A prescrição intercorrente na execução trabalhista depois da reforma trabalhista introduzida pela Lei n. 13.467/2017

AutorBen-Hur Silveira Claus
Páginas472-492
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BEN-HUR SILVEIRA CLAUS
A PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NA EXECUÇÃO TRABALHISTA DEPOIS DA
REFORMA TRABALHISTA INTRODUZIDA PELA LEIN. 13.467/2017
Ben-Hur Silveira Claus(*)
“[...] nenhum outro crédito deve ter, em sua execução judicial, preferência,
garantia ou rito processual que supere os do crédito público, à exceção de alguns
créditos trabalhistas.” (item 4 da Exposição de Motivos n. 223 da Lei n. 6.830/80)
(*) Juiz do Trabalho do Tribunal Regional do Trabalho da 4ª Região (RS). Mestre em Direito.
(1) “Art. 884. Garantida a execução ou penhorados os bens, terá o executado cinco dias para apresentar embargos, cabendo igual prazo ao exequente
para impugnação.
§ 1º. A matéria de defesa será restrita às alegações de cumprimento da decisão ou do acordo, quitação ou prescrição da dívida.”
INTRODUÇÃO
O presente artigo tem por objetivo estudar a pres-
crição intercorrente prevista no art. 11-A da CLT e sua
aplicação à execução trabalhista. O preceito foi intro-
n. 13.467/2017 (Reforma Trabalhista) e apresenta a se-
guinte redação:
Art. 11-A. Ocorre a prescrição intercorrente no processo do
trabalho no prazo de dois anos.
§ 1º A f‌l uência do prazo prescricional intercorrente inicia-se
quando o exequente deixa de cumprir determinação judicial
no curso da execução.
§ 2º A declaração da prescrição intercorrente pode ser reque-
rida ou declarada de ofício em qualquer grau de jurisdição.
Parece adequado iniciar o presente estudo pelo exa-
me da atual jurisprudência do Tribunal Superior do Tra-
balho sobre o tema da prescrição intercorrente e sobre
as perspectivas da jurisprudência diante da introdução
da prescrição intercorrente na execução trabalhista no
direito positivo do trabalho.
1. A ATUAL JURISPRUDÊNCIA DO TST SOBRE A PRESCRIÇÃO
INTERCORRENTE NA EXECUÇÃO
No período anterior à denominada Reforma Traba-
lhista, o Tribunal Superior do Trabalho uniformizou sua
jurisprudência no sentido de que a prescrição intercor-
rente é inaplicável à execução trabalhista. A antiga redação
da Súmula n. 114 do TST sintetizava o posicionamento.
Aprovada no ano de 1980, a Súmula n. 114 do TST tem
a seguinte redação:
PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. É inaplicável na Justiça do
Trabalho a prescrição intercorrente.
Em que pese a possibilidade de a arguição de prescri-
ção intercorrente estivesse prevista no art. 884, § 1º, da
CLT(1), o Tribunal Superior do Trabalho construiu sua
jurisprudência na perspectiva de af‌i rmar a inaplicabili-
dade da prescrição intercorrente à execução trabalhista.
Mesmo quando a paralisação da execução decorria da
inércia do exequente, ainda assim a jurisprudência do
TST af‌i rmava, ser inaplicável a prescrição intercorren-
te ao processo do trabalho na fase de execução (TST-
-RR-20400-07.1995.5.02.0074, Relator Ministro João
Oreste Dalazen, DEJT 27.02.2015).
De outra parte, a jurisprudência do Tribunal Supe-
rior do Trabalho reputava insubsistente a distinção al-
gumas vezes estabelecida entre prescrição intercorrente
e prescrição da ação executiva, sob o fundamento de
que essa distinção “... traz subjacente a superada ideia
de bipartição entre ação de conhecimento e ação de exe-
cução, que já não existia no Processo do Trabalho, ca-
racterizado por uma relação processual única, mesmo
antes das reformas do CPC, que implicaram a conso-
lidação do chamado processo sincrético, identif‌i cado
pela união de tutelas cognitivas e executivas” (TST-
-RR-72600-08.1989.5.02.0007, 2ª Turma, Rel. Min. José
Roberto Freire Pimenta, DEJT 13.03.2015).
Fundada na possibilidade de o juiz promover a
execução de ofício por força da previsão originária
do art. 878, caput, da CLT, a jurisprudência do TST
foi estruturada axiologicamente sobre uma concepção
substancialista do Direito do Trabalho, com o evidente
propósito de consagrar ao crédito trabalhista a hie-
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rarquia própria a sua condição de crédito represen-
tativo de direito fundamental previsto no art. 7º da
Constituição Federal, dotado do superprivilégio legal
Para André Araújo Molina, o TST realizou uma me-
tainterpretação da jurisprudência para os casos em
que a execução f‌i cava parada em razão de omissão
de ato do juízo ou da prática de ato da defesa. Essa
interpretação conduzia ao afastamento da prescrição
intercorrente, já que a paralisação do processo não era
causada pela omissão do exequente.(2)
A concepção substancialista que conformava a ju-
risprudência do Tribunal Superior do Trabalho sobre o
tema revelava-se evidente quando se observava que o
TST admitia Recurso de Revista contra a decisão regional
que acolhe a arguição de prescrição intercorrente. Essa
concepção substancialista tornava-se ainda mais evidente
quando o estudo da jurisprudência do TST revelava que
o tribunal admitia o Recurso de Revista sob fundamento
de violação a três distintos dispositivos da Constituição
Federal. Em outras palavras, o TST reputava caracteri-
zada ofensa direta e literal a três dispositivos da Consti-
tuição Federal quando o Tribunal Regional do Trabalho
declarava prescrição intercorrente na execução.
