A ressignificação do ativismo judicial pela evolução jurisprudencial do supremo tribunal federal

AutorFelipe Viégas
Páginas371-387
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Vol.93 N.01 - Anno CX XX
VIÉGAS, Felipe. A RESSIGNIFICAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL PELA EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. Revista Acadêmica da Faculdade de Dire ito do Recife - ISSN: 2448-2307, v. 93, n.1, p.371-387 Abr. 2021.
ISSN 2448-2307. <Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMIC A/article/view/249829>
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A RESSIGNIFICAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL PELA EVOLUÇÃO
JURISPRUDENCIAL DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL
THE RESIGNIFICATION OF JUDICIAL ACTIVISM BY THE EVOLUTION OF
JURISPRUDENCE OF THE SUPREME FEDERAL COURT
Felipe Viégas1
RESUMO
De há muito cresce a tensão entre os Poderes da República, fruto da problemática
separação funcional das instituições democráticas. Os interesses políticos dos destinatários das
decisões judiciais, em muitos dos casos, são diametralmente opostos, o que torna dificultosa a
delimitação da atuação funcional de cada Poder. Nesse contexto, o presente estudo objetiva
trazer uma nova visão ao instituto do ativismo judicial. Embora, tradicionalmente, o termo
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Judiciário, ver-se que nem toda decisão judicial que interfira, em certa medida, em funções
típicas de outros Poderes, é uma decisão negativamente ativista. Essa visão contemporânea do
ativismo judicial, inclusive, vem sendo progressivamente solidificada na jurisprudência do
Supremo Tribunal Federal.
Palavras-chave: Ativismo judicial. Poder Judiciário. Supremo Tribunal Federal.
ABSTRACT
The tension between the Powers of the Republic has long been growing, the result of the
problematic functional separation of democratic institutions. The political interests of the
recipients of judicial decisions, in many cases, are diametrically opposed, which makes it
difficult to delimit the functional performance of each branch. In this context, the present study
aims to bring a new vision to the institute of judicial activism. Although, traditionally, the term
   the negative connotation about a possible excess of the Judiciary's
performance, it will be seen that not every judicial decision that interferes, to a certain extent, in
typical functions of other Powers, is a decision negatively activist. This contemporary view of
judicial activism, in fact, has been progressively solidified in the jurisprudence of the Supreme
Federal Court.
Keywords: Judicial activism. Judicial power. Federal Court of Justice.
1 INTRODUÇÃO
É tarefa complexa definir o que é ativismo, identificar num julgado quando há ou não
uma decisão efetivamente ativista. Porém, há de se ressaltar que o aumento da criatividade da
jurisdição constitucional digamos assim -, sobretudo na resolução de questões estruturais, não
1 Mestre em Direito Constitucional pelo Instituto Brasiliense de Direito Público IDP. Especialista em Direito
Ambiental, Administrativo e Econômico pela UNIVALE e em Direito Público pela ESMAPE. Graduado em
Comunicação Social pela UNICAP. Advogado da União da Advocacia-Geral da União (AGU). Coordenador-Geral
de Atos Normativos e Matérias Residuais da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN), no Ministério da
Economia.
Recebimento em 12/03/2021
Aceito em 20/04/2021
REVISTA ACADÊMICA
Faculdade de Direito do Recife
Vol.93 N.01 - Anno CX XX
VIÉGAS, Felipe. A RESSIGNIFICAÇÃO DO ATIVISMO JUDICIAL PELA EVOLUÇÃO JURISPRUDENCIAL DO SUPREMO
TRIBUNAL FEDERAL. Revista Acadêmica da Faculdade de Dire ito do Recife - ISSN: 2448-2307, v. 93, n.1, p.371-387 Abr. 2021.
ISSN 2448-2307. <Disponível em: https://periodicos.ufpe.br/revistas/ACADEMIC A/article/view/249829>
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deriva de nenhum “Big Bang” democrático. Ele advém, dentre outras questões a seguir
analisadas, da natural conquista de espaço pelo Judiciário quando os demais Poderes estão
enfraquecidos, seja no âmbito institucional, jus-político ou mesmo no reconhecimento popular.
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norte-americanas, na forma do “judicial activism”. Conquanto a ideia de ativismo seja recente, a
noção da atuação contramajoritária é inata da jurisdição constitucional, como se demonstrará
neste trabalho. Para introduzir a imersão no tema, Branco (2011, p. 389) expõe uma didática
síntese histórica sobre a origem do ativismo judicial:
A própria nomenclatura judicial activism surgiu num co ntexto não-técnico, objeto de
           
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descrever as profundas divisões ideológicas entre os nove membros da Suprema Corte
americana em 1947. Não estava motivado por nenhum pro pósito de declinar alguma
teoria do papel do Judiciário; ao contrário, a matéria se concentrava em revelar as
antipatias que o s juízes nutriam uns pelos outros e as suas divergências pessoais, vistas
como a melhor explicação para as polarizações de mérito nas questões levadas ao
Tribunal. Tratava-se, pois, de um relato de mexericos com o evidente intuito de cativar
um público leigo, convidado a reconsiderar a reverência por uma instituição que era
pouco conhecida na sua intimidade.
Observa-se, então, que o uso embrionário do termo ocorreu sem qualquer base conceitual
ou metodológica. Isto é, o ativismo judicial, desde o seu emprego incipiente, não teve o condão
de adjetivar, seja pejorativamente ou não, um modo de atuação da jurisdição para além das suas
competências constitucionais. Mas, afinal, decisões ativistas são boas ou ruins? Trata-se de
fenômeno neutro ou que merece receber um juízo moral? O ativismo do Judiciário é um fato de
direita, de esquerda ou neutro?
Barroso (2008, p. 25-66) faz interessante reflexão sobre as razões de aumento da
ingerência do Judiciário no enfrentamento de casos que abordam políticas públicas:
Nos últi mos vinte anos, o Judiciário ingressou na paisagem institucional brasileira. Já
não passa despercebido nem é visto com indiferença ou distanciamento. Há mais de u ma
razão para esse fenômeno. A ascensão do Poder Judiciário se deve, em primeiro lugar, à
reconstitucionalização do país: recuperadas as liberdades democráticas e as garantias da
magistratura, juízes e tribunais deixaram de ser um departamento técnico especializado
e passara m a desempenhar um papel político, dividindo espaço com o Legislativo e o
Executivo. Uma segunda raz ão foi o aumento da demanda por justiça na sociedade
brasileira. De fato, sob a Constituição de 1988, houve uma revitalização da cidadania e
uma maior conscientização das pessoas em relação à proteção de seus interesses.
Neste diapasão, será objetivo basilar deste trabalho delinear o modo de se preservar a
separação dos Poderes quando da execução das medidas estruturantes. É dizer, de que forma as
determinações do Judiciário para que sejam emanados atos administrativos ou normativos serão
fiscalizados? Se no tradicional estudo doutrinário sobre o ativismo judicial já se indicava a
possibilidade de tensão entre os Poderes, maior será a complexidade na análise do Estado de
Coisas Inconstitucional - ECI, que permite ao Judiciário uma interferência institucional em todas
as esferas de Poder, estados, órgãos e autoridades públicas.
A fixação desses limites, desafio de extrema relevância atual, será, inclusive, enfrentada
pelo Supremo Tribunal Federal nas decisões estruturais vindouras em que expressamente se
reconhecer a aplicabilidade da tese em processos que demandem reformas estruturais, a exemplo
do que se viu no reconhecimento, pelo Supremo, do referido ECI na Arguição de
Descumprimento de Preceito Fundamental (ADPF) 347/DF.
Forçoso, pois, no contexto embrionariamente apresentado, que o escopo de aplicação da
tese seja delimitado, porquanto a utilização da tutela jurisdicional para a correção generalizada de
todas as hipóteses de lesão à direito subverte a própria razão de existir do instituto, tornando-o,

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