A prescrição intercorrente na execução trabalhista depois da reforma trabalhista introduzida pela Lei n. 13.467/2017

AutorBen-Hur Silveira Claus
Páginas411-429

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“[...] nenhum outro crédito deve ter, em sua execução judicial, preferência, garantia ou rito processual que supere os do crédito público, à exceção de alguns créditos trabalhistas.” (item 4 da Exposição de Motivos n. 223 da Lei n. 6.830/80)

Introdução

O presente artigo tem por objetivo estudar a prescrição intercorrente prevista no art. 11-A da CLT e sua aplicação à execução trabalhista. O preceito foi introduzido na Consolidação das Leis do Trabalho pela Lei n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) e apresenta a seguinte redação:

Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do trabalho no prazo de dois anos.

§ 1º A fluência do prazo prescricional intercorrente inicia-se quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial no curso da execução.

§ 2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser requerida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.

Parece adequado iniciar o presente estudo pelo exame da atual jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema da prescrição intercorrente e sobre as perspectivas da jurisprudência diante da introdução da prescrição intercorrente na execução trabalhista no direito positivo do trabalho.

1. A atual jurisprudência do tst sobre a prescrição intercorrente na execução

No período anterior à denominada Reforma Trabalhista, o Tribunal Superior do Trabalho pacificou sua jurisprudência no sentido de que a prescrição intercorrente é inaplicável à execução trabalhista. A Súmula n. 114 do TST sintetiza esse posicionamento. Aprovada no ano de 1980, a Súmula n. 114 do TST tem a seguinte redação:

“PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. É inaplicável na Justiça do Trabalho a prescrição intercorrente”.

Em que pese a possibilidade de arguição de prescrição intercorrente estivesse prevista no art. 884, § 1º, da CLT1, o Tribunal Superior do Trabalho construiu sua jurisprudência na perspectiva de afirmar a inaplicabili-dade da prescrição intercorrente à execução trabalhista. Mesmo quando a paralisação da execução decorre da inércia do exequente, ainda assim a jurisprudência do TST acabou por afirmar, mais recentemente, ser inaplicável a prescrição intercorrente ao processo do trabalho na fase de execução (TST-RR-20400-07.1995.5.02.0074, Relator Ministro João Oreste Dalazen, DEJT 27.02.2015).

De outra parte, a atual jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho reputa insubsistente a distinção algumas vezes estabelecida entre prescrição intercorrente e prescrição da ação executiva, sob o fundamento de que essa distinção “... traz subjacente a superada ideia de bipartição entre ação de conhecimento e ação de execução, que já não existia no Processo do Trabalho, caracterizado por uma relação processual única, mesmo antes das reformas do CPC, que implicaram a consolidação do chamado processo sincrético, identificado pela união de tutelas cognitivas e executivas” (TST-RR-72600-08.1989.5.02.0007, 2ª Turma, Rel. Min. José Roberto Freire Pimenta, DEJT 13/03/2015).

Fundada na possibilidade de o juiz promover a execução de ofício por força da previsão do art. 878, caput, da CLT, a jurisprudência do TST foi estruturada axiologicamente sobre uma concepção substancialista do Direito do Trabalho, com o evidente propósito de consagrar ao crédito trabalhista a hierarquia própria a sua

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condição de crédito representativo de direito fundamental previsto no art. 7º da Constituição Federal, dotado do superprivilégio legal previsto no art. 186 do Código Tributário Nacional. Para André Araújo Molina, o TST realizou uma metainterpretação da jurisprudência para os casos em que a execução ficava parada em razão de omissão de ato do juízo ou da prática de ato da defesa.
Essa interpretação conduzia ao afastamento da prescrição intercorrente, já que a paralisação do processo não era causada pela omissão do exequente.2

A concepção substancialista que conforma a jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho sobre o tema revela-se evidente quando se observa que o TST admite Recurso de Revista contra a decisão regional que acolhe a arguição de prescrição intercorrente. Essa concepção substancialista torna-se ainda mais evidente quando o estudo da jurisprudência do TST revela que o tribunal admite o Recurso de Revista sob fundamento de violação a três distintos dispositivos da Constituição Federal.
Em outras palavras, o TST reputa caracterizada ofensa direta e literal a três dispositivos da Constituição Federal quando o Tribunal Regional do Trabalho declara prescrição intercorrente na execução.

