Reflexões epistêmicas sobre o testemunho das pessoas dispensadas de depor no processo penal brasileiro / Epistemic reflections on privileged witness testimony in brazilian criminal procedure

AutorFlávio Mirza Maduro, Diogo Rudge Malan
CargoPós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra, Professor da UERJ e da UCP. Universidade do Estado do Rio de Janeiro ? UERJ ? Brasil. ORCID Id: https://orcid.org/0000- 0002-7637-3087 Lattes: http://lattes.cnpq.br/4526253051246397 E-mail: flaviomirza@mirzamalan.com.br - Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela ...
Páginas2486-2503
Revista de Direito da Cidade
vol. 12,4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2020.57101
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Revista de Direito da Cidade, vol. 12,4. ISSN 2317-7721. pp.2486-2503
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REFLEXÕES EPISTÊMICAS SOBRE O TESTEMUNHO DAS PESSOAS DISPENSADAS DE DEPOR NO
PROCESSO PENAL BRASILEIRO
EPISTEMIC REFLECTIONS ON PRIVILEGED WITNESS TESTIMONY IN BRAZILIAN CRIMINAL
PROCEDURE
Flávio Mirza Maduro1
Diogo Rudge Malan2
RESUMO
O presente artigo busca estudar, sob o prisma epistemológico, a pertinência d a parte final do artigo
206, do Código de Processo Penal, haja vista que, após assinalar o dever de testemunhar, dispensa
pessoas que poss uam laços consanguíneos com o acusado de fazê-lo. Adiante, entretanto, finda por
impor-lhes o testemunho, quando necessário. O trabalho estrutura-se na busca da verdade, por meio
das provas, notadamente a testemunhal, pois no processo penal se reconstrói um acontecimento
pretérito, com relevância penal, a fim de que se chegue à culpa ou inocência do acusado. Assim,
discute-se a pertinência da parte final do sobredito artigo legal para tal finalidade.
Palavras-chave: testemunho verdade prova processo penal
ABSTRACT
This article aims to study, from an epistemological point of view, the relevance of the final part of
article 206 of the Brazilian Criminal Procedure Code, given that, after pointing out the duty to testify,
it allows people who have blood ties with the accused to r efuse to testify. Further on, however, it
imposes their testimony when necessary. This article is structured in the search for truth through
evidence, notably testimonial, because in the criminal process a past event, with penal relevance, is
1 Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra, Professor da UERJ e
da UCP. Universidade do Estado do Rio de Janeiro UERJ Brasil. ORCID Id: https ://orcid.org/0000-
0002-7637-3087 Lattes: http://lattes.cnpq.br/4526253051246397 E-mail:
flaviomirza@mirzamalan.com.br
2 Pós-Doutor em Democracia e Direitos Humanos pela Universidade de Coimbra, Professor da UERJ e
da FND/UFRJ. Universidade do Estado do Ri o de Janeiro UERJ Brasil. ORCID Id:
https://orcid.org/0000-0001-7125-9894 Lattes: http://lattes.cnpq.br/6488880217689313 E-mail:
diogomalan@mirzamalan.com.br
Revista de Direito da Cidade
vol. 12,4. ISSN 2317-7721
DOI: 10.12957/rdc.2020.57101
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Revista de Direito da Cidade, vol. 12,4. ISSN 2317-7721. pp.2486-2503
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reconstructed in order to arrive at the guilt or innocence of the accused. Thus, the relevance of th e
final part of the article above is discussed for this purpose.
Keywords: testimony truth evidence criminal procedure
INTRODUÇÃO E DELIMITAÇÃO DO TEMA
O processo penal é o instrumento civilizado destinado à apuração de um delito, f ato típico,
antijurídico e culpável, imputado ao réu.3 Tal se faz por meio das provas que levarão à conclus ão pela
culpa ou inocência. E, a prova testemunhal é um dos meios de prova postos à disposição do julgador
com vistas a se desincumbir do hercúleo mister que é julgar.4
Nas linhas abaixo, nossa mirada estará nela (a prova testemunhal), mais precisamente na parte
final do artigo 206 do Código de Processo Penal.
Com efeito, a prova testemunhal foi, historicamente, objeto de desconfianças, mas sempre
esteve presente em diversos tipos de procedimentos, em todos os tempos e povos , ao longo da
história.5 6
Nessa toada, o supramencionado artigo 206, do vetusto Código de Processo Penal, sempre nos
causou estranhamento, haja vista desobrigar o depoimento de certo grupo de pessoas, que poss uem
laços consanguíneos e/ou maritais com o acusado e, ao depois, afirmar que deveriam falar quando
“(...) não for possível, por o utro modo, obter-se ou i ntegrar-se a prova do fato e de suas
circunstâncias.”.
Tais são as pessoas dispensadas de depor que, quando o fazem, são denominadas informantes.
Em tais situações, a doutrina oscila sobre o cometimento (ou não) do crime de falso testemunho pelo
informante.7
3 Tal definição, ainda franciscana, será melhor detalhada em tópico próprio (item 2.3).
4 Como bem escreveu Carnelutti: “Nenhum homem, se pensasse no que é necessário para julgar outro homem,
aceitaria ser juiz.” Cf. CARNELUTTI, Francesco. As misérias do processo penal, tradução de Carlos Eduar do
Trevelin Millan, 3ª tiragem, São Paulo: Editora Pillares, 2009, p. 45.
5 Cf. TORNAGHI, Hélio. Instituições de processo penal, volume IV. Rio de Janeiro: Forense, 1959, p. 460.
6 À guisa de exemplo, é de se ver a explanação de Rogério Lauria Tucci, ao tratar do processo penal romano, de
cariz, eminentemente, acusatório, quando dos instantes finais da República, perante a quaestio. Com efeito, ao
tratar da instrução, ressalta o professor das Arcadas que as provas eram de três espécies, a saber, per tabulas, per
testes e per quaestiones. A segunda, seria a prova testemunhal. Cf. TUCCI, Rogério Lauria. Lineamentos do
processo penal romano. São Paulo: Bushatsky, 1976, p. 153-154.
7 Posto que sem previsão legal, consagrou-se a denominação informante, para designar o indivíduo que depõe sem
prestar compromisso.

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