Processo Judicial I

AutorConsuelo Yoshida
Páginas102-121

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Consuelo Yoshida - [Truncado na gravação] tão conhecidos e consagrados. E o tema, Processo Judicial, a primeira mesa; depois, teremos a continuidade, também, com o Processo Judicial II. Teremos então, em primeiro lugar, a palestra da professora Maria Rita Ferragut, Medida Cautelar Fiscal. Eu vou passar, então, à leitura do seu currículo. Ela é professora com doutorado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo; mestrado também pela mesma Universidade. Pós-Graduação lato sensu no Centro de Extensão Universitária e é formada também na Graduação pela PUC. É professora assistente do professor Paulo de Barros Carvalho, no curso de Mestrado em Direito Tributário na PUC; professora também do Curso de Especialização lato sensu em Direito Tributário na mesma Universidade e nos cursos promovidos pelo IBET, que tiveram início em 98. Professora do Curso de MBA da FIA/FEA da USP, Capacitação Gerencial do Programa de Educação Continuada em Administração para Executivos; professora mestre em Direito Tributário, como já foi dito, palestrante em diversos seminários e congressos no País, incluindo treinamentos internos da Receita Federal, INSS e Secretaria da Fazenda do Estado de São Paulo; integra diversas bancas de mestrado e doutorado das universidades PUC e USP; advogada militante na área tributária, no escritório Aires Barreto e, também, nas áreas tributária e administrativa, antes, no Escritório Miguel Neto - sócia desde 99. Os livros publicados, Presunções no Direito Tributário, pela Dialética e, depois, a Segunda Edição pela Quartier Latin. Então, com a palavra, a professora Maria Rita Ferragut, Medida Cautelar Fiscal.

Medida Cautelar Fiscal

Maria Rita Ferragut - Bom dia a todos. É uma grande satisfação para mim participar do XXVI Congresso de Direito Tributário do IDEPE, eu agradeço imensamente a gentileza do convite, o que faço na pessoa da nossa presidente, a doutora Maria Leonor Leite Vieira. Gostaria de dizer que a minha satisfação é ainda maior por integrar uma mesa presidida pela doutora Consuelo Yoshida - a quem eu nutro uma grande admiração - e pelos meus caros amigos, doutor Paulo Conrado e doutora Juliana Furtado Costa Araújo, que são excelentes e polêmicos expositores. Eu falarei sobre medida cautelar fiscal, sobre garantia do crédito tributário e sobre direitos do contribuinte.

A medida cautelar fiscal é uma ação de titularidade da Fazenda Pública, que visa obter um provimento judicial que indisponibilize os bens e direitos do devedor. A medida cautelar fiscal não se confunde com a cautelar antecipatória de garantia, que é uma ação judicial própria, de titularidade do devedor, para garantir a execução fiscal antecipadamente. Não é sobre isso que nós trataremos. A minha exposição aqui é sobre a garantia do crédito tributário, medida cautelar cuja titularidade é exclusivamente da Fazenda Pública. A medida cautelar fiscal foi criada há muito tempo, pela Lei 8.397/92, com alterações significativas em 1997. Portanto, a caute-

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lar existe há 20 anos, é da época de nosso ex-presidente Collor. E minha colocação inicial para vocês é por que essa medida judicial existe há tanto tempo e somente agora - me arrisco a dizer que a partir de 2010 - ela passou a ser muito utilizada pela Procuradoria.

Vivemos um momento em que a medida cautelar é muito utilizada. Imagino que a razão de sua não utilização por tanto tempo tenha sido a seguinte: a efetiva arrecadação de um crédito tributário do devedor que não paga no momento oportuno, no vencimento da dívida, ela vem se mostrando cada vez mais difícil, mais inviável. É uma atividade muito complexa, e é complexa e difícil em função de diversos fatores. Falta investimento público para a execução dessa dívida ativa, falta estrutura, falta funcionário treinado e capacitado. E falta - doutora Juliana - procuradores. A contingência de procuradores é insuficiente versus a demanda que se tem pela execução da dívida ativa. E esse problema cada vez mais se agrava em função da informatização da fiscalização.

Então, por conta de toda essa informatização, nós, cada vez mais, vivemos um momento em que os débitos são executados independentemente da ação particular de um sujeito, do procurador. Ela é enviado diretamente para a execução judicial, após a inscrição em dívida ativa. Isso fez com que a contingência de processos tenha aumentado muito. E, a partir desse momento, dessa realidade, imagino que tenha sido necessário se centrar em uma solução. O que é que o Direito oferece como possibilidade, como instrumento para a execução dessa dívida e garantia dessa dívida? E uma dessas medidas - e, talvez, hoje, uma das mais relevantes - tenha sido efetivamente a medida cautelar fiscal. Porque ela proporciona a indisponibilidade do bem do devedor, fazendo com que, no final do processo judicial, se for efetivamente confirmada a procedência daquele débito, ele possa ser transformado em crédito da União, do Estado ou do Município - ele adentre o orçamento público.

