Punitive damages no direito do consumidor brasileiro

AutorPatricie Barricelli Zanon
CargoBacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito das Relações de Consumo pela Pontifícia Universidade Católica PUC-SP
Páginas229-248
PUNITIVE DAMAGES NO DIREITO DO CONSUMIDOR BRASILEIRO
Patricie Barricelli Zanon1
Submetido(submitted): 9 de setembro de 2016
Aceito(accepted): 21 de outubro de 2016
RESUMO
O presente artigo pretende analisar as controvérsias quanto à aplicação da doutrina dos
punitive damages ao Direito do Consumidor no Brasil, a fim de identificar as vantagens e
desvantagens da utilização dessa doutrina no âmbito das relações de consumo brasileiras. O
método aplicado ao trabalho foi a pesquisa bibliográfica de doutrina nacional e internacional
sobre o tema, bem como a análise de casos e jurisprudência. Ao fim da análise, constatou-se
que enquanto parte da doutrina e da jurisprudência enfatiza as vantagens da aplicação do
instituto ao Direito do Consumidor no Brasil, outra destaca elementos que considera uma
ofensa ao sistema jurídico brasileiro. Desta forma, considerando os argumentos de ambos os
entendimentos, o trabalho conclui que a aplicação do instituto ao Direito do Consumidor no
Brasil pode torná-lo mais efetivo, desde que restrito a algumas hipóteses definidas, segundo
determinados critérios e respeitando as particularidades do sistema jurídico brasileiro.
PALAVRAS-CHAVE: indenização punitiva; teoria do desestímulo; Direito do Consumidor.
ABSTRACT
This paper aims to analyze the contentious issues related to the introduction of punitive
damages doctrine to Brazilian consumer law in order to verify if its application would make
consumer protection more effective. The method applied to this paper was the bibliographic
research in national and international doctrines and case law. At the end of the analysis, it was
verified that while part of the scholars and judges highlight the advantages of the institute`s
application in consumer law, others present some questionable elements that they consider a
threat to Brazilian legal system. To sum up, considering the reasons from both positions, the
paper concludes that the institute`s application to Brazilian consumer protection would make
it more effective if it was applied in certain well defined hypothesis, according some
determined criteria and respecting the particularities of Brazilian legal system.
KEYWORDS: punitive damages; deterrence theory; consumer protection law.
A DOUTRINA DOS PUNITIVE DAMAGES
Embora as origens do instituto dos punitive damages remetam à Inglaterra, é inegável
que foi nos Estados Unidos que tal instituto mais se desenvolveu.
O primeiro precedente de aplicação de punitive damages nos Estados Unidos remonta a
1784, no caso Genay v. Norris, em que foi aplicado como punição à má-fé do réu. Contudo,
não estando a doutrina bem delineada na época, o instituto era utilizado muitas vezes de
forma compensatória. Apenas em 1851 seus contornos foram definidos, com a deliberação da
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1 Bacharel em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie. Especialista em Direito das Relações de
Consumo pela Pontifícia Universidade Católica PUCSP.
!
Suprema Corte do país, no sentido de que constituiria princípio estabelecido do Common Law
a imposição pelo júri, em ações de indenização e em todos os casos de responsabilidade civil,
de exemplary, punitive ou vindictive damages, tendo em consideração o grau da ofensa
praticada pelo réu.
Posteriormente, em 1964, com o julgamento do caso Rookes v. Barnard, estabeleceu-se,
com maior precisão, a natureza punitiva dos exemplary damages (ANDRADE, 2009, p. 180).
Segundo a doutrina firmada desde então, tem-se que o instituto dos punitive damages
representa uma espécie de indenização punitiva, isto é, um tipo de indenização de valor
variável que se soma à indenização compensatória, quando o dano advenha de uma conduta
ofensiva baseada em grave negligência, má-fé ou dolo, com o intuito de punir o ofensor e não
apenas de reparar o dano (MORAES, 2007, p. 7).
Nesse diapasão, verifica-se que o instituto dos punitive damages nos Estados Unidos
deve ser estudado no âmbito da Tort Law, isto é, ramo do Direito que estuda a indenização
que visa remediar dano causado por um tort, isto é, um ilícito civil, também como conhecido
como civil wrong (GARNER, 1999, p. 1195).
Note-se que, dentro do ramo da responsabilidade civil norte-americana, uma categoria
em que se destaca a utilização dos punitive damages é a product liability, categoria esta que
integra a proteção do consumidor (GARNER, 1999, p. 982).
Vale observar que a responsabilidade por danos causados ao consumidor, em regra, é
imposta sem o conhecimento sobre a existência de culpa (como negligência ou intenção/dolo),
nos moldes da chamada strict liability, que em muito se assemelha à responsabilidade objetiva
do Direito brasileiro (MERRIAM-WEBSTER, 1996, p. 291).
Neste sentido, verifica-se que, a princípio, segundo o texto do Restatement (Second) of
Torts, parágrafo 908 (1) (1979), o instituto dos punitive damages possui duas finalidades
principais: a punição do ofensor e o desestímulo de práticas semelhantes. Contudo, ressalta-se
a existência de outras funções secundárias, dentre as quais se destaca a proteção do
consumidor contra práticas comerciais fraudulentas ou ofensivas à boa-fé (OLIVEIRA, 2012,
p. 32).
Imperioso ressaltar que a doutrina dos punitive damages norte-americana é parte
integrante de um sistema jurídico conhecido como Common Law (Direito Costumeiro), o qual
tem como fundamento a regra do Stare Decisis, também conhecida como Doctrine of
Precedents (Regra dos Precedentes). A referida regra determina que o precedente, isto é, uma
única ou várias decisões de uma appelate court, órgão coletivo de segundo grau, obriga

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