A Proteção da Saúde da Criança e do Adolescente e a Proibição da Publicidade de Tabaco nos Pontos de Venda

AutorRenata Domingues Balbino Munhoz Soares
Páginas219-223

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“Nos olhos do jovem, arde a chama. Nos olhos do velho, brilha a luz.” Victor Hugo, 1802-1885

1. Introdução

Nas lições de Oscar Cabrera, Paula Guillen e Juan Carballo, ao citar Armando Peruga, “o tabagismo tem como principal vetor de expansão a indústria do tabaco. As altas taxas de consumo se devem às ações da indústria do tabaco: a persistência de jovens fumantes em todo o mundo não é acidental e é consequência dos esforços da indústria do tabaco para manter um conjunto de consumidores para garantir o futuro da sua empresa”1.

Assim, nesta oportunidade, desenvolveremos em três tópicos um estudo sobre a proteção legal da criança e do adolescente, sob o enfoque do direito à saúde e das restrições à publicidade, consagrados, de um lado, no Estatuto da Criança e do Adolescente, de 1990, e na Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (ratificada pelo Decreto n. 5.658, de 2006), e, de outro lado, na Resolução n. 163 do CONANDA, de 2014, e no Decreto n. 8.262/14, que regulamentou a Lei Federal antifumo n. 12.546/11.

2. O estatuto da criança e do adolescente e a convenção quadro para o controle do tabaco

No Brasil, o Estatuto da Criança e do Adolescente (Lei n. 8.069/90), que completa vinte e cinco anos de existência em 2015, e que tem por objetivo a proteção integral da criança e do adolescente, consagra, no título II, os direitos fundamentais e, em seu capítulo I, o direito à vida e à saúde.

Na ordem internacional, a Convenção Quadro para o Controle do Tabaco (CQCT), primeiro Tratado Internacional de Saúde Pública da Organização

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Mundial da Saúde (OMS), que entrou em vigor em 27 de fevereiro de 2005, e que foi ratificado pelo Brasil em 2006 (tem 178 signatários, incluindo a Comunidade Europeia), tem como objetivo estabelecer um controle global do tabaco na efetivação dos direitos humanos, especialmente o direito fundamental à saúde.

Considerando que o tabagismo é uma doença também pediátrica, e admitindo que há evidências científicas de que a exposição pré-natal à fumaça do tabaco causa condições adversas à saúde das crianças, e que há um elevado aumento do número de fumantes e outras formas de consumo de tabaco entre crianças e adolescentes em todo o mundo, especialmente pelo fato de que se começa a fumar em idades cada vez menores2, a CQCT determina a promoção de medidas de controle do tabaco fundamentadas em considerações científicas, técnicas e econômicas, e dentre elas, a proibição e restrição progressiva de publicidade3.

Seguindo uma das espécies de construção de um tratado, a Convenção Quadro estabelece molduras normativas dirigidas aos Estados, que, por sua vez, segundo os ensinamentos de Maristela Basso, devem “implementar as suas disposições no âmbito interno — por meio de legislação específica (ulterior à sua ratificação), de acordo com os procedimentos constitucionais internos”4.

O art. 16 da CQCT determina que os países signatários devem adotar medidas para proibir a venda de produtos de tabaco aos menores de idade, tais como: exigência de apresentação de prova da maioridade pelo comprador; proibição que os produtos de tabaco à venda estejam diretamente acessíveis aos consumidores, como ocorre em prateleiras de supermercado; proibição da venda de doces, brinquedos ou qualquer outro objeto na forma de produtos de tabaco (quem não se lembra dos cigarrinhos de chocolate da Pan?), proibição de distribuição gratuita de produtos de tabaco; proibição da venda avulsa de cigarros ou em embalagens com poucas unidades, que são mais acessíveis a crianças e adolescentes.

O próprio Estatuto da Criança e do Adolescente proíbe a venda de produtos cujos componentes possam causar dependência física ou psíquica ainda que por utilização indevida a menores de idade como medida protetiva à saúde (art. 81, III), como é o caso dos cigarros. Em 2003, essa proibição encontrou previsão na Lei n. 10.702, que proíbe a venda de quaisquer produtos de tabaco a menores de 18 anos.

Em 2014, o Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda)5, que é o órgão máximo, em âmbito federal, encarregado da formulação, do monitoramento e da avaliação das políticas de promoção, proteção e defesa dos direitos da criança e do adolescente no Brasil, mediante a Resolução n. 163, de 2014, proibiu a veiculação de propagandas voltadas para o público infantil por entender que a publicidade e a comunicação mercadológica dirigidas às crianças violam

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seu direito ao respeito e à condição de pessoa em desenvolvimento.

3. A criança e o adolescente como alvo da publicidade tabagista

Ao tratar da proteção da criança e do adolescente, Cláudia Lima Marques e Bruno Miragem ressaltam os ensinamentos de Eike von Hippel, no sentido de que “a criança é um exemplo de vulnerável, desde o seu nascimento até mesmo durante o seu desenvolvimento necessita de ajuda e cuidados para sobreviver”6.

Não é à toa que existe um grande interesse das companhias em criar estratégias de vendas de produtos voltadas ao público infantojuvenil. Nas estratégias publicitárias da indústria tabagista, o protagonista da história, lugar já ocupado pelas mulheres no século XX, hoje é encenado por jovens e crianças (“vulneráveis em razão da idade”).

Diversos estabelecimentos como bares, restaurantes, lanchonetes e padarias apresentam painéis piscantes e luminosos, em destaque, coloridos e em neon, chamando os consumidores a consumir cigarros light7 e com sabores.

A ciência já comprovou que os aditivos de sabor, como o cravo e o mentol, e substâncias que conferem sabor doce...

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