O protesto extrajudicial do termo de ajuste de conduta (TAC) como medida de efetivação dos direitos fundamentais dos trabalhadores

AutorRaimundo Paulo dos Santos Neto
CargoProcurador do Trabalho aprovado em 1º lugar no XVI Concurso para Provimento de Cargos de Procurador do Trabalho
Páginas13-43

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1 - Introdução

Regra geral, as cláusulas mais comuns nos Termos de Ajuste de Conduta (TAC) firmados perante o Ministério Público do Trabalho constituem obrigações de fazer e não fazer, cuja execução, porém, na hipótese de inadimplemento por parte do compromissado, em muitos casos, não enseja a plena satisfação do que restou avençado. E este cenário se revela mais preocupante quando, a par da efetivação das obrigações de fazer/não fazer (cláusulas mais importantes veiculadas no compromisso de ajuste de conduta firmado perante o MPT, haja vista condensarem as medidas de pro-teção aos direitos fundamentais dos trabalhadores), o Parquettrabalhista também pretende obter em juízo a satisfação do dano moral causado à coletividade de trabalhadores prejudicada pelo ato irregular do tomador de serviços e/ou a multa pelo inadimplemento do título.

O presente trabalho visa demonstrar a possibilidade jurídica de protesto do TAC como alternativa extrajudicial à execução do título, haja vista o problema do cumprimento das obrigações avençadas neste compromisso ser comum ao Ministério Público, em especial às Coordenadorias Temáticas criadas no âmbito do Ministério Público do Trabalho, visando à defesa dos direitos fundamentais dos trabalhadores.

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Inicialmente, há de se considerar que a preocupação com a falta de efetividade da execução das obrigações de fazer e não fazer previstas em TAC vem preocupando a doutrina desde longa data, senão vejamos:

"O compromisso de ajustamento de conduta, previsto no parágrafo 5e do art. 6e da Lei n. 7.347/85, vem assumindo um importante papel na tutela dos interesses transindividuais por ser uma solução breve, econômica e justa, tanto porque amplia a tutela jurídica desses importantes direitos, ao dotar de força executiva a solução compromissada, quando porque enseja a participação do interessado na definição dos prazos e condições em que deve se adequar às exigências legais.

Quando o obrigado, sem qualquer justificativa, não atende ao compromisso, a única alternativa que se abre ao órgão público legitimado é a propositura da ação de execução, uma vez que, segundo expressa previsão normativa, o compromisso de ajustamento de conduta é titulo executivo extrajudicial.

Em geral, as cláusulas mais importantes dos compromissos de ajustamento veiculam obrigações de fazer e não fazer, SENDO NOTÓRIA A DIFICULDADE DE A EXECUÇÃO PROCESSUAL ENSEJAR PLENA SATISFAÇÃO DESSE TIPO DE OBRIGAÇÃO.

É de se registrar que tal problema de efetividade do processo executivo é agravado quando se trata da tutela coletiva, por não existirem normas específicas sobre a execução dos títulos judiciais e extrajudiciais de obrigações que interessam a toda a coletividade.

Ao menos a execução da sentença condenatória foi favorecida pela recente minirreforma processual de 2002, que determina a aplicação do art. 461 do Código de Processo Civil, tornando despicienda a ação de execução para obtenção do resultado específico equivalente.

Compreendemos, portanto, que QUALQUER REFLEXÃO SOBRE A EXECUÇÃO DE UM TÍTULO EXECUTIVO EXTRAJUDICIAL CELEBRADO EM FAVOR DA TUTELA DOS DIREITOS DIFUSOS, COLETIVOS OU INDIVIDUAIS HOMOGÊNEOS DEVE PARTIR DA NECESSIDADE DE SE ADOTAR A AÇÃO DE EXECUÇÃO DE MAIOR EFETIVIDADE POSSÍVEL, PARA QUE SE GARANTA O IDEAL DO ACESSO A ORDEM JURÍDICA JUSTA."1 (Destacou-se)

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Ainda que seja dotado de força executiva — o que, aparentemente, elidiria eventuais óbices à efetivação por via judicial das obrigações nele contidas —, o TAC é um título de natureza extrajudicial e isso exerce bastante influência no seu modo de execução.

