Aprovação das contas pelos próprios administradores-acionistas, ausência de conflito de interesses e abuso de minoria

AutorAlfredo Sérgio Lazzareschi Neto - Mauro Rodrigues Penteado
Páginas291-298

Page 291

Apelação n. 0007654-10.2010.8.26.0286

Romeu Ricupero - Presidente e Relator

Voton.17.777

Apelação Cível com Revisão n. 0007654-10.2010.8.26.0286

Apelantes: Ordene Comércio e Participações S/A e Outros

Apelado: Salvatore Ambrosino

Comarca: Itu - 3a Vara Cível

Ementa: Sociedade anónima. Ação de anulação de votos de acionistas impedidos e, consequentemente, de anulação da deliberação que aprovou as contas do exercício de 2008. Procedência na origem. Inadmissibilidade. Excluídos os votos dos acionistas impedidos (Presidente e Vice Presidente), o voto do autor seria suficiente, por si só, em verdadeira e mera condição potestativa, para rejeitar arbitrariamente quaisquer contas. Não obstante o disposto no § Io do art. 115 da LSA, deve prevalecer o que consta do caput do mesmo artigo, ou seja, "o acionista deve exercer o direito a voto no interesse da companhia; considerar--se-á abusivo o voto exercido com o fim de causar dano à companhia ou a outros acionistas, ou de obter, para si ou para outrem, vantagem a que não faz jus e de que resulte, ou possa resultar, prejuízo para a companhia ou para outros acionistas". Para a caracterização do abuso de poder de que trata o art. 117 da Lei das Sociedades por Ações, ainda que desnecessária a prova da intenção subjetiva do acionista controlador em prejudicar a companhia ou os minoritários, é indispensável aprova do dano. Do mesmo modo, para a anulação pretendida, também é indispensável a prova do dano, prova essa inexistente na espécie. Sentença reformada e ação julgada improcedente, com reversão da sucumbência. Apelação provida.

ACÓRDÃO

Vistos, relatados e discutidos estes autos de Apelação n. 0007654-10.2010.8.26.0286, da Comarca de Itu, em que são apelantes Ordene Comercio e Participações S/A, Alida Maria Fleury Bellandi e Carlos Alberto Fleury Bellandi sendo apelado Salvatore Ambrosino.

Acordam, em Câmara Reservada de Direito Empresarial do Tribunal de Justiça de São Paulo, proferir a seguinte decisão:

Page 292

"Deram provimento ao recurso. V. U.", de conformidade com o voto do Relator, que integra este acórdão.

O julgamento teve a participação dos Exmos. Desembargadores Romeu Ricupe-ro (Presidente), José Reynaldo e Pereira Calças.

São Paulo, 7 de fevereiro de 2012. RELATÓRIO

Trata-se de apelação interposta por Ordene Comércio e Participações S/A, Ali-da Maria Fleury Bellandi e Carlos Alberto Fleury Bellandi (fls.205/215) contra a R. sentença de fls. 197/200, proferida pela MMa Juíza Juliana Morais Bicudo, cujo relatório adoto, que julgou procedente a ação que lhes move Salvatore Ambrosino, para:

(1) declarar a invalidade dos votos proferidos pelos réus Alida Maria Fleury Bellandi e Carlos Alberto Fleury Bellandi, na deliberação de aprovação das demonstrações financeiras e contas da administração da ré Ordene Comércio e Participações S/A, relativas ao exercício social encerrado em 31.12.2008, objeto da Assembleia Geral Ordinária realizada em 23.3.2009, e, por conseguinte: (1.a) anular a deliberação de aprovação das demonstrações financeiras e contas da administração da ré Ordene Comércio e Participações S/A, relativas ao exercício social encerrado em 31.12.2008, objeto da Assembleia Geral Ordinária realizada em 23.3.2009; e (1.b) declarar não aprovadas as demonstrações financeiras e contas da administração da ré Ordene Comércio e Participações S/A, relativas ao exercício social encerrado em 31.12.2008;

(2) condenar os réus ao pagamento das custas, despesas processuais e honorários advocatícios fixados em R$ 1.000,00 (um mil reais), com base no art. 20, § 4o, do CPC.

Após breve síntese dos fatos, os apelantes insistem que a sentença não considerou que o apelado sequer alegou a possibilidade de ocorrência de prejuízo para si ou para a Ordene se a deliberação que aprovou as contas fosse mantida. Pelo contrário, reconhecendo-lhes a exatidão, o apelado recebeu os dividendos que lhe foram distribuídos com base nessas mesmas contas, sem formular protesto algum quanto ao montante distribuído. De qualquer forma, se não se alegou e, portanto, muito menos se provou que prejuízo adviria da manutenção da deliberação social, não havia motivo para que a sentença a anulasse.

Reiteram também que, como as demonstrações do exercício de 2009 já foram aprovadas, não cabe a anulação das contas de 2008, em razão do princípio contábil da continuidade.

Repisam ainda que o apelado não se insurgiu, durante a Assembleia, contra o exercício do direito de voto por Carlos e Alida.

Enfatizam que não há nenhuma irregularidade nas contas da Ordene, capaz de justificar a anulação requerida, e sim o apelado tem o nítido propósito de retaliar os apelantes, e isso porque foi expulso de uma sociedade controlada da Ordene, a Guarany (fls. 84/94), e destituído de sua administração em virtude da prática de atos de improbidade (fls. 96/100).

Realçam que o apelado recebeu dividendos sem ressalvas, tendo, pois, ratificado a aprovação das contas. Esse comportamento contraditório do apelado configura o venire contra factum proprium, expediente condenado pelo E. STJ.

Preparado (fl. 216), o recurso, que é tempestivo, foi recebido (fl. 217) e respondido (fls. 218/228).

FUNDAMENTOS

Segundo consta da petição inicial, em 23.3.2009, foi realizada a Assembleia Geral Ordinária da ré Ordene, ocasião na qual suas

Page 293

contas do exercício social encerrado em 31.12.2008 foram indevidamente aprovadas "pela maioria dos presentes", ficando vencido o autor que votou pela não aprovação das referidas contas.

Na supracitada AGO estavam presentes tão somente as seguintes pessoas: (i) o autor, representando 14,766% do capital social; (ii) o réu Carlos, representando 43,954% do capital social; (iii) a ré Alida, representando 38,520% do capital social.

Portanto, a AGO contou com presença de acionistas que representavam, em conjunto, 97,240% do capital social.

Ocorre que os réus Carlos e Alida estavam legalmente impedidos de participar dessa deliberação (aprovação de contas), haja vista que ocupavam, respectivamente, os cargos de Diretor Presidente e Diretor Vice-Presidente da ré Ordene e, por esse motivo, não poderiam aprovar as suas próprias contas, pois é isso o que rezam os arts. 115, § 1o, e 134, § P, da Lei n. 6.404/1976, sendo uníssona a doutrina ao impor como pena a exclusão dos votos dos administradores que aprovaram as suas próprias contas.

De outra mão, no caso em tela, uma vez excluído o voto dos impedidos, restou tão somente o voto lançado pelo autor, recusando a aprovação das contas, que passou a representar 100% do quorum dos acionistas presentes aptos a votar na referida AGO.

Enfim, o autor insistiu que fossem anulados os votos lançados pelos réus, com a consequente anulação da deliberação que aprovou as contas da Ordene, para o fim de declarar reprovadas as contas do exercício findo em 31.12.2008.

Na instrução da exordial, o autor juntou a sua declaração de voto divergente, ou seja, deixou de...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT