Regulação do risco ambiental nanotecnológico e participação democrática: Possibilidades e óbices

AutorMateus de Oliveira Fornasier
CargoDoutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS)
Páginas63-95
63
Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.12 n.24 p.63-95 Julho/Dezembro de 2015
REGULAÇÃO DO RISCO AMBIENTAL
NANOTECNOLÓGICO E PARTICIPAÇÃO
DEMOCRÁTICA: POSSIBILIDADES E ÓBICES1
1 Artigo produzido como resultado parcial do projeto “Novas Tecnologias, Direitos Humanos e Res-
ponsabilidade”, desenvolvido no âmbito do Programa de Pós-Graduação stricto sensu (Mestrado) em
Direito da Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUI).
Mateus de Oliveira Fornasier
Doutor em Direito pela Universidade do Vale do Rio dos Sinos (UNISINOS).
Mestre em Direito pela Universidade Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul
(UNIJUI).
Professor do Mestrado em Direitos Humanos da Universidade
Regional do Noroeste do Estado do Rio Grande do Sul (UNIJUI).
E-mail: mateus.fornasier@unijui.edu.br
RESUMO
Este artigo objetiva observar o décit social de percepção do signica-
do das nanotecnologias pelos cidadãos comuns (não especialistas), o qual
opera como óbice ao princípio da Participação Democrática para a regula-
ção do meio ambiente ecologicamente equilibrado, insculpido no art. 225
problema de pesquisa foi: que benefícios e óbices o princípio constitu-
cional da Participação Democrática encontra na sociedade para a regu-
lação do risco nanotecnológico? Como hipótese, tem-se que, apesar dos
mandamentos constitucionais que abrem margem para diversos meios de
participação democrática desde 1988, o maior óbice com que se depara o
jurista ao analisar a ecácia social dessas normas é a disparidade de co-
nhecimento acerca das nanotecnologias entre os setores já ocupados com o
desenvolvimento nanotecnológico e o público em geral. Para a consecução
deste objetivo geral, dividiu-se o trabalho em três seções, cada uma corres-
pondente a um objetivo especíco: a) apresentar as características básicas
das nanotecnologias, bem como o que há de benéco para o homem e o
meio ambiente em seu desenvolvimento; b) analisar as possibilidades de
ocorrer o desenvolvimento nanotecnológico em países como o Brasil; c)
demonstrar que, mesmo sendo constitucional a participação democrática
para a regulação das nanotecnologias, ainda se está diante de uma total
disparidade de entendimento em relação às nanotecnologias, nas opiniões
do público em geral e dos cientistas. Como conclusões, tem-se que: a) há
benefícios para o homem e o meio ambiente com o desenvolvimento na-
notecnológico - porém, há grandes riscos também; b) há um risco muito
grande de o desenvolvimento nanotecnológico aumentar signicativamen-
te o fosso social entre países desenvolvidos e em desenvolvimento; c) há
REGULAÇÃO DO RISCO AMBIENTAL NANOTECNOLÓGICO E PARTICIPAÇÃO DEMOCRÁTICA: POSSIBILIDADES...
64 Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.12 n.24 p.63-95 Julho/Dezembro de 2015
grande disparidade na percepção das nanotecnologias entre leigos e espe-
cialistas, dicultando sua regulação democrática. A metodologia utilizada
neste artigo é hipotético-dedutiva.
Palavras-chave: Nanotecnologias; Risco Ambiental; Regulação; Partici-
pação Democrática.
REGULATION OF NANOTECHNOLOGIC RISK AND DEMOCRATIC
PARTICIPATION AND: POSSIBILITIES AND OBSTACLES
ABSTRACT
This article aims to observe the social decit around the perception of
the meaning of nanotechnologies by ordinary citizens (not experts), which
operates as an obstacle to the principle of democratic participation
for regulation of ecologically balanced environment, inserted in art.