Como é sabido, o cabimento de Recurso de Revista
na fase de execução está restrito à hipótese de violação
literal e direta de norma da Constituição Federal. Com
efeito, a teor do art. 896, § 2º, da CLT, não cabe Recurso
de Revista das decisões proferidas em execução de sen-
tença, “... salvo na hipótese de ofensa direta e literal de
norma da Constituição Federal.”(3)
A pesquisa realizada na jurisprudência revela que o
Tribunal Superior do Trabalho admitia Recurso de Re-
vista nessa hipótese tanto sob fundamento de violação
ao art. 5º, XXXVI, da Constituição Federal (coisa julga-
da) quanto sob fundamento de violação ao art. 5º, XXXV,
da Constituição Federal (cláusula da inafastabilidade da
jurisdição); bem como sob fundamento de violação ao
art. 7º, XXIX, da Constituição Federal (prescrição bienal
e quinquenal).
As ementas a seguir sintetizam a concepção substan-
cialista que se formara na jurisprudência do Tribunal
Superior do Trabalho acerca da matéria, na medida em
que essas ementas revelam que o TST admitia o recurso
de revista por: a) ofensa ao inciso XXXVI do art. 5º da
Constituição Federal (coisa julgada):
RECURSO DE EMBARGOS INTERPOSTO SOB A ÉGIDE DA
LEI N. 11.496/2007. EXECUÇÃO. PRESCRIÇÃO INTERCOR-
RENTE. ALEGAÇÃO DE AFRONTA À COISA JULGADA.
Afronta o art. 5º, XXXVI, da Constituição da República decisão
(2) “A prescrição intercorrente na execução trabalhista”. Revista Jurídica Luso-Brasileira, Ano 3 (2017), n. 2. p. 124.
(3) “Art. 896. Cabe Recurso de Revista... .
§ 2º Das decisões proferidas pelos Tribunais Regionais do Trabalho ou por suas Turmas, em execução de sentença, inclusive em processo incidente de
embargos de terceiro, não caberá Recurso de Revista, salvo na hipótese de ofensa direta e literal de norma da Constituição Federal.”
por meio da qual se extingue a execução com resolução do mérito,
em virtude da incidência da prescrição intercorrente, uma vez
que tal conduta impede indevidamente a produção dos efeitos
materiais da coisa julgada, tornando sem efeitos concretos o
título judicial transitado em julgado. Recurso de embargos co-
nhecido e provido. (E-RR — 4900-08.1989.5.10.0002, Relator
Ministro Lelio Bentes Corrêa, SBDI — 1, DEJT 29.06.2012);
Federal (cláusula da inafastabilidade da jurisdição):
RECURSO DE REVISTA INTERPOSTO NA VIGÊNCIA DA
LEI N. 13.015/2014. FASE DE EXECUÇÃO. INÉRCIA DO
EXEQUENTE. JUSTIÇA DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO IN-
TERCORRENTE. INAPLICABILIDADE. ART. 5º, XXXV, DA
CONSTITUIÇÃO FEDERAL. 1. A jurisprudência do Tribunal
Superior do Trabalho consolidou o entendimento de que não
se aplica a prescrição intercorrente na Justiça do Trabalho, sob
pena de inef‌i cácia da coisa julgada material. Precedentes. 2. A
diretriz perf‌i lhada na Súmula n. 114 do TST também incide
no caso de paralisação do processo decorrente de inércia do
exequente. Ressalva de entendimento pessoal do Relator. 3.
Viola o art. 5º, XXXV, da Constituição Federal acórdão regional
que mantém a declaração de prescrição intercorrente, ante a inér-
cia do Exequente. 4. Recurso de revista do Exequente de que
se conhece a que se dá provimento para afastar a prescrição
intercorrente e determinar a remessa dos autos à Vara do Tra-
balho de origem, para que prossiga na execução. (RR-162700-
04.1997.5.03.0103, Relator Ministro João Oreste Dalazen, 4ª
Turma, DEJT 17.06.2016);
Federal (prescrição bienal e quinquenal):
RECURSO DE REVISTA. FASE DE EXECUÇÃO. INÉRCIA
DO EXEQUENTE. JUSTIÇA DO TRABALHO. PRESCRIÇÃO
INTERCORRENTE. INAPLICABILIDADE SÚMULA N. 114
dência do Tribunal Superior do Trabalho consolidou o enten-
dimento de que não se aplica a prescrição intercorrente na
Justiça do Trabalho. 2. A diretriz perf‌i lhada na Súmula n. 114
do TST também incide no caso de paralisação do processo de-
corrente de inércia do exequente. Ressalva de entendimento
pessoal do Relator. 3. O art. 7º, XXIX, da Constituição Federal
prevê a contagem da prescrição bienal e quinquenal na Justiça
do Trabalho em relação à data de extinção da relação de traba-
lho e do ajuizamento da ação, não durante seu trâmite. 4. Viola
o art. 7º, XXIX, da Constituição Federal acórdão regional que
mantém a declaração de prescrição intercorrente, ante a inércia
do Exequente. 5. Recurso de revista de que se conhece e a
que se dá provimento para afastar a prescrição intercorrente e
determinar a remessa dos autos à Vara do Trabalho de origem,
para que prossiga na execução (RR-20400-07.1995.5.02.0074,
Relator Ministro João Oreste Dalazen, DEJT 27.02.2015).
No primeiro julgado, o TST reputou violado o art. 5º,
XXXVI, da Constituição Federal por entender que a de-
claração de prescrição intercorrente pelo Tribunal Re-
gional esvaziava a coisa julgada material estabelecida no
título executivo judicial em execução; para reproduzir
os termos da ementa, porque a pronúncia da prescrição

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