Prefácio à 2ª edição

AutorMaria Cecília Máximo Teodoro
Ocupação do AutorPós-Doutora em Direito do Trabalho pela Universidade de Castilla-La Mancha com bolsa de pesquisa da CAPES
Páginas9-12

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Durante muitos anos, toda semana, nas páginas da Revista “O Cruzeiro”, um chargista famoso – Carlos Estêvão – trazia duas tirinhas com o título: “As aparências enganam”.

Numa delas, em meio às sombras, o leitor via uma cena banal – como, por exemplo, pessoas à mesa, comendo. Na outra, mais clara, a mesma cena era vista de outro modo – a mesa comendo as pessoas, ou algo assim.

Naquele tempo, eu ainda era menino, e, como todos os meninos, queria me divertir. E aquelas tirinhas – tão inocentes – me faziam sempre folhear a revista, curioso, toda vez que meus pais a compravam.

Hoje, tantos anos depois, tanto a revista como o chargista se foram. Mas as aparências nos enganam ainda, inclusive na imprensa. E muitas vezes de forma nada inocente.

De fato, boa parte do que lemos, ouvimos e falamos tem um traço de verdade, ou uma verdade possível; mas esconde, às vezes, o seu contrário. E a ênfase em apenas um dos lados confunde ou destorce a percepção do conjunto.

Tome-se como exemplo uma greve de professores. É possível descrevê-la como um ato de rebeldia face aos salários baixos ou contra os baixos níveis do ensino. O mais provável, porém, é que a mídia nos faça pensar apenas nos alunos sem aula.

Assim, no telejornal, os professores passam de vítimas a algozes. É quase como se negassem o pão a um faminto. Afinal, no outro ponto da linha estão crianças ou adolescentes, vistos não apenas como pessoas frágeis, mas como “o futuro do Brasil”.

Outro exemplo – também frequente na mídia – são as reiteradas denúncias de trabalho escravo ou de prostituição infantil, convivendo com o apoio disfarçado a governos conservadores e às grandes corporações, como se as coisas não se relacionassem entre si.

Por fim, uma variante deste último exemplo são as campanhas publicitárias que jogam com o “politicamente correto” para nos cativar, quando o que se quer,

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basicamente, é apenas vender produtos. São comuns, nesse caso, mensagens contra discriminações1 ou referências à pobreza extrema2

Naturalmente, não são apenas a mídia e o marketing que nos armam essas ciladas. Ou talvez se deva dizer que ambos são apenas veículos que transportam algo maior.

Este algo maior é a ideologia. Como Marx já ensinava, mesmo o mais forte dos tiranos não se sustenta só com fuzis; mais cedo ou mais tarde, terá de convencer os oprimidos que a opressão é boa, ou até mesmo que eles não são oprimidos.

Hoje, mais do que antes, essa estratégia passa pelo coração. É bom que as...

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