225 of the 1988 Constitution. Its research problem was: what benets
and obstacles the constitutional principle of democratic participation
faces in society for regulation of nanotechnology risk? As a hypothesis
it follows that, despite the constitutional commandments that open room
for various means of democratic participation since 1988, the greatest
obstacle faced by the jurist when analyzing the social effectiveness of these
standards is the knowledge gap about nanotechnology among the sectors
already working with nanotechnological development and the general
public. To achieve its general objective, the work was divided into three
sections, each corresponding to a specic objective: a) to present the
basic characteristics of nanotechnology and what is benecial for man
and the environment in its development; b) to examine the possibilities
to occur the nanotechnological developing countries like Brazil; c) to
demonstrate that, even though democratic participation for regulation of
nanotechnology is constitutional, we are still facing an overall disparity
of understanding about nanotechnologies in general public’s opinions, as
well as among scientists. In conclusion, we found that: a) there are benets
to mankind and to the environment with nanotechnology development –
however, there are also great risks; b) there is a very great risk of seeing
nanotechnological development signicantly increase the social gap
between developed and developing countries; c) there is a great disparity in
perception of nanotechnology among lay people and experts hindering its
democratic regulation. The methodology used in this paper is hypothetical-
deductive..
Keywords: Nanotechnologies; Environmental Risk; Regulation;
Democratic Participation.
Mateus de Oliveira Fornasier
65
Veredas do Direito, Belo Horizonte, v.12 n.24 p.63-95 Julho/Dezembro de 2015
INTRODUÇÃO
As nanotecnologias,2 quando observadas a partir do ponto de vista
do jurista ocupado com questões ambientais, representam terreno caracte-
rizado pela contingência: há possibilidades extremamente benécas para o
ser humano e para o ambiente com o seu desenvolvimento; ao lado disso,
contudo, apresentam-se possibilidades catastrócas concernentes ao seu
uso desmedido e desregrado. Desta feita, é notável a necessidade de regu-
lação jurídica da matéria - seja em caráter legislativo especíco (produção
de leis relacionadas às nanotecnologias), seja em caráter legislativo-judi-
cial (interpretação de dispositivos de leis válidas que possam ser aplicadas
à matéria, de acordo com a doutrina e a jurisprudência).
Brasil de 1988 - CR/88, em vários de seus dispositivos normativos (mor-
mente, no que interessa para o tema ora abordado, o caput de seu artigo
225), normatiza acerca da participação democrática como meio para a cons-
trução da regulação jurídica de questões concernentes ao meio ambiente.
Sendo assim, tem-se que, não apenas do poder público, mas também da
coletividade (entendida esta tanto como os cidadãos individualmente con-
siderados quanto como as organizações que possam vir a estabelecer-se
nos mais variados contextos), é o dever de preservar o meio ambiente - e
por aqui perpassa a questão da construção democrática da regulação do
risco ambiental.
Em razão do estabelecimento deontológico relacionado à regula-
ção do risco ambiental - da qual se impende a necessidade de participação
democrática (em norma constitucional ecaz) confrontada com as possibi-
lidades socialmente apresentadas de operacionalização desta norma (veri-
cação da efetividade da norma), o presente trabalho ocupa-se da seguinte
questão: que benefícios e óbices o princípio da Participação Democrática
encontra na sociedade para a construção da regulação do risco nanotecno-
lógico?
A hipótese que se apresenta como resposta a este questionamento
é que, apesar da deontologia constitucional e dos diversos meios de parti-
cipação democrática que a ordem de 1988 trouxe como possibilidades de
2 Algumas explicações terminológicas: nanociência é termo que designa a área do conhecimento con-
cernente aos princípios fundamentais de moléculas e estruturas, em que ao menos uma das dimensões
está compreendida entre cerca de 1 e 100 nm (nanoestruturas). Um nanômetro (“nm”, em sua abrevia-
tura) é a bilionésima parte do metro (1m x 10-9), ou seja: 0,000000001 m (FEYNMAN, 2004, p. 27).
Já por nanotecnologias se dene a aplicação das nanoestruturas em dispositivos nanoescalares úteis.
(RATNER; RATNER, 2003, p. 13).

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT