Relação jurídica de consumo

AutorJoão Marcos Alencar Barros Costa Monteiro
Páginas61-93
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relAção jurídicA
de consumo
Para aplicar as normas do CDC, é necessário analisar, em pri-
meiro lugar, o conceito de relação jurídica de consumo e, assim, identi-
ficar a figura do consumidor e fornecedor.
A relação jurídica é um vínculo que une duas ou mais pessoas,
caracterizando-se uma como o sujeito ativo e outra como o sujeito pas-
sivo da relação. Esse vínculo decorre da lei ou do contrato, e, em conse-
quência, o primeiro pode exigir do segundo o cumprimento de uma
obrigação, consistente em uma prestação do tipo: dar, fazer ou não fa-
zer. Porém, se houver incidência do CDC na relação, isto é, se uma das
partes se enquadrar no conceito de consumidor e outra no de fornece-
dor e entre elas houver nexo de causalidade capaz de obrigar uma a
entregar a outra uma prestação, estaremos diante de uma relação de
consumo. Desse modo, relação jurídica de consumo é definida como o
vínculo jurídico através do qual uma pessoa física ou jurídica, denomi-
nada consumidor, adquire ou utiliza produto ou serviço de outra pes-
soa, denominada fornecedor.
A Responsabilidade Civil nas Relações de Consumo62
3.1. Conceito de consumidor no CDC
3.1.1. Consumidor stricto sensu
O CDC estabelece em seu art. 2º o conceito de consumidor, afir-
mando: “Consumidor é toda pessoa física ou jurídica que adquire ou
utiliza produto ou serviço como destinatário final”.
O legislador assim definiu no caput do aludido artigo o conceito
jurídico de consumidor padrão, estabelecendo como consumidor qual-
quer pessoa natural ou jurídica que adquire ou utiliza produto ou ser-
viço como destinatário final, ou seja, para o seu uso pessoal ou de sua
família, não comercializando o serviço ou produto.
Verifica-se que são três os elementos que compõem o conceito de
consumidor. Primeiro, o elemento subjetivo – pessoa física ou jurídica;
segundo, o elemento objetivo – aquisição de produtos ou serviços; por
último, o elemento teleológico – a finalidade pretendida com a aquisi-
ção do produto ou serviço, esse terceiro elemento é caracterizado pela
expressão “destinatário final”.
A princípio, a lei define consumidor, de forma estrita, onde a
doutrina denomina tal figura stricto sensu ou standard – o consumidor
só é assim considerado, seja pessoa física ou jurídica, quando adquire o
produto ou serviço como destinatário final.
Ora, de acordo com o caput do art. 2º, a única característica restri-
tiva para se alcançar o conceito de consumidor seria a aquisição do bem
como destinatário final. Mas o que se entende por destinatário final? É
o sujeito que retira do mercado o bem, ou seja, o que adquire o produto
ou serviço para uso próprio ou de sua família, sem comercializar.
E se o profissional adquire o produto não para comercializá-lo,
mas sim para colocá-lo em seu trabalho, é considerado como destinatá-
rio final?
Para a doutrina finalista, ensina Claudia Lima Marques1:
1 MARQUES, Claudia Lima. Contratos no Código de Defesa do Consumidor. 4.
ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 53.
3. Relação jurídica de consumo 63
Destinatário final é aquele destinatário fático e econômico do bem ou
serviço, seja ele pessoa jurídica ou física. Logo, segundo esta interpre-
tação teleológica não basta ser destinatário fático do produto, retirá-lo
da cadeia de produção, levá-lo para o escritório ou residência, é ne-
cessário ser destinatário final econômico do bem, não adquiri-lo para
revenda, não adquiri-lo para o uso profissional, pois o bem seria no-
vamente um instrumento de produção cujo preço será incluído no
preço final do profissional que o adquiriu. Neste caso não haveria a
exigida destinação final do produto ou serviço.
Assim, destinatário final é o que retira o bem do mercado ao
adquirir ou simplesmente o utilizar (destinatário final fático), é aque-
le que coloca um fim na cadeia de produção (destinatário final econô-
mico), e não aquele que utiliza o bem para continuar a produzir, pois
ele não é consumidor final, já que está transformando e utilizando o
bem para oferecê-lo, por sua vez, ao cliente, consumidor real do pro-
duto ou serviço.
Um exemplo clássico seria do dono do restaurante que adquire
mesas para o seu estabelecimento comercial e o produto apresenta de-
feito. Esse profissional poderia ser classificado como consumidor? Há
destinação final? A crítica que se faz é que nesses casos, apesar de não
estar comercializando o produto, não se trata de produto de consumo e
sim de insumo, razão de a teoria finalista não o aceitar como consumi-
dor, pois não é destinatário final. Já a outra teoria, a maximalista, o
aceita, pois o produto foi retirado do mercado.
Para essa teoria objetiva (maximalista), baseada no conceito jurí-
dico de consumidor, o CDC é visto de uma maneira bem mais ampla,
abrangendo um número cada vez maior de relações, pelas quais as nor-
mas inseridas nesse diploma devem regular a sociedade de consumo
como um todo. O destinatário final seria para tal corrente somente o
destinatário fático, pouco importando a destinação econômica que lhe
deva sofrer o bem.
Temos ainda a teoria finalista aprofundada ou mitigada, que vem
ampliar o conceito de consumidor, incluindo todo aquele que possua
vulnerabilidade em face do fornecedor. Decorre da mitigação dos rigo-

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