhältnismäßigkeitsprinzip), circunscreve o discurso normativo. Por
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mais específicas em seu conteúdo, as normas não são capazes de atender o ineditismo e a
singularidade de cada caso concreto. As normas sempre existem logicamente a priori ao
litígio, precárias em seu âmbito de incidência. As particularidades do litígio concreto são
elevadas à condição sine qua non da decisão, reclamando a justiça nos horizontes de cada
caso (CPC, art. 6º). O julgamento do caso concreto não se trata de mera aplicação da norma,
senão o produto da ponderação das normas vigentes no ordenamento jurídico ao caso
concreto.
Embora se possa dizer que ambas as exigências sejam inspiradas em tradições
jurídicas distintas, efeitos verticais dos precedentes e o exame de ponderação estão calcados
na ideia da atuação integralizadora do julgador. Integração é a pretensão de compreensão,
material e espiritual, necessária diante da incompletude do fenômeno normativo e/ou da
finitude do observador. A norma jurídico-positiva, enunciada na lei, seria sempre
insuficiente. Inevitavelmente, critérios transcenderão às colocações legais
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. Haveria um fit
interpretativo
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construído pelo intérprete que, apesar do bem da vida pressuposto na vigência
da norma já positivada, exige uma conformação, contando com a atuação positiva do
julgador. O papel esperado para ele é o encontro do todo, tomando cada evento como parte
daquele, ou, em outras palavras, a construção de uma racionalidade própria para o Direito.
Estando corretas as concepções de efeitos verticais dos precedentes e de
ponderação, tal qual se aprofundará neste trabalho, percebe-se uma contradição. Há duas
linhas paralelas de forças de motivação para a decisão. Cada uma delas busca apresentar
respostas através de fontes distintas. Os efeitos verticais dirigem-se ao encerramento do
ordenamento; o exame de ponderação está condicionado à abertura da normatividade.
Ordenamento vs. caso concreto. Não se resume a colocar de um lado a causa de pedir e de
outro o stare decisis.
Metodologicamente, a integralização dos precedentes atua subsidiariamente aos
enunciados legais, integrando, perante o julgamento do caso concreto, o discurso normativo.
A partir disto pode-se falar de um arcabouço positivo de respostas. De outro lado, a
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FERRAZ JUNIOR, Tércio Sampaio. A ciência do direito. 2. ed. São Paulo: Atlas, 1986, p. 85.
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Um fazer, um ato positivo, pois in claris non fit interpretatio.

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