O princípio da legalidade em tempos de pandemia

AutorVitor Galvão Fraga, Edilson Pereira Nobre Júnior
Páginas60-76
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Vol.93 N.01 - Anno CX XX
FRAGA, Vitor Galvão; NOBRE JUNIOR, Edilson Pereira. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM TEMPOS DE PANDEMIA. Revista
Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, v. 93, n. 1, p. 60-76 Abr. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível e m:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/249020>
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O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM TEMPOS DE PANDEMIA
LEGALITY PRINCIPLE IN PANDEMIC TIMES
Vitor Galvão Fraga1
Edilson Pereira Nobre Júnior2
RESUMO
O presente artigo versa sobre o princípio da legalidade no contexto da crise sanitária
causada pelo coronavírus em 2020. Especificamente, busca-se aqui questionar o senso comum de
que a situação emergencial pode justificar mitigações à reserva de lei no âmbito do direito
administrativo ordenador. Para trabalhar essa temática, começamos por uma análise da
competência dos entes federados em matéria de saúde dentro no contexto do federalismo
brasileiro. A partir daí, traçamos as características e implicações do princípio da legalidade
administrativa para, num terceiro momento, analisar sua imperatividade no tocante aos atos
normativos sancionatórios expedidos pelas Administrações estaduais e municipais. Concluímos,
como não poderia deixar de ser, pela higidez do primado da legalidade e do Estado
Constitucional de Direito mesmo diante das demandas urgentes da crise sanitária, expondo que o
ordenamento jurídicodispõe de meios que podem acelerar o processo legislativo sem que se
precise recorrer à flexibilização da legalidade.
Palavras-chave: Competência. COVID-19. Federalismo. Legalidade. Saúde.
ABSTRACT
The presente article is about the legality principle in the context of COVID-19‟s sanitary
crisis in 2020. Specifically we aim to lay doubt over te common sense that the emergency
situation can justify a mitigation on law‟s reserve in the realm of administrative law. In order to
develop this subject, we start by analysing the competence of the federative entities on matter of
health in the context of brazialian‟s federalism.From there we can draw the characteristic and
implications of the legality principle, and then, in a third moment, analyse its imperativeness in
1 Mestrando do Programa de Pós-Graduação em Direito da Faculdade de Direito d o Recife UFPE. Especialista em
Direito Administrativo UFPE. Especialista em Direito Constitucional Faculdade CE RS. Integrante do Grupo de
Pesquisa “Desafios do Controle da Administração Pública Contemporânea”. Advogado.
2 Professor Titular da Faculdade de Direito do Recife UFPE. Doutor em Direito P úblico. Líder do Grupo de
Pesquisa “Desafios do Controle da Administração Pública Contemporânea”. Desembargador d o Tribunal Regional
Federal da Quinta Região.
Recebimento em 07/12/2020
Aceito em 16/12/2020
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Vol.93 N.01 - Anno CX XX
FRAGA, Vitor Galvão; NOBRE JUNIOR, Edilson Pereira. O PRINCÍPIO DA LEGALIDADE EM TEMPOS DE PANDEMIA. Revista
Acadêmica da Faculdade de Direito do Recife - ISSN: 2448-2307, v. 93, n. 1, p. 60-76 Abr. 2021. ISSN 2448-2307. <Disponível e m:
https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMICA/article/view/249020>
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the matter of sanctionary normative acts edited by the Administration of States and
Municipalities. We come to the inevitable conclusion that the legality principle and the
Constitutional State of Law stay unbended even facing the urgent demands of the sanitary crisis,
exposing that the legal order has means to accelarate the legislative process without having to
resort to legality‟s erosion.
Keywords:Competence.COVID-19.Health.Federalism.Legality.
“O princípio da legalidade exprime que a Administração deve sempre agir
conforme as regras que lhe são aplicáveis.” - Didier Truchet (2017, p. 52)3
1 INTRODUÇÃO
O Direito, como sistema de ordenação de condutas, não se exaure nos confins dos seus
textos normativos. Põe-se em movimento diante dos desafios da realidade, a qual nem sempre é
previsível, muitas vezes cedendo diante de ocorrências extraordinárias.
Há pouco o clima de aparente tranquilidade global foi quebrantado de uma forma
inesperada, mas não por explosões provocadas por armas atômicas, tal como se pressupunha em
tempos de Guerra Fria, com relação à qual se temia que, por uma terceira vez, houvesse a
conflagração de um conjunto numeroso de Estados, desta vez com risco de desaparição da
humanidade.
Diversamente, pelo menos em gravidade, o desenvolvimento tecnológico que implicou
no encurtamento de fronteiras não somente virtual, mas físico -, fez com que um vírus, com a sua
invisibilidade, pudesse percorrer os quase inteiramente a superfície da Terra, ocasionando uma
pandemia capaz de atentar, caso não contida, contra a vida de milhões de pessoas.
O enfrentamento da situação requer atuação do Estado no sentido de envidar ações para
que seja evitado os riscos da expansão da enfermidade, tal qual se tem no art. 196, caput, da
Constituição Federal.
Tal sucede mediante a atuação primordial da função administrativa, à qual incumbe
realizar materialmente as prestações materiais a cargo do Estado em favor dos cidadãos, sem
excluir a imposição assídua, aliás - de limitações à conduta destes4.
3 Tradução própria do original: “Le príncipe de légalité exprime cetteévidence que l‟Administration doit
toujours agir conformémentauxrèglesquis‟appliquent à ele.”
4 A respeito de uma ideia de função administrativa, não se afigura equivocado, antes recomend ável, evocar
ensinamento de Marcelo Caetano, ainda portador de uma boa dosagem de atualidade, quando , em buscando

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