Como é sabido, o cabimento de Recurso de Revista na fase de execução está restrito à hipótese de violação literal e direta de norma da Constituição Federal. Com efeito, a teor do art. 896, § 2º, da CLT, não cabe Recurso de Revista das decisões proferidas em execução de sentença, “... salvo na hipótese de ofensa direta e literal de norma da Constituição Federal.”3

A pesquisa realizada na jurisprudência revela que o Tribunal Superior do Trabalho admite Recurso de Revista nessa hipótese tanto sob fundamento de violação ao art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (coisa julgada) quanto sob fundamento de violação ao art. 5º, XXXV, da Constituição Federal (cláusula da inafastabilidade da jurisdição); bem como sob fundamento de violação ao art. 7º, XXIX, da Constituição Federal (prescrição bienal e quinquenal).

As ementas a seguir sintetizam a concepção substancialista da jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho acerca da matéria, na medida em que revelam que o TST admite o Recurso de Revista por:

  1. ofensa ao inciso XXXVI do art. 5º da Constituição Federal (coisa julgada):

    RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA LEI N. 11.496/2007. EXECUÇÃO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À COISA JULGADA.
    Afronta o art. 5º, XXXVI, da Constituição da República decisão por meio da qual se extingue a execução com resolução do mérito, em virtude da incidência da prescrição intercorrente, uma vez que tal conduta impede indevidamente a produção dos efeitos materiais da coisa julgada, tornando sem efeitos concretos o título judicial transitado em julgado. Recurso de embargos conhecido e provido. (E-RR - 4900-08.1989.5.10.0002, Relator Ministro Lelio Bentes Corrêa, SBDI - 1, DEJT 29.06.2012);

  2. ofensa ao inciso XXXV do art. 5º da Constituição Federal (cláusula da inafastabilidade da jurisdição):

    RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA LEI N. 13.015/2014. FASE DE EXECUÇÃO. INÉRCIA DO EXEQUENTE. JUSTIÇA DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INAPLICABILIDADE. ART. 5º, XXXV, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho consolidou o entendimento de que não se aplica a prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho, sob pena de ineficácia da coisa julgada material. Precedentes. 2. A diretriz perfilhada na Súmula n. 114 do TST também incide no caso de paralisação do processo decorrente de inércia do exequente. Ressalva de entendimento pessoal do Relator. 3. Viola o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal acórdão regional que mantém a declaração de prescrição intercorrente, ante a inércia do Exequente. 4. Recurso de revista do Exequente de que se conhece a que se dá provimento para afastar a prescrição intercorrente e determinar a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem, para que prossiga na execução. (RR-162700-04.1997.5.03.0103, Relator Ministro João Oreste Dalazen, 4ª Turma, DEJT 17/06/2016);

  3. ofensa ao inciso XXIX do art. 7º da Constituição Federal (prescrição bienal e quinquenal):

    RECURSO DE REVISTA. FASE DE EXECUÇÃO. INÉRCIA DO EXEQUENTE. JUSTIÇA DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INAPLICABILIDADE SÚMULA N. 114 DO TRIBUNAL SUPERIOR DO TRABALHO. 1. A jurisprudência do Tribunal Superior do Trabalho consolidou o entendimento de que não se aplica a prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho. 2. A diretriz perfilhada na Súmula n. 114 do TST também incide no caso de paralisação do processo decorrente de inércia do exequente. Ressalva de entendimento pessoal do Relator. 3. O art. 7º, XXIX, da Constituição Federal prevê a contagem da prescrição bienal e quinquenal na Justiça do Trabalho em relação à data de extinção da relação de trabalho e do ajuizamento da ação, não durante seu trâmite. 4. Viola o art. 7º, XXIX, da Constituição Federal acórdão regional que mantém a declaração de prescrição intercorrente, ante a inércia do Exequente. 5. Recurso de revista de que se conhece e a que se dá provimento para afastar a prescrição intercorrente e determinar a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem, para que prossiga na execução (RR-20400-07.1995.5.02.0074, Relator Ministro João Oreste Dalazen, DEJT 27.02.2015).

    No primeiro julgado, o TST reputou violado o art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal por entender que a declaração de prescrição intercorrente pelo Tribunal Regional esvazia a coisa julgada material estabelecida no título executivo judicial em execução; para reproduzir os termos da ementa, porque a pronúncia da prescrição

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    intercorrente pelo Tribunal Regional “... impede indevidamente a produção dos efeitos materiais da coisa julgada, tornando sem efeitos concretos o título judicial transitado em julgado.”

    No segundo julgado, o...

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