Qual a postura normativa que o aplicador do direito não deve ter?

AutorMatheus Vinícius Aguiar Rodrigues
CargoGraduando em Direito pela Universidade de Brasília - UnB
Páginas347-370
!
!
347
QUAL A POSTURA NORMATIVA QUE O APLICADOR DO DIREITO NÃO DEVE
TER?
WHAT IS THE NORMATIVE PERSPECTIVE THAT A JUDGE MUSTN’T HAVE?
Matheus Vinícius Aguiar Rodrigues1
RESUMO
A partir da análise da recente decisão que versa sobre o aborto, esse trabalho busca inquirir a
postura normativa que o aplicador do Direito deve apresentar, sobretudo, diante dessa
discussão. Não se trata, então, de analisar o aborto sob a perspectiva de uma política
judiciária. Valendo-se da sociologia luhmanianna, a autonomia do Direito e a diferenciação
funcional entre os sistemas necessitam de um compromisso teórico e epistêmico do aplicador
do Direito, sobretudo diante de uma sociedade hipercomplexa e multicêntrica. O voto-vista do
Min. Barroso (HC nº 124.306/RJ, Primeira Turma, DJe 17/3/2017) representa uma postura
inconsistente (juridicamente), que conduz a respostas jurídicas injustas. Pretende-se
questionar a postura normativa do Min. Barroso, nesse voto em específico, a partir de uma
inadequação metodológica e do seu realismo jurídico.
PALAVRAS-CHAVE: Teoria dos Sistemas; Justiça; Norma Jurídica; Aborto.
ABSTRACT
From the analysis of the recent decision on abortion, this work seeks to inquire a normative
posture that the judge must present, above all, in the face of this discussion. It is not a
question of analyzing abortion from the perspective of a judicial policy. Using Luhmann’s
sociology, the autonomy of law and the difference of functionality between systems require a
theoretical and epistemic commitment of the judge, especially in the face of a highly complex
and multicultural society. Minister Barroso's vote-view (HC nº 124.306/RJ, First Panel, DJe
3/17/2017) represents an inconsistent juridical position, which leads to unjust legal issues. It
is intended to question Min. Barroso’s normative position, in this specific vote, based on a
methodological inadequacy and its legal realism.
KEY-WORDS: Systems Theory; Justice; Juridical norm; Abortion.
!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!!
1 Graduando em Direito pela Universidade de Brasília UnB.
!
!
348
INTRODUÇÃO
Este trabalho se propõe a discutir o aborto, enquanto fato social e jurídico, para se
inquirir a postura normativa que o aplicador do Direito não deve apresentar. Com enfoque no
subsistema da Religião e da Política, não se propõe aqui analisar sobre o que Kelsen chamaria
de política judiciária (ou seja, a luta pela aplicação correta de direitos ou o reconhecimento
por mais direitos). Não se trata de defender ou não a legalização/descriminalização do aborto.
Iremos propor um debate que irá discutir Teoria do Direito. Isso requer compromissos
teóricos e, principalmente, epistêmicos, tanto do aplicador do Direito quanto do jurista que se
propõe estudá-lo.
Isto posto, abordaremos o aborto como fato social, indicando um instrumento teórico
que julgamos mais adequado para ilustrá-lo, para, em seguida, observar a comunicação que
ele vem suscitando no sistema do Direito. Na análise do aborto, enquanto fato jurídico, a
discussão abre o Direito a considerações filosóficas (cognição aberta), a partir de uma análise
acerca das normas jurídicas e o discurso de Justiça que emerge nesse tema.
1 SOCIOLOGIA LUHMANIANA: INSTRUMENTO TEÓRICO ADEQUADO PARA
SE DESCREVER O ABORTO ENQUANTO FATO SOCIAL E JURÍDICO
A temática do aborto está inserida na tensão entre os sistemas sociais (sobretudo, entre o
Direito, a Política e a Religião). Neste capítulo, busca-se, concomitantemente, explicar
conceitos fundamentais de Niklas Luhmann e defendê-lo como o marco teórico que,
satisfatoriamente, concebe essa tensão. Aborda-se, então, o 1) mérito descritivo como
Luhmann narra as interrelações sistêmicas, bem como 2) o rompimento com uma Teoria do
Direito que se funda e tenha como “pano de fundo” a teoria weberiana da ação social.
A teoria dos sistemas sociais se vale da ideia de código binário para teorizar sistemas
sociais como células (empreendimentos fechados, que se relacionam com os demais sistemas
e o ambiente externo). Trata-se de uma espécie de realismo complexo, que propõe sistemas
diferenciados funcionalmente, ou seja, sistemas que se desenvolveriam, operativamente, de
forma fechada, a partir de uma reprodução autopoiética.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT