República dos Injustiçados

AutorAlbino Freire
CargoEscritor
Páginas265-266

Page 265

Em Avilã é assim: réu nenhum é culpado. Não confessa o crime, como não reconhece o óbvio, nem sob tortura. Vai negar até o fim e, sistematicamente, vai “repudiar com veemência” as acusações. É engraçado, mas parece existir um pacto entre eles. Todos, simplesmente todos, são inocentes. Eu não fiz nada errado e sei que você também não fez. Mas, se você me dedurar, vai se haver comigo! Agora, naquele reino, políticos corruptos são caçados (sic), um por um, como coelhos assustados. Virou um pandemônio. Primeiro, vem a fase da indignação, da negação pura e simples dos malfeitos. Como podem eles, cidadãos de bem, acima de qualquer suspeita, que há décadas vinham sendo eleitos pelo voto popular, podem agora ser presos assim, sem mais nem menos, como reles bandidos, e desgarrados das gordas tetas, digo, dos altos cargos que ocupam, alvo da sanha arbitrária de um juizeco indomável?

Ora, é tudo mentira! São invencionices dos órgãos investigadores,

Page 266

ilações apenas, sem qualquer embasamento fático.

Quer dizer, então, que setenta delatores, os empreiteiros da mesma empresa, estão pedindo desculpas à nação por nada? E desembolsando alguns bilhões de dracmas (moeda de Avilã) como compensação pelos prejuízos causados ao reino naquele “doloroso episódio”... e denunciando os calhordas pelos incalculáveis desvios de dinheiro público... Quer dizer, então, que todas essas testemunhas estão conluiadas e mentindo, fantasiando, com o objetivo único de prejudicar esses abnegados políticos?

Meu amigo Roger, embaixador de Avilã, sempre me faz recordar uma foto antiga de alto dignitário do governo avilão, a qual foi estampada nos jornais do mundo inteiro, em que o sujeito aparecia no cárcere, com o braço esquerdo alevantado e punho cerrado, em sinal de protesto e de arrogância.

Depois de algum tempo no xilindró, depois de limpar muita privada e fazer faxina no presídio, o canalha foi baixando a bola, foi se calando, foi amansando, até cair no merecido ostracismo.

Roger me conta ainda casos incríveis da corrupção generalizada em seu reino. O fato mais curioso é o daquele ex-governante que continua dizendo que nunca percebeu nada de errado, em seu mandato; que não sabia de quadrilha nenhuma e desconhecia “supostos” esquemas fraudulentos contra o erário, mas no entanto ele próprio encheu as burras com dinheiro da propina que serviu também para enriquecer, num passe de mágica, toda sua família.

Como conseguiu esse milagre de amealhar tanta grana e...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT