A regra-matriz de incidência tributária e o seu critério temporal

AutorCristiane Pires
Páginas139-188
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CAPÍTULO IV
A REGRA-MATRIZ DE INCIDÊNCIA
TRIBUTÁRIA E O SEU CRITÉRIO TEMPORAL
Altera-se o mundo físico mediante o trabalho e a tecnologia, que o
potencia em resultados. E altera-se o mundo social mediante a lin-
guagem das normas, uma classe da qual é a linguagem das normas
do Direito.
Lourival Vilanova216
4.1 Considerações iniciais do capítulo
Após perscrutarmos as bases de nosso sistema com foco
no que ela pode importar para a fixação do tempo dos tribu-
tos, passemos ao exame da matéria-prima para o exercício im-
positivo dos entes políticos. O presente capítulo se propõe, as-
sim, a esquadrinhar a regra-matriz de incidência tributária e
a relação entre seus elementos, a fim de promover uma análi-
se global do esquema em que se encontra o critério temporal.
Para tanto, parte-se da investigação das normas jurídicas em
seu sentido amplo e no seu sentido estrito como instrumento
básico de operacionalidade do Direito.
216. VILANOVA, Lourival. As estruturas lógicas e o sistema de direito positivo. 4. ed.
São Paulo: Noeses, 2010, p. 4.
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CRISTIANE PIRES
Com isso, passaremos a examinar os elementos que a
compõem, com fito de localizar e recortar o seu critério tem-
poral e poder expor as suas características e funções dentro
da norma matriz tributária, sempre com atenção aos limites
constitucionais tratados no capítulo precedente.
Por fim, esquadrinharemos sua relação com os demais
elementos da regra-matriz dos tributos, que, como veremos,
também se mostram como balizas para o trato com o tempo
dos tributos, tendo em conta a unidade da regra-matriz.
4.2 Da norma jurídica: unidade do sistema jurídico
e plurivocidade da nomenclatura
Como afirmado pelo autor da epígrafe deste capítulo, o
mundo é alterado “mediante a linguagem das normas, uma
classe da qual é a linguagem das normas do Direito”. A lingua-
gem jurídico-normativa é a linguagem pela qual o Direito vei-
cula seus comandos, isto porque as normas são as unidades
do seu sistema.
Entretanto, importa consignar que a expressão norma ju-
rídica padece dos vícios linguísticos da ambiguidade e da va-
guidade, motivo pelo qual mesmo tomando a ideia nuclear de
norma como unidade do sistema jurídico é possível verificar
seu emprego em mais de um sentido.
A construção do seu significado tende a diferir em razão
do ponto de partida do intérprete do direito, isso porque, con-
forme já estudado, a aproximação e construção de sentido do
fenômeno jurídico demanda a trajetória – mesmo que intuitiva
–, pelos quatro planos da interpretação: o plano da literalidade
textual (S1), o plano do conteúdo de significação dos enunciados
prescritivos (S2), o plano da articulação das significações nor-
mativas (S3) e o plano da organização sistemática (S4).217
217. O cotejo entre as diversas acepções da expressão norma jurídica com os planos
em que o fenômeno jurídico pode ser surpreendido foi realizada a partir das lições do
mestre
Paulo de Barros Carvalho
sobre o percurso gerador de sentido. Portanto,
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O TEMPO E O TRIBUTO
Destarte, podemos nos deparar com a expressão norma
jurídica sendo utilizada tanto para indicar o enunciado pres-
critivo, texto bruto tal qual produzido pelo legislador, quando
surpreendida no plano da expressão (S1); como às proposi-
ções jurídicas, compreendidas como conteúdo significativo
atribuído pelo intérprete a partir da leitura dos enunciados
prescritivos, se tomada no plano das significações (S2); ou,
ainda, como a própria norma em sentido estrito, cuja estrutu-
ra hipotético-condicional é construída a partir da associação
das proposições elaboradas no plano anterior (S3) e que será
marcado pelas relações de coordenação e graduação hierár-
quica existentes entre si (S4).
Sob o abrigo da expressão norma jurídica, podem-se en-
contrar todas essas noções. “O sistema compreende tudo isso,
suporte físico, significação e estruturação, numa trialidade
existencial indecomponível”218, sendo inócuo o debate sobre
um sentido certo ou errado.
A pureza do discurso científico, no entanto, requer uma
maior delimitação possível no sentido dos termos linguísticos
que se está a trabalhar. Portanto, e considerando a variação
conceitual apresentada sobre a expressão norma jurídica,
mostra-se de grande valia a classificação das normas em senti-
do amplo e sentido estrito: as primeiras dizendo respeito tanto
aos enunciados prescritivos isoladamente considerados (fra-
ses como suporte físico) quanto às significações a partir deles
construídos (proposições); e as segundas, compreendendo as
significações em sentido deôntico completo, estruturadas na
forma hipotético condicional (HC) construídas pelo intér-
prete a partir da leitura dos textos legais.
Tais cortes metodológicos possibilitam reduzir as com-
plexidades da linguagem jurídica para chegar à já apregoada
indica-se como referência para a proposta desse trecho a sua obra Direito tributário:
Fundamentos jurídicos da incidência. 7. ed. São Paulo: Saraiva, 2009, p. 88 et seq.
218. CARVALHO, Aurora Tomazini de. Curso de teoria geral do direito: o constructi-
vismo lógico-semântico. 2. ed. São Paulo: Noeses, 2010, p. 338-339.

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