Processo judicial eletrônico e o direito à desconexão

AutorRosane Gauriau
Páginas156-161

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Rosane Gauriau

Doutora em Direito pela Université Paris 1 – Sorbonne. Membro do Institut de Recherche Juridique de la Sorbonne. Mestre em Direito Empresarial pela Université d’Angers. Pós-Graduada em Direito do Trabalho pela Universidade Mackenzie. Graduada em Direito pela Universidade de Brasília. Servidora Pública do Tribunal Superior do Trabalho.

1. Generalidades

As novas tecnologias e instrumentos tecnológicos, a expansão da internet e do correio eletrônico revolucionaram o mundo, as formas de comunicação, inclusive no ambiente de trabalho1.

“Pode-se dizer que a criação de ferramentas, tais como: fax, e-mail, internet, Skype, Whatsapp, celular, bem como, a gradual redução do custo tecnológico (...) foram fatores essenciais, não só para o surgimento, mas para a consolidação dessa nova forma de organização do trabalho”2 possibilitando mais agilidade na comunicação e o trabalho “fora da sede das organizações, muitas vezes em tempo real3.

Numa sociedade conectada 24 horas por dia, as novas tecnologias de informação e comunicação têm impacto profundo sobre o trabalho e a forma de trabalhar: consequentemente, os limites entre a vida privada, social (lazer, qualidade de vida) e profissional tornam-se tênues4:

Segundo estudo realizado anualmente pelo Google juntamente com a empresa de pesquisas Kantar TNS intitulada Google Consumer Barometer, o uso crescente dos aparelhos vem afetando o comportamento das pessoas. Em 2016, a pesquisa contabilizou que o uso do telefone começa já pela manhã, uma vez que a ferramenta serve como despertador para 65% dos usuários. No decorrer do dia, a utilização do aparelho só aumenta, visto que 59% dos brasileiros conectam-se à internet principalmente nos smartphones, para acessar suas redes sociais, escutar músicas, fazer compras e transações bancárias, entre outras tarefas. Do total de entrevistados, 73% afirma que não sai de casa sem o aparelho e, segundo levantamento da Mobile Time com a Opinion Box, que realiza periodicamente pesquisas sobre o mercado de conteúdo e serviços móveis no Brasil, o aplicativo de mensagens WhatsApp é o mais utilizado, estando presente em 98% dos celulares5.

O Presidente da República, sensível às modificações tecnológicas, à sociedade de informação e à necessidade de modernização do Poder Judiciário6, promulgou em 19 de dezembro de 2006, a Lei n. 11.419 que regulamenta a informatização do Processo Judicial Eletrônico no Poder Judiciário, possibilitando a criação de sistemas para a tramitação eletrônica de processos (ajuizamento da ação, andamentos, decisão judicial etc.) por meio da internet e revolucionando a forma de trabalhar e a organização do trabalho no Poder Judiciário.

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O sistema processual eletrônico está enquadrado na terceira onda7 processual, respondendo aos anseios da sociedade e ao mandamus constitucional (art. 5º, LXXVIII) de ampliação do acesso à Justiça de celeridade, de eficiência da prestação jurisdicional, de “transparência, defesa da cidadania e legalidade8.

É fato que ja existiam experiências na informatização do processo no Rio Grande do Sul, Santa Catarina e Paraná, mas a Lei n. 11.419/2016 nasceu com a missão de unificar, de padronizar todos os procedimentos e iniciativas na matéria.

Regulamentado inicialmente na Justiça do Trabalho pela Resolução n. 94/CSTJ, de 23 de março de 2012 do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, e atualmente pela Resolução n. 185/CSJT, de 24 de março de 2017, Instrução Normativa n. 30, de 13 de setembro de 2007 e a Lei n. 11.419, de 19 de dezembro de 2006, o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) provocou uma sensível mudança na dimensão temporal do processo – perceptível pelos atores processuais (como magistrados, advogados, procuradores, membros do Ministério Público e Defensoria Pública, empregadores e jurisdicionado), mas também pelos servidores – na medida em que PJe-JT deve ficar disponível 24 horas por dia, ininterruptamente, por meio da internet, ressalvados os períodos de manutenção do sistema9.

O que conduz inevitavelmente à reflexão inicial sobre as novas formas de trabalhar e organizar o trabalho, a conexão, a hiperconexão e seus efeitos sobre a vida privada, social e profissional.

Sem a pretensão de exaurir o tema, esse artigo propõe-se a examinar o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) e o direito à desconexão, tendo em vista as demandas e peculiariedades do Processo Judicial Eletrônico (PJe-JT), em um ambiente web de trabalho disponível 24 horas por dia, durante todo o ano.

Assim, num primeiro momento, iremos abordar o Processo Judicial Eletrônico (PJe), o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) conceito e sua legislação (1).

Num segundo momento, o direito à desconexão face às peculiariedades do Processo Judicial Eletrônico (PJe) (2):

2. Processo judicial eletrônico (pje)

Conceito

Processo Judicial Eletrônico (PJe), segundo o Conselho Nacional de Justiça (CNJ) é:

(...) um sistema desenvolvido pelo CNJ em parceria com os tribunais e a participação da Ordem dos Advogados do Brasil (OAB) para a automação do Judiciário. O objetivo principal é manter um sistema de processo judicial eletrônico capaz de permitir a prática de atos processuais, assim como o acompanhamento desse processo judicial, independentemente de o processo tramitar na Justiça Federal, na Justiça dos Estados, na Justiça Militar dos Estados e na Justiça do Trabalho.

O CNJ pretende convergir os esforços dos tribunais brasileiros para a adoção de uma solução única, gratuita para os próprios tribunais e atenta para requisitos importantes de segurança e de interoperabilidade, racionalizando gastos com elaboração e aquisição de softwares e permitindo o emprego desses valores financeiros e de pessoal em atividades mais dirigidas à finalidade do Judiciário: resolver os conflitos.

A utilização do sistema exige a certificação digital de advogados, magistrados, servidores ou partes que precisarem atuar nos novos processos10.

Já o Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) é o “sistema informatizado de processo judicial desenvolvido pelo Conselho Superior da Justiça do Trabalho (CSJT), por delegação do Conselho Nacional de Justiça (CNJ), para subs-tituir os autos físicos dos processos trabalhistas por registros eletrônicos de dados e de andamento processual disponibilizados na rede mundial de computadores (internet)”11.

O objetivo principal do Processo Judicial Eletrônico é não somente unificar o sistema de processo judicial, mas estabelecer padrões e métodos de trabalho, definidos pelo CNJ, que favoreçam a interoperabilidade e interconexão entre as justiças e seus atores processuais (como magistrados, advogados, procuradores, membros do Ministério Público e Defensoria Pública, empregadores e jurisdicionado)12.

Legislação

O Processo Judicial Eletrônico (PJe) foi instituído pela Lei n. 11.419, de 19 de dezembro de 2006, denominada lei do Processo Judicial Eletrônico, que dispõe sobre a informatização do processo judicial; alterando, dentre outros, dispositivos da Lei n. 5.869, de 11 de janeiro de 1973 – do antigo Código de Processo Civil.

A informatização do processo faz parte do denominado Pacto republicano de reformas infraconstitucionais do

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processo com o fim de garantir celeridade no conflito de interesses entre as partes – efetivamente, a tecnologia tem muitas ferramentas a contribuir com o trâmite processual.

O processo eletrônico elimina boa parte das diligências que muitos denominam de tempos mortos ou neutros, uma vez que não diretamente relacionadas com o objetivo primordial, que é a prestação jurisdicional13.

Regulamentado inicialmente na Justiça do Trabalho pela Resolução n. 94/CSTJ, de 23 de março de 2012, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, que instituiu no âmbito da Justiça do Trabalho o sistema de Processo Judicial Eletrônico (PJe-JT), e regido, atualmente, pela Resolução n. 185/CSJT, de 24 de março de 2017, do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, Instrução Normativa n. 30, de 13 de setembro de 2007 e a Lei n. 11.419, de 19 de dezembro de 2006, o Processo Judicial Eletrônico (PJe) na Justiça do Trabalho é o sistema informatizado único para a tramitação de processos judiciais.

O Processo Judicial Eletrônico da Justiça do Trabalho (PJe-JT) tem inúmeras vantagens, como por exemplo:

– ampliar e/ou facilitar o acesso à Justiça (24h por dia, 7 dias por semana, durante todo ano e de qualquer lugar em que haja acesso a internet14) permitindo que a justiça esteja, de modo permanente, ao alcance de todo o cidadão. Assim, o trabalho, nesse ambiente, é possível todo tempo e em qualquer lugar: basta internet, um computador ou notebook, de tablets ou telefone celular.

– economia e celeridade processual: elimina o chamado “tempo morto”15 (tempo que corresponde a cerca de...

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