Recuperação dos créditos tributários pela fazenda pública: a quebra do paradigma da judicialização e os novos rumos para a implementação de métodos de cobrança e de fiscalização mais eficientes

AutorArtur Barbosa da Silveira
Páginas1105-1138
1089
RECUPERAÇÃO DOS CRÉDITOS TRIBUTÁRIOS PELA
FAZENDA PÚBLICA: A QUEBRA DO PARADIGMA
DA JUDICIALIZAÇÃO E OS NOVOS RUMOS PARA A
IMPLEMENTAÇÃO DE MÉTODOS DE COBRANÇA E DE
FISCALIZAÇÃO MAIS EFICIENTES
Artur Barbosa da Silveira1
Introdução
A desjudicialização pode ser conceituada como faculdade
conferida às partes de comporem seus conflitos fora do âmbito do
Poder Judiciário, por meio de ferramentas alternativas extrajudi-
ciais, permitindo que a solução das controvérsias possa ser defini-
da pelas próprias partes ou por intermédio de árbitro ou mediador.
Atualmente, o processo de execução fiscal no Brasil se
desenvolve, exclusivamente, pela via do Poder Judiciário e,
1. Procurador do Estado de São Paulo. Juiz eleito do Tribunal de Impostos e Taxas do
Estado de São Paulo (2018/2019). Ex-Advogado da União. Ex-Assessor de Ministro do
Superior Tribunal de Justiça. Mestrando em Direito Constitucional pela Universida-
de Nove de Julho. Especialista em Direito Constitucional e Administrativo pela EPD
– Escola Paulista de Direito, em Direito Tributário pela Universidade Estácio de Sá e
em Direito Processual Civil pelo Centro Universitário Metropolitano de São Paulo.
Presidente da Comissão de Direito Tributário da OAB São Paulo – Subseção Penha
de França. Palestrante, autor de livros e de artigos jurídicos. absilveira@sp.gov.br.
Graduado em Direito pela Universidade Presbiteriana Mackenzie de São Paulo.
1090
MÉTODOS ALTERNATIVOS DE COBRANÇA DO CRÉDITO TRIBUTÁRIO
embora a revolução dos meios tecnológicos tenha contribuí-
do para a melhoria do sistema - especialmente em razão do
advento do processo judicial eletrônico e da inteligência ar-
tificial -, referidas novidades não são suficientes para afastar
a premente necessidade de desjudicialização das execuções
fiscais, contribuindo para a eficiência na gestão tributária.
Entretanto, em substituição ao sistema judiciário, são
necessários métodos alternativos para a cobrança da dívida
ativa tributária que tragam mais efetividade, eficiência e ce-
leridade ao sistema, garantindo, ao mesmo tempo, o respeito
aos direitos fundamentais dos contribuintes.
A importância do tema é manifesta, uma vez que, à luz do
direito comparado, constata-se que a imensa maioria das na-
ções desenvolvidas ou em desenvolvimento não se utiliza do
Poder Judiciário para subsidiar a cobrança de tributos pelo
Estado, ou seja, a judicialização da execução fiscal é exceção
no mundo globalizado.
Desse modo, no presente trabalho, elaborado a partir de
pesquisas doutrinárias, jurisprudenciais e da análise de diver-
sos diplomas legais, estudaremos o fenômeno da desjudicia-
lização no âmbito do direito tributário brasileiro, com breve
referência ao direito comparado, bem como traremos um pa-
norama atual sobre a dívida tributária no Brasil, abordando a
possibilidade de adoção dos métodos alternativos de solução de
controvérsias no âmbito tributário, e traçando, por fim, as no-
vas estratégias de cobrança e recuperação de créditos tributá-
rios utilizadas pelo fisco federal e estadual, com a finalidade de
implementar um sistema de arrecadação mais justo e eficiente.
1. O sistema arrecadatório de tributos no brasil
1.1 História e evolução da execução fiscal no direito
comparado
O direito à tributação e à execução dos créditos estatais
contra os contribuintes inadimplentes existe desde os
1091
NOVOS RUMOS DO PROCESSO TRIBUTÁRIO:
Judicial, Administrativo e Métodos Alternativos de Cobrança do Crédito Tributário
primórdios da humanidade, tendo marcado presença em na-
ções na Idade Antiga, como Egito, Grécia e Roma, que poste-
riormente constituíram Impérios milenares.
Desde aproximadamente o ano de 1500 a.C., o Estado
passou a taxar os seus habitantes (cidadãos ou não), sob as
justificativas da manutenção da máquina pública e da defesa
do bem comum.
No caso do Império Romano, a execução fiscal era pes-
soal e competia aos “coletores de impostos” ou “publicanos”,
que tributavam quaisquer indivíduos que se submetessem
aos domínios daquele Império, independentemente do tipo
de atividade desenvolvida.
Aliás, para o Estado, o dinheiro nunca teve “cheiro”: a
clássica lição de BALLEIRO2 lembra que a expressão “pecú-
nia non olet” surgiu a partir do diálogo entre o Imperador Ves-
pasiano e seu filho Tito. Em certo momento, o filho indagou
ao pai sobre a razão pela qual esse decidiu tributar os usuá-
rios de banheiros públicos na Roma Antiga. Vespasiano, em
resposta a Tito, justificou a incidência do tributo sob o argu-
mento de que o dinheiro não tem cheiro, não importando para
o Estado a fonte de que provenha.
Em decorrência da evolução da sociedade e do surgimen-
to das gerações de direitos fundamentais ao longo dos séculos,
a execução fiscal se tornou parte da ciência do Direito, sendo
incorporada aos diplomas legais de diversos países.
Na maior parte das nações desenvolvidas ou em desen-
volvimento, o processo de execução fiscal, desde a sua origem,
nunca movimentou a máquina judiciária, resolvendo-se intei-
ramente no âmbito administrativo, e tal prática permanece
até os dias atuais.
Na França, por exemplo, o processo de execução fiscal é intei-
ramente administrativo, conforme previsão no “Livre de Procedure
2. BALEEIRO, Aliomar. Direito tributário brasileiro (atualizado por Misabel Abreu
Machado Derzi). 11ª ed. Rio de Janeiro: Forense, 2007, p. 714.

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT