Reforma Trabalhista: o Futuro do Trabalho, do Direito do Trabalho e da Justiça do Trabalho

AutorGeorgenor de Sousa Franco Filho
Páginas9-15

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1. Origens do futuro

O que é futuro? Passado? Presente? Tenho perguntado a mim mesmo se existem diferenças entre essas situações. Conclui que o passado é infinito, que o futuro é o presente, e que o presente não existe.

Explico: no momento em que falamos no presente, ele, que antes era futuro, imediatamente passou a ser passado. Logo, o presente é apenas a menor parte de um milésimo de segundo, que apenas serve de comunicação entre o que foi (o passado) e o que será (o futuro). Não sabemos o começo do passado, como não sabemos o final do futuro. Sabemos o que é o passado, mas apenas podemos supor o que será o futuro. Podemos presumir sobre o que vem, e afirmar sobre o que foi. Num mesmo instante, vivemos a transposição do futuro em passado: este instante é o presente.

Por isso, escolhido esse tema sobre a reforma trabalhista, cuido do sentido do futuro, do que vem agora, para tentar alinhavar pontos e identificar a possível capacidade de transição que temos nesses instantes de profundas alterações.

Em 1943, quando foi aprovada a Consolidação das Leis do Trabalho (CLT), foram reunidos os diversos textos legais esparsos que existiam no Brasil. A comissão responsável garimpou a legislação que estava vigendo e a sistematizou de modo a facilitar seu entendimento e sua aplicação pela sociedade.

Logo começaram a surgir mudanças e não demorou para termos, como temos ainda hoje, uma fartíssima legislação trabalhista extravagante que se confunde com a CLT e, pior, confunde quem quer aplicar a CLT.

É costume ser dito que a CLT é anacrônica, superada, em descompasso com os tempos modernos, uma colcha de retalhos sem rumo, e que o que está nela precisa ser revisto.

Diziam que a CLT era uma cópia da Carta del Lavoro da Itália, porque é um documento corporativista. Uma falácia. Pelo menos em tamanho a CLT está na frente: tem, na sua origem, 910 artigos. O diploma italiano possui apenas trinta artigos (menos de 4% da CLT).

De uns tempos para cá, muita coisa mudou nas relações trabalhistas. A modernização dos meios de produção, a facilidade da comunicação, a melhor formação profissional trouxeram profundas alterações na vida do trabalho, mas a legislação reguladora permaneceu inerte e acabou apresentando sinais de superação.

Diversas tentativas de mudança legislativa foram feitas. Todas foram infrutíferas. Nada deu certo porque acredito que tenha faltado coragem parlamentar e discussões estéreis que não levaram a nada.

Em 2008, quando presidente da Academia Brasileira de Direito do Trabalho, designei comissão presidida por Amauri Mascaro Nascimento e composta por Nelson Mannrich e Luiz Carlos Amorim Robortella, que elaborou um alentado anteprojeto de Lei de Relações Individuais do Trabalho. Igualmente não deu resultado e não passou de mais um documento para discussões em nível acadêmico.

Quando assumiu o atual Governo, em um crescente maremoto, que a globalização transformou em tsunâmi, de crise, um projeto minúsculo, o Projeto de Lei n. 6.787, de 2016, foi encaminhado pela Mensagem

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n. 688/2016 ao Congresso Nacional. Basicamente propunha alterar regras sobre multas administrativas, trabalho a tempo parcial, representação de trabalhadores nas empresas, supremacia das normas negociadas sobre a legislação em exatos treze itens, e critérios para contagem de prazos, além de mudanças na lei do trabalho temporário.

Dos debates no Parlamento, o Projeto de Lei n. 6.787/2016 passou a ser o Projeto de Lei n. 38/2017, no Senado, e, o que era nanico, transformou-se em um mastodonte, e, agora, é o que vale: transformou-se na Lei n. 13.467, de 13 de junho de 2017. E pronto. E basta. Basta, mas só começará a vigorar em novembro de 2017.

Muita coisa foi mudada. Bem mudadas algumas. Mal mudadas outras. Caberá aos interlocutores sociais, os ajustes e, sobretudo, à Justiça do Trabalho corrigir os erros para não violar mais ainda os princípios que, arduamente, foram conquistados pela sociedade e que informam o Direito do Trabalho, sem descurar, todavia, a necessidade de alinhar o Brasil com o resto do mundo dito civilizado.

Em pinceladas, esta é a origem do futuro de tudo que envolve o trabalho em nosso país. É diante dele, do futuro, que nos encontramos. Então, vejamos o que ele nos reserva.

2. Futuro do trabalho

Temos muitas coisas a considerar a partir de agora, e ainda é cedo para admitir que tudo está absorvido pela doutrina, pela jurisprudência e, sobretudo, pela sociedade. Acredito que os debates estão apenas iniciando.

Nesse embrionário debate, imagino que devamos lançar uma visão prospectiva sobre o possível futuro do trabalho. Não se fala mais no trabalho subordinado nos modelos do século XX (Taylorismo, Fordismo, Toyotismo, Volvismo, Gatismo etc.). Devemos cogitar do trabalho para o restante do século XXI e para os séculos que hão de vir.

Em maio deste ano, o jurista João Lima Teixeira Filho enviou-me um e-mail falando sobre novos e velhos empregos. Dizia: Não é o mais forte e não é o mais inteligente que irá sobreviver no mercado. Mas sim, quem se adaptar mais rápido as grandes mudanças no mercado. E, a partir daí demonstrava quatorze momentos dessas mudanças: o MP3 faliu as gravadoras. O Netflix faliu as locadoras. O Booking complicou as agências de turismo. O Google faliu a

Listel – Páginas Amarelas e as enciclopédias. O Airbnb está complicando os hotéis. O WhatsApp está complicando as operadoras de telefonia. As mídias sociais estão complicando os veículos de comunicação. O Uber está complicando os taxistas. A OLX acabou com os classificados de jornal.O celular acabou com as revelações fotográficas e com as câmeras amadoras. O Zip Car está complicando as locadoras de veículos. A Tesla está complicando a vida das montadoras de automóveis. O e-mail e a má gestão complicaram os correios. O Marketing de Rede mudou a forma de comércio. O mundo evoluiu, e com ele também a maneira de se viver e ganhar dinheiro... Quanto mais atrasada a nossa visão, mais caro pagaremos por isso. Antecipe-se.

Este é um alerta temeroso. Lamentavelmente, não é possível aprofundar estudos a esse respeito, neste momento. Afinal, a bola de cristal da doutrina não permite, ainda, posições conclusivas e fechadas. Porém, precisamos considerar que as alterações tecnológicas mudaram a forma de trabalhar. Existe o teletrabalho, que, bem ou mal, as novas regras pretendem regular. Haverá, nesse aspecto, que serem procedidos a ajustes que, no entanto, irão surgir a partir das dificuldades da implementação de alguns comandos legais.

Temos a Educação a Distância (EAD), que é uma forma nova e diferente de ensinagem e diferente de aprendizado. E o professor, que é trabalhador, vai viver um modo diverso de convivência com o alunado.

Existem trabalhos que teremos que nos adaptar: trabalho intermitente, entre outros, que pode representar formas de precarização do trabalho humano. Na mesma linha, a terceirização, a quarteirização e a pejotização, que, lamentavelmente, acabarão sendo acolhidas e adotadas na sua plenitude.

Olhando este novo mundo nos deparamos com três palavras que caíram no gosto (ou desgosto) popular. Bauman dizia sobre duas delas: flexibilização é o nome politicamente correto da frouxidão de caráter1, e desregulamentação é a palavra da hora e o princípio estratégico louvado e praticamente exibido pelos detentores do poder2.

A terceira é precarização que parece ser o destino do futuro do trabalho humano, fruto do desemprego estrutural, da oferta de mão-de-obra crescente em contra passo com a redução dos postos de trabalho, da ampliação do mercado informal, do subemprego e do desemprego.

Nesse meio de tanto dissabor, surgem os empregos verdes, que podem ser, pelo menos, uma forma de salvar o planeta da sua autodestruição.

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Ademais, poderão as empresas (grandes, médias, pequenas, micro, individuais) sobreviver sem trabalhadores? E devem ser todos os trabalhadores considerados subordinados, e, portanto, empregados?

Precisamos repensar esses temas. Olhar para além das nossas fronteiras geográficas e acompanhar...

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