O que nós não podemos confundir nesse contexto inicial é o seguinte: quando defendemos ou aceitamos a existência da medida cautelar fiscal, é importante que haja uma divisão de percepção de consti-tucionalidade. Da perspectiva formal, ela é constitucional. Foi introduzida por meio de lei ordinária, a competência, por tratar de processo, é da União Federal. Então, atende os requisitos constitucionais, é constitucional.

Do ponto de vista material, será que a medida cautelar está de acordo comas regras de nosso sistema? Será que ela é constitucional? É sobre isso que pretendo falar com vocês, porque eu divido as hipóteses previstas na lei em dois grandes conjuntos. Existem aquelas situações legalmente previstas em que o devedor procura dilapidar o seu patrimônio ou, efetivamente, dilapida o seu patrimônio, ou se encontra em uma situação de insolvencia ou simplesmente desaparece - ele não possui um endereço conhecido, que são situações inequivocamente urgentes e que oferecem uma ameaça real e concreta à satisfação da dívida. Então, nessa situação, o contribuinte está insolvente, o contribuinte desaparece, o contribuinte executa atos de doação, de constituição, de holdings familiares, planejamentos sucessórios, planejamentos patrimoniais; o contribuinte contrai um número muito elevado de dívidas, para que aquele patrimônio que seria utilizado para o adimplemento da dívida fiscal possa ser utilizado para o pagamento de dívidas fictícias. Então, ele se estrutura de uma maneira a diminuir o seu patrimônio, que seria utilizado, em última análise, para o adimplemento da dívida, para protegê-lo, para que, caso ele percao processo judicial, ele, no final de tudo, seja considerado como um devedor, mas que ele não sofra conseqüências sérias da perspectiva patrimonial. Então, nessas situações, no meu entendimento, a medida cautelar é constitucional e

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deve, sim, ser aplicada pela Procuradoria e deferida pelo Judiciário.

O que é necessário nesse contexto? São dois os pontos. Primeiro, que exista um débito constituído. Isso é o pressuposto básico, que se encontra previsto na lei, e acredito que todos aqui defenderíamos essa primeira condição. Eu não posso indisponibilizar um bem do devedor por um fato gerador que sequer ocorreu e que, caso venha a ocorrer, eu presuma que não será pago. Isso é inviável, só posso indisponibilizar os bens quando existe uma dívida efetivamente constituída e conhecida. É uma primeira condição.

E uma segunda condição é que os débitos que autorizam a propositura da medida cautelar sejam devidamente comprovados pelo titular da ação, ou seja, pela Procuradoria. Não há inversão do ônus da prova, é incabível a mera alegação desprovida de um suporte Tactual. Nessas situações, se ocorrido, na minha visão, a petição inicial deve ser declarada inepta, porque não há cabimento, porque o motivo que autoriza essa propositura não se encontra demonstrado. E se não há prova, por exemplo, de dilapidação patrimonial ou de insolvencia, não posso meramente alegar e defender que o juiz poderia conceder uma medida assim, tão drástica, que secciona, sem dúvida alguma, o patrimônio, o direito de; propriedade que está previsto na nossa Constituição. Ele deve ser sempre protegido. A tributação existe, mas como uma exceção do patrimônio, do direito de propriedade, nas situações lá previstas.

Eu não posso ter uma interpretação tão ampla que permita que qualquer débito legitime a indisponibilidade dos bens do devedor. Todos podemos, em algum momento de nossa vida, dever. Inúmeros contribuintes devem. O Estado deve. Mas o fato de ser devedor não significa que o sujeito é sonegador, não significa que esse débito não será adimplido por aquele devedor. Então, esse grande corte precisa ser feito desde o início. Para que a medida cautelar fiscal seja cabível, é necessário que a Procuradoria prove, junto coma petição inicial, que há urgência e há perigo de insolvencia, que há perigo de não satisfação da dívida no final de um processo judicial. Nessas situações, é cabível a medida cautelar.

Isso posto, quando não é cabível a medida cautelar? Trago para vocês várias situações previstas na lei. A lei, se bem aplicada, é um progresso para a satisfação do interesse público. Mas ela viola, em diversas hipóteses, direitos do contribuinte que devem, sim, ser protegidos pelo Judiciário. O primeiro deles é a questão do limite de 30% do patrimônio do devedor. Se for constituída uma dívida que supere 30% do patrimônio conhecido daquele devedor, a Procuradoria pode propor uma medida cautelar fiscal. Para mim, isso é um absurdo. Por que é um absurdo? Imaginem vocês que eu sou contribuinte e que devo dez milhões de reais. Eu tenho um auto de infração lavrado, de três milhões de reais. Ou 3,5 milhões, vamos dizer assim. Por que dever 3,5 milhões implica o risco de inadimplemento de meu débito futuro?

Não há nenhuma correlação entre dever acima de 30% do meu patrimônio, com urgência da Fazenda Nacional ou da Fazenda do Estado...

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