Isso porque quando o legislador introduziu o TAC no nosso ordenamento jurídico com eficácia de título executivo extrajudicial (Lei n. 8.069/90, art. 211 e Lei n. 7.347/85, art. 5e, § 6e), não havia diferença relevante entre possuir um título judicial ou extrajudicial. Ocorre que, em 1994, quando se iniciaram as reformas processuais civis, tal distinção passou a ser de extrema importância, especialmente diante da criação de procedimentos completamente distintos na forma de executar as obrigações previstas no Código de Processo Civil — CPC. É que, com a vigência das Leis ns. 8.952/ 94, 10.444/2002 e 11.232/2005, a execução das obrigações de fazer, não fazer, entregar coisa e pagar quantia tuteladas por meio dos títulos judiciais passou a contar com medidas que permitem maior celebridade na exigência do cumprimento destas obrigações, principalmente com a dispensa da formação do processo de execução autônomo, autorizando o juiz a aplicar de ofício medidas coercitivas como forma de ver a obrigação cumprida pelo executado, ficando a sistemática da execução por meio do processo de execução autônomo contida no Livro II do CPC apenas para a execução dos títulos extrajudiciais, sendo certo que, apesar da publicação da Lei n. 11.382/2006, trazendo alterações importantes na esfera da execução destes títulos, esta lei não contribuiu muito no avanço da execução das obrigações de interesse coletivo tuteladas pelo TAC.2

Disso decorre que, embora seja um título executivo, o TAC deve se submeter aos mesmos percalços inerentes à execução de qualquer título extrajudicial comum, o que se revela mais gravoso na hipótese da execução do TAC conter alguma pretensão de cunho pecuniário—como a reparação do dano moral causado à coletividade de trabalhadores prejudicados pela conduta ilícita do tomador de serviços — haja vista os trâmites da execução não cumprida voluntariamente pelo devedor (em especial a partir da penhora de seus bens para garantia da execução) desviarem, no mais das vezes, o foco do magistrado condutor do feito, afastando a demanda executiva do seu objetivo principal, qual seja: a efetivação das obrigações de fazer/não fazer (cláusulas mais importantes veiculadas no compromisso de ajuste de

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conduta, pois visam à tutela dos interesses e direitos mais relevantes à sociedade, e, no caso do TAC firmado perante o Ministério Público do Trabalho, à proteção e efetivação dos direitos fundamentais dos trabalhadores).

Daí a necessidade da adoção de meios alternativos à execução da obrigação de pagar prevista em Termo de Ajuste de Conduta perante o MPT, como o protesto extrajudicial do título, que, embora vise à prova da inadimplência do devedor no cumprimento de uma obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida, nos termos do art. 1e da Lei n. 9.494/ 97, pode se revelar uma importante medida preventiva de possíveis inadim-plementos futuros do compromissado em virtude dos efeitos que este ato notarial produz na esfera jurídica do devedor trabalhista, geralmente tomador de serviços dos trabalhadores.

2 - A execução específica de obrigação assumida em TAC como tutela específica na modalidade reintegratória

Ao defender o protesto extrajudicial do TAC, no que concerne às obrigações de pagar, o presente trabalho afirma a aptidão da medida para prevenir indiretamente possíveis inadimplementos futuros do compromissado no que concerne às obrigações de fazer e não fazer, em virtude dos efeitos nocivos que este ato notarial produz na esfera jurídica do devedor. Tal alternativa é indicada porque, culturalmente, ainda temos priorizado a execução judicial do título, que nem sempre é eficaz. Neste contexto, há de se fazer alguns comentários sobre a caracterização da execução específica de obrigação assumida em TAC como sendo uma espécie de tutela específica, na modalidade reintegratória.

A doutrina ensina que são espécies de tutela jurisdicional as seguintes tutelas (DIDIER JR., 2010, p. 408 e ss.): a) urgência e evidência; b) finale antecipada; c) repressiva (reparatória ou sancionatória) e preventiva; d) genérica (pelo equivalente em dinheiro) e específica.

Tutela genérica é a tutela jurisdicional pela qual se dá a quem tem razão um equivalente em dinheiro do que lhe foi tirado.

Tutela específica é a tutela jurisdicional pela qual se dá a quem tem razão exatamente o bem da vida a que ele tem direito. Quando o resultado alcançado pelo processo corresponder exatamente ao resultado previsto pelo direito material, ou seja, corresponder àquilo que seria obtido se não houvesse a necessidade de ir ao Poder Judiciário, diz-se que há tutela específica.

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Com base no art. 12 do Código Civil, a doutrina também divide a tutela específica em três espécies: inibitória, reintegratória e ressarcitória. As tutelas inibitória e reintegratória prescindem da demonstração de dano ou de culpa para a sua concessão, eis que se voltam contra o ilícito, ao contrário da ressarcitória, que se volta contra o dano.

Tutela inibitória é uma tutela dirigida contra o ilícito. Ela visa impedir que o ilícito ocorra. Atua no intuito de obstar, evitar, prevenir a prática do ato contrário ao direito ou, quando antes já praticado, impedir sua reiteração ou continuação. "Tem em vistas atos futuros do sujeito passivo da obrigação...

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