Livre-comércio: que contexto político?. Aspectos históricos das dificuldades dos países em desenvolvimento ou em transição, no acesso a mercados

AutorMaurin Almeida Falcão
Páginas349-359

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Maurin Almeida Falcão. Doutor em Direito Tributário Internacional pela Universidade de Paris-XI-Sud. Professor do Programa de Mestrado em Direito do UNICEUB, área das Relações Internacionais. mestrado.revista@uniceub.br

Introdução

As dificuldades atuais dos países em desenvolvimento ou em transição, no acesso aos mercados dos principais atores do comércio internacional têm as suas origens em períodos anteriores à instauração dos acordos do General Agreement on Tariffs and Trade-GATT, ocorrida em 1947. Ao analisarmos o percurso histórico do multilateralismo, deparamo-nos com a primazia do que se convencionou chamar de tríade do comércio internacional: Estados Unidos e Canadá, União Européia e Japão. A análise isolada da construção da nova ordem mundial, a partir das ações empreendidas no pós-guerra, não nos permitiria compreender todo o alcance das estratégias delineadas naquele período. Com efeito, a vasta literatura sobre a gênese do multilateralismo tem privilegiado, principalmente, o período iniciado em 1945. Contudo, para uma melhor compreensão do fenômeno do livre-comércio, tal como conhecemos nos dias de hoje, seria preciso que recuássemos até o Século XIX. A notável influência política do Concerto Europeu(1815-1871) concedeu às nações daquele continente quase um século de predomínio sobre o comércio internacional.

Findo aquele período, a cena internacional passa a conhecer a emergência de um novo ator: os Estados Unidos da América. As diversas transformações pelas quais passou o comércio internacional no final do Século XIX, aliadas às lições do período entre-guerras, são os responsáveis pela atual configuração do multilateralismo. Este último seria marcada por diversas iniciativas americanas com vistas à implementação de uma maior abertura comercial por parte dos seus parceiros comerciais. Como pano de fundo a essas proposições, temos a grave crise econômica mundial iniciada em 1929. A depressão dos anos trinta decorreu, principalmente, da crise dos meios de pagamento e da redução da produção industrial, o que repercutiu para a retomada do protecionismo. O panorama sombrio que se delineava contribuiu para o surgimento dos egoísmos nacionais com graves conseqüências sobre o precário sistema de livre-comércio existente até então.

A estratégia econômico-política lançada a partir de 1945 não buscou, apenas, consolidar a hegemonia nascida no fim do Século XIX mas também reafirmar a posição dos EUA como potência vencedora do conflito. O fracasso de criação da Organização Internacional do Comércio iniciaria um novo ciclo de tensões no comércioPage 352 mundial. Porém, esse revés contribuiu para o lançamento das bases da Conferência das Nações Unidas para o Comércio e o Desenvolvimento-UNCTAD, embrião do Sistema Geral de Preferências-SGP, com se verificaria a partir dos anos sessenta. Contudo, a iniciativa americana contribuiria para o surgimento dos “Trintas Gloriosos” que representaram para a tríade do comércio internacional, entre 1945-1975, uma fase de notável crescimento econômico. Além disso, deslocou eixo tradicional do comércio mundial do Oceano Atlântico para o Oceano Pacífico.

O fim deste ciclo virtuoso e o declínio da participação dos EUA no comércio internacional levariam este a propor os “Novos Temas”, com o intuito de recuperar o terreno perdido. A proposta contemplava as discussões acerca dos investimentos, da propriedade intelectual e dos serviços. Essa era a estratégia americana para fazer face às transformações impostas pela crise dos anos setenta após o esplêndido período de progresso dos países industrializados ocorrido após o conflito mundial.

Como destacado anteriormente, a análise da lógica do comércio internacional somente a partir das negociações do pós-guerra, nos traria uma visão parcial e distorcida das verdadeiras razões do protecionismo exacerbado dos países ricos. O tema exigiria, talvez, uma análise profunda de temas relacionados com a economia política e com as teorias do comércio internacional. Entretanto, os objetivos do presente desenvolvimento são modestos e estão circunscritos a fatos pontuais. Assim, nos propomos a descrever as variáveis econômicas e políticas responsáveis pelas agruras dos países em desenvolvimento no comércio internacional, que consideramos como úteis à compreensão do tema.

Por isso, apresentaremos em um primeiro momento, o período que antecedeu às propostas de desenvolvimento do comércio internacional anunciadas na Carta de Havana, em 1947. Em conseqüência, delimitaremos esse período à...

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