Sistema prisional brasileiro sob a perspectiva de gênero: invisibilidade e desigualdade social da mulher encarcerada

AutorYumi Miyamoto - Aloísio Krohling
CargoMestranda em Direitos e Garantias Fundamentais na Faculdade de Direito de Vitória - Ph. D em Filosofia e M.A. em Ciências Sociais. Professor de Filosofia do Direito no Programa de Mestrado em Direitos Fundamentais na Faculdade de Direito de Vitória
Páginas223-241
Sistema prisional brasileiro sob a
perspectiva de gênero: invisibilidade e
desigualdade social da mulher encarcerada
Yumi Miyamoto*
Aloísio Krohling**
1. Introdução
O espaço privado, desmistif‌icado como símbolo da intimidade e da
privacidade em contraposição ao espaço público, como o lugar de tensões,
de embates políticos, de guerras, é, na realidade, aplicado em sua acepção
original, de privação, qual seja, do espaço privado ser o espaço da priva-
ção. Neste sentido, espaço privado deve ser percebido como o espaço em
que o indivíduo é privado da sua própria existência uma vez que é destitu-
ído de coisas essenciais à vida verdadeiramente humana.
Com esta compreensão, constata-se que a pessoa, ao f‌icar conf‌inada ao
espaço privado, torna-se invisível já que passa a não ser vista pelos outros
e, por mais que se esforce, faça o que for aquilo que lhe parece importante
é desprovido de interesse pelos outros.
Partindo, então, desta linha de raciocínio, a mulher, sendo relegada
ao espaço privado pela construção social e cultural de desigualdade de
gênero, é lançada à invisibilidade social e, como tal, passa a não ser o foco
* Mestranda em Direitos e Garantias Fundamentais na Faculdade de Direito de Vitória. Graduada em Direito
pela Universidade de São Paulo – USP. Professora universitária. Faculdade de Direito de Vitória, Rua Dr.
João Carlos de Souza 779 – Santa Lucia - Vitória/ES/ Brasil - CEP: 29056-919- e-mail: yumi_mhmiyamoto@
hotmail.com
** Ph. D em Filosof‌ia e M.A. em Ciências Sociais. Professor de Filosof‌ia do Direito no Programa de Mestrado
em Direitos Fundamentais na Faculdade de Direito de Vitória. Rua Dr. João Carlos de Souza 779 – Santa
Lucia- Vitória/ES/ Brasil - CEP: 29056-919- e-mail: krohling@gmail.com
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de atenção dos cientistas, dos pensadores, dos intelectuais, dos juristas,
dos políticos. Acentuam-se, dessa forma, as desigualdades sociais entre
homens e mulheres, pois, como as mulheres se tornam invisíveis pelo seu
conf‌inamento ao espaço privado, os assuntos femininos não estarão na
escala de prioridades sociais.
Por outro lado, o sistema patriarcal maximiza as relações de domina-
ção e de poder exercido pelo homem em relação à mulher delineando os
estereótipos em relação à mesma, de sua inferioridade intelectual e cogni-
tiva, de sua dependência emocional, social e econômica ao homem, de seu
conf‌inamento ao espaço privado e ao seu destino biológico reprodutivo e
de sua agorafobia política.
O sistema político econômico, por sua vez, desenvolve estratégias de-
liberadas de conservação da ordem pública e, neste viés, de conservação
das classes, revelando as desigualdades de classes e, ao mesmo tempo,
produzindo mecanismos invisíveis e ef‌icientes de controle social, de con-
tenção da violência social. Portanto, é a ideologia capitalista e patriarcal
que justif‌ica e legitima o sistema de controle social, sistema este necessário
para proporcionar à sociedade certa estabilidade ao mediar na violência
constitutiva representada por ações positivas e ações negativas.
Neste sentido, as normas de direito penal são formadas e, ao mesmo
tempo, são aplicadas de forma seletiva evidenciando as relações de desi-
gualdades sociais existentes, onde o sistema penal é responsável pela re-
produção e produção das relações de desigualdade social.
Ao submeter à análise o sistema prisional brasileiro com base nesses
argumentos, verif‌ica-se claramente que o encarcerado, traz consigo suas
condições sociais anteriores, de desigualdade e exclusão social, onde es-
sas condições excludentes são mantidas intactas durante o período de seu
conf‌inamento prisional e o acompanharão ao ser devolvido ao meio da
sociedade.
Nossa hipótese é de que a conformação dos papéis sociais exercidos
por homens e mulheres que acentuam as relações de dominação do ho-
mem em relação à mulher e as desigualdades sociais decorrentes desses
papéis sociais é mantida dentro do sistema prisional brasileiro em relação
à mulher encarcerada.
Para tanto, nossa investigação objetiva responder à seguinte indagação:
as políticas públicas adotadas no sistema prisional no Espírito Santo bus-
cam a ressocialização da mulher encarcerada no sentido de sua conforma-
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Aloísio Krohling
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