A proteção jurídica da hipervulnerabilidade do idoso superendividado na sociedade de consumo

AutorFabíola Albuquerque Lobo e Cora Cristina Ramos Barros Costa
Ocupação do AutorDoutora em Direito Civil pela UFPE/Doutoranda, Especialista e Mestre em Direito pelo CCJ/UFPE
Páginas65-95
A PROTEÇÃO JURÍDICA
DA HIPERVULNERABILIDADE DO IDOSO
SUPERENDIVIDADO NA SOCIEDADE
DE CONSUMO
Fabíola Albuquerque Lobo
Doutora em Direito Civil pela UFPE. Professora do Departamento de Direito Privado do
Centro de Ciências Jurídicas da UFPE. Professora dos Cursos de Mestrado e Doutorado
do PPGD/UFPE. E-mail: fsalbuquerque@uol.com.br.
Cora Cristina Ramos Barros Costa
Doutoranda, Especialista e Mestre em Direito pelo CCJ/UFPE. Professora Universitária.
Membro do Grupo de Pesquisa Constitucionalização das Relações Privadas (UFPE,
UFAL, UFPB/CNPq). Assessora Jurídica no Procon Municipal de Jaboatão dos Guara-
rapes/PE. Advogada. E-mail: ccrabarros@gmail.com.
Sumário: 1. Introdução. 2. A tutela constitucional do idoso. 3. Aspectos gerais do superen-
dividamento. 3.1 Características essenciais. 3.2 As consequências do superendividamento.
3.3 O superendividamento no âmbito internacional. 4. Prevenção e tratamento do superen-
dividamento do idoso. 5. Considerações nais. 6. Referências.
1. INTRODUÇÃO
O presente artigo versa sobre tema de grande relevância no mundo jurídico em
virtude das inúmeras modif‌icações ocorridas na sociedade nos últimos séculos, especial-
mente no âmbito consumerista, trazendo a esse cenário a necessidade de novas nuances
interpretativas e protetivas.
As mudanças nas relações jurídicas de consumo exigem um olhar atento do legis-
lador, dos intérpretes e dos aplicadores do Direito para a solução dos casos concretos.
O Código de Defesa do Consumidor – CDC protege o sujeito tendo a vulnerabilidade
como o seu vetor. Ela abarca todos os consumidores, mas alguns a possuem de forma
acentuada, sendo considerados mais frágeis, ou seja, hipervulneráveis. Nesse sentido,
podemos vislumbrar, por exemplo, as crianças, os portadores de doença celíaca e os
idosos. Apesar de reconhecer que a hipervulnerabilidade alcança uma gama de consu-
midores, optamos pelo estudo desta nas situações de superendividamento dos idosos.
É de se considerar que por serem dotados de situação biológica e social mais sensível,
possuem ainda, proteção específ‌ica no Estatuto do Idoso.
A necessidade de um olhar diferenciado para a terceira idade em decorrência da sua
condição especial, com uma vulnerabilidade acentuada, se traduz como indispensável
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na atual conjuntura que o norteia. A sua hipervulnerabilidade se manifesta em diversas
situações, como a dif‌iculdade na interpretação dos contratos, as fraudes, a saúde frágil
e a publicidade enganosa.
Os cuidados necessários para a proteção devem assegurar “todas as oportunidades e
facilidades para a preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral,
intelectual, espiritual e social em condições de liberdade e dignidade”1.
Nese sentido, a ação previne consequências indesejadas, como o superendivida-
mento, que é um fenômeno crescente e traz os idosos como um dos mais atingidos.
O superendividamento se caracteriza pela impossibilidade global do devedor, pessoa
física e de boa-fé, em adimplir com suas dívidas vencidas e vincendas, excluindo-se as
alimentares, as com o f‌isco e as decorrentes de delitos.
A dif‌iculdade do acesso ao crédito deu lugar a um marketing agressivo para que os
idosos contraiam crédito.
A situação de vulnerabilidade agravada destes, por si só, já desperta grande interesse
no mercado consumerista. Mas, aliada à permissão legal de aposentados e pensionistas
em consignar até 35% (trinta e cinco por cento) da sua aposentadoria para pagamento de
empréstimos, f‌inanciamentos, cartões de crédito e operações de arrendamento mercantil
outorgado por instituições f‌inanceiras2, vê-se um cenário ainda mais preocupante. O
que parece demonstrar grande avanço na garantia de direitos, pode trazer, na verdade,
situações graves, como o superendividamento dos idosos.
O objetivo geral do presente estudo é verif‌icar se os instrumentos legais atualmente
em vigor no Brasil possuem força para proteger o idoso superendividado na sociedade
de consumo e reconhecer a sua hipervulnerabilidade.
A metodologia utilizada terá como base o pluralismo metodológico, pois serão
utilizados vários métodos indispensáveis para que possa ser efetuada uma melhor in-
vestigação sobre o tema e para que se chegue a conclusões analiticamente verif‌icáveis.
Tendo em vista tratar-se de pesquisa que utiliza o tripé: doutrina, jurisprudência
e legislação, a modalidade da pesquisa será instrumental. Ao lado disso, mesmo que
constitua o oposto, por envolver interdisciplinaridade no tema proposto, também será
utilizada a modalidade de pesquisa sociojurídica.
2. Art. 1º Os empregados regidos pela Consolidação das Leis do Trabalho – CLT, aprovada pelo Decreto-Lei 5.452,
de 1º de maio de 1943, poderão autorizar, de forma irrevogável e irretratável, o desconto em folha de pagamento
ou na sua remuneração disponível dos valores referentes ao pagamento de empréstimos, f‌inanciamentos, cartões
de crédito e operações de arrendamento mercantil concedidos por instituições f‌inanceiras e sociedades de arren-
damento mercantil, quando previsto nos respectivos contratos.
§ 1º
O desconto mencionado neste artigo também poderá incidir sobre verbas rescisórias devidas pelo empregador, se
assim previsto no respectivo contrato de empréstimo, f‌inanciamento, cartão de crédito ou arrendamento mercantil,
até o limite de 35% (trinta e cinco por cento), sendo 5% (cinco por cento) destinados exclusivamente para:
I – a amortização de despesas contraídas por meio de cartão de crédito;
II – a utilização com a f‌inalidade de saque por meio do cartão de crédito.
§ 2º O regulamento disporá sobre os limites de valor do empréstimo, da prestação consignável para os f‌ins do
caput e do comprometimento das verbas rescisórias para os f‌ins do § 1º deste artigo”.
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