A questão disciplinar e a execução penal

AutorMauricio Kuehne
CargoProfessor emérito do centro universitário Curitiba
Páginas230-234
PRÁTIcA FORENSE
230 REVISTA BONIJURIS I ANO 31 I EDIÇÃO 661 I DEZ19/JAN20
Mauricio Kuehne PROFESSOR EMÉRITO DO CENTRO UNIVERSITÁRIO CURITIBA
A QUESTÃO DISCIPLINAR
E A EXECUÇÃO PENAL
Estabelece o artigo 47 da Lei de Execu-
ção Penal (Lei 7.210/84) que o poder
disciplinar, na execução da pena pri-
vativa de liberdade, será exercido pela
autoridade administrativa conforme
as disposições regulamentares. A questão é
imperativa. Entretanto, veremos adiante que
os entendimentos são díspares.
Várias situações já foram enfrentadas pelos
tribunais, sendo que, em recente decisão, o Su-
premo Tribunal Federal, tendo como relator o
ministro Roberto Barroso, entendeu o seguinte:
Execução Penal. Recurso Extraordinário. Prática
de falta grave. Prévio procedimento administrati-
vo disciplinar. Desnecessidade. Repercussão geral
reconhecida. 1. Nos termos das recentes decisões
proferidas pelo Supremo Tribunal Federal, a oitiva
do condenado pelo Juízo da Execução Penal, em
audiência de justificação realizada na presença do
defensor e do Ministério Público, afasta a necessida-
de de prévio Procedimento Administrativo Discipli-
nar (PAD), assim como supre eventual ausência ou
insuficiência de defesa técnica no PAD instaurado
para apurar a prática de falta grave durante o cum-
primento da pena. 2. Assim sendo, a apuração da
prática de falta grave perante o juízo da Execução
Penal é compatível com os princípios do contradi-
tório e da ampla defesa (art. 5º, LIV e LV, da CF).
3. Reconhecimento da repercussão geral da questão
constitucional suscitada (RE 972.598 RG, Relator (a):
Min. Roberto Barroso, julgado em 06.04.2017, Pro-
cesso eletrônico DJe-227 divulg. 03.10.2017 public.
04.10.2017).
Ousamos, com a devida vênia, discordar do
entendimento manifestado, e aguarda-se que
o  reconheça a imprescindibilidade do pro-
cedimento administrativo disciplinar ().
Muito embora o mencionado artigo 47 diga
que o poder disciplinar será exercido pela au-
toridade administrativa, não há como se ex-
cluir da apreciação do Poder Judiciário qual-
quer ato que exorbite as atribuições legais.
Não é porque o artigo excepciona o princípio
da jurisdicionalização que o poder seja abso-
luto. Veja-se o que dispõe o artigo 5º, , da
: “A lei não excluirá da apreciação do Poder
Judiciário lesão ou ameaça a direito”.
Precisa é a lição de Renato Flávio Marcão1:
A decisão proferida nos autos do procedimento
para apuração de falta grave deve ser motivada, e
a Lei de Execução Penal não estabelece a possibi-
lidade de recurso, visando submetê-la a apreciação
do juiz da execução ou qualquer outro órgão [...]
Não obstante a ausência de previsão expressa na
lei sobre a possibilidade de recurso das decisões
proferidas pelo diretor do estabelecimento ou pelo
conse1ho disciplinar, é possível a interposição de re-
curso eventualmente previsto na legislação local ou
nos regulamentos dos presídios. Mesmo na ausên-
cia de previsão expressa na legislação local ou nos
regulamentos presidiários, é perfeitamente cabível,
em muitos casos, a utilização dos remédios constitu-
cionais, notadamente o habeas corpus e o mandado
de segurança.
As faltas disciplinares estão previstas na
Lei de Execução Penal (faltas graves) e, no que
atine às faltas médias e leves, assim como ou-
tras normas disciplinares, devem elas constar
de disposições regulamentares de competên-
cia dos estados. O poder não é arbitrário, mas
sim discricionário, sujeito ao que estabelece a
ordem normativa em termos de lei federal ou
estadual.
Rev-Bonijuris_661.indb 230 14/11/2019 17:45:38

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