Princípios Reitores da Prova

AutorManoel Antonio Teixeira Filho
Páginas55-62

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O douto Amauri Mascaro Nascimento (ob. cit., p. 199) aponta, como princípios regentes da prova no processo do trabalho, os seguintes:

  1. da necessidade da prova, em virtude do qual os fatos que são do interesse das partes devem ser demonstrados em juízo, não bastando que sejam meramente alegados. O próprio juiz só pode julgar de acordo com o alegado e provado;

    b) da unidade da prova, que embora possa ser constituída por diversos meios, se corporifica em um todo, uno, que deverá ser apreciado englobadamente;

  2. da lealdade ou probidade da prova, segundo o qual há um interesse de todos em que a verdade seja encontrada, sem deformações, razão por que as partes devem colaborar para que a vontade da lei possa incidir no caso concreto, via prestação jurisdicional, sem vícios ou falsos pressupostos;

  3. da contradição, porque a parte contra quem foi produzida a prova tem o direito de impugná-la, de produzir contraprova, sendo, por isso, inadmissível a produção secreta de provas;

    e) da igualdade de oportunidade de prova, com o que se garante às partes a mesma oportunidade para requererem a produção de provas, ou mesmo para produzi-las;

    f) da legalidade, que vincula a produção de provas à forma prevista na lei;

    g) da imediação, que significa não apenas a direção da prova, pelo Juiz, mas a direta intervenção deste na instrução, notadamente nos sistemas que adotam a oralidade;

    h) da obrigatoriedade da prova, a poder da qual “sendo a prova de interesse não só das partes, mas do Estado que quer o esclarecimento da verdade, as partes devem ser compelidas pelo juiz a apresentar no processo determinada prova, sofrendo sanções no caso de omissão, especialmente as presunções que passam a militar contra aquele que se omitiu e a favor de quem solicitou”.

    Fazendo uma breve análise desses princípios, temos:

Necessidade da prova

Com efeito, os fatos narrados em juízo devem ser cabalmente provados para que o órgão judicante os admita como verdadeiros.

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O encargo da prova incumbirá a quem a existência do fato aproveite, conforme seja a hipótese, e de acordo com os critérios de partição desse ônus, fixados em lei (CLT, art. 818). Esse onus probandi, contudo, como vimos, não compreende os fatos notórios, os incontroversos e aqueles que a lei presume existentes ou verdadeiros (CPC, art. 334 e incs.). A necessidade está em que o juiz não se pode deixar impressionar com meras alegações expendidas pelas partes, exigindo-lhe a lei que decida, que forme a sua convicção, com apoio na prova produzida nos autos (CPC, art. 131).

Incide no particular, portanto, a regra latina “secundum allegata et probata iudex iudicare debit” (“o juiz deve julgar conforme o alegado e provado”), que dá conteúdo aos sistemas processuais dispositivos.

Sobre ser dispositivo, inquisitivo ou misto o sistema adotado pelo processo do trabalho, veremos no Capítulo X, desta Primeira Parte.

Dessa maneira, podemos formular a seguinte regra, algo insólita: ao juiz, tangido pelo dever legal de imparcialidade, e consciente de que crer em ambas as partes é impossível (por uma questão elementar de lógica formal), resta apenas a alternativa de, até prova em contrário, não acreditar em nenhuma delas.

Desse princípio também se extrai a regra de que o juiz não pode decidir com base no seu conhecimento pessoal dos fatos controvertidos — ressalvado o nosso entendimento, já manifestado em página anterior, de que, em certas situações especiais, a exceção se torna mais importante do que a regra.

Sob certo aspecto, a prova está vinculada com o próprio regime democrático adotado em nosso país. Com efeito, se levarmos em conta o fato de a prova constituir um dos fundamentos dos pronunciamentos jurisdicionais; que esse fundamento é exigido pela Constituição Federal (art. 93, IX); e que a República Federativa do Brasil está constituída sob a forma de Estado Democrático de Direito, não teremos dificuldade em reconhecer uma íntima relação entre a prova judicial e o regime político imperante em nosso meio. O fundameneto das decisões judiciais, exigido pela Constituição Federal, traduz medida indispensável para evitar a arbitrariedade dos juízes. Não satisfaz às imposições legais e constitucionais, portanto, o fato de o juiz decidir as causas submetidas à sua cognição: é essencial que demonstre as razões jurídicas, os fundamentos de que se valeu para chegar à decisão.

Unidade (ou comunhão) da prova

É curial que a prova deva ser apreciada como um todo. Isso não significa, porém, que diante do complexo probatório o juiz só possa decidir, exclusivamente, a favor desta ou daquela parte. Essa atitude somente será exigível se a controvérsia concernir, apenas, a um fato eficiente, como, por exemplo, quando o empregado alegar que foi despedido sem justa causa (postulando, como consectário, o aviso prévio, o 13.º salário proporcional, as férias proporcionais, as guias para a liberação do FGTS, etc.) e o empregador, manifestando a sua contrariedade, sustentar que o empregado se demitiu. Nesse caso, impõe-se que o

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juiz, com fundamento nas provas, acolha como verdadeiro apenas um dos dois fatos-base mencionados (despedida injusta ou demissão).

Considerando, todavia, que as petições iniciais trabalhistas, em geral, contêm inúmeros pedidos, que decorrem, muitas vezes, de causas (fatos eficientes) heterogêneas, é palmar que ante o conjunto probatório — e sempre com fulcro nele — o juiz acolha parte dos pedidos do autor (e, consequentemente, parte dos pedidos do réu), sempre que for o caso.

Assim, o princípio em exame está a indicar que as provas devem ser apreciadas em seu conjunto, sem que se tenha de decidir, com exclusividade, em favor de um dos litigantes, só porque teria provado a maioria dos fatos em que se apoiam os seus pedidos. Para esse efeito, pouco importa que o conjunto probatório seja constituído por uma miscigenação de meios (documentos, testemunhas, perícia e todos os demais, moralmente legítimos, previstos em lei); sobreleva, sim, o fato de que esses meios, indistintamente, se revistam de eficácia para provar o que pretendem, atuando, dessa maneira, na formação do convencimento do julgador a respeito dos fatos da causa.

Lealdade ou probidade da prova

A prova, tal como o processo em geral, tem um propósito marcadamente ético; por isso, em um plano ideal pode-se afirmar que todos os sujeitos do processo (juiz, partes, advogados, membros do Ministério Público e o mais) têm interesse em que a verdade dos fatos seja encontrada pura, sem laivos de meia-verdade ou de falsa-verdade. O anseio, nesse sentido, visa a resguardar, sob um aspecto mais amplo, a própria respeitabilidade do Poder Judiciário e das decisões por ele proferidas.

Na prática, contudo, sabemos que não raro esse desiderato só se manifesta na consciência de quem tem o poder-dever constitucional de julgar, porquanto, propulsionadas às vezes por interesses subalternos, as partes se empenham em acobertar a verdade que lhes é prejudicial, valendo-se, nesse afã, de meios desleais e antiéticos.

Andou certo, por conseguinte, o legislador processual ao instituir uma punição ao litigante de má-fé, que se caracteriza, dentre outras coisas, por alterar, intencionalmente, a verdade dos fatos e por fazer uso do processo com o intuito de conseguir objetivo ilegal (CPC, art. 17, II e IV, respectivamente).

O inalienável conteúdo ético do processo fez com que a lei, até mesmo, tenha procurado impedir que as partes, em conchavo, pudessem se servir do processo para praticar ato simulado ou...

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