Saneamento e contratos de programa: o 'início', o 'fim' e o 'meio

AutorKleber Zanchim
Páginas673-690
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SANEAMENTO E CONTRATOS DE
PROGRAMA: O “INÍCIO”, O “FIM”
E O “MEIO”
KLEBER ZANCHIM
Sumário: Introdução. 1. Contratos de Programa: o “Início”. 2.
Contratos de Programa: o “Fim”. 2.1 Insustentabilidade jurídico-
social dos Contratos de Programa. 2.2 Experiência de
desestatização: o caso do Chile. 2.3 CEDAE como marco do
“fim” dos Contratos de Programa no saneamento. 3. Contratos
de Programa: O “meio”, com restrição à sua celebração aos casos
de desinteresse privado. Referências Bibliográficas.
INTRODUÇÃO
O tema desta breve reflexão foi objeto de debates no âmbito da
Comissão Permanente de Estudos do Direito do Saneamento do Insti-
tuto dos Advogados de São Paulo. Dois temas compunham o principal
pano de fundo: (i) o problema de disponibilidade hídrica no Brasil, que
materializou uma crise severa no Estado de São Paulo entre 2014 e 2016,
e (ii) as barreiras jurídicas que restringem a entrada de empresas privadas
no setor de saneamento brasileiro.
De forma resumida, pode-se dizer que as discussões, amparadas por
análises multidisciplinares lastreadas em informações produzidas por enti-
dades ligadas ao saneamento, apontaram para (i) ineficiência na gestão dos
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recursos hídricos, seja no tocante à produção e à distribuição de água,
seja no tocante ao tratamento de esgoto, e (ii) uma tensão na relação
entre estatais de saneamento e empresas privadas, cercada de discurso
com fundo ideológico sobre o papel do Estado nesse seguimento.
Atualizando a temática há, hoje, um novo elemento importante
a se considerar: a necessidade de alguns Estados de privatizarem suas
companhias de saneamento para reorganizarem as contas públicas. Isso
não elimina, por óbvio, o conteúdo ideológico mencionado acima, mas
abre espaço para se debater uma eventual mudança de paradigma na
estrutura do saneamento básico nacional, migrando paulatinamente de
uma matriz pública para uma privada.
Talvez o primeiro grande caso nessa linha seja o da Companhia
Estadual de Águas e Esgotos do Rio de Janeiro (CEDAE). O Estado do
Rio de Janeiro entrou em situação de insolvência no ano de 2016, ten-
do decretado estado de calamidade pública.1 Partiu em busca de auxílio
federal e, diante dos sinais de maior austeridade fiscal emitidos pela União
a partir de meados daquele ano, recebeu uma série de exigências para
obter qualquer ajuda. Uma delas foi a privatização da CEDAE.2 A me-
dida gerou reações de diversos grupos de interesse, cujo pensamento
pode ser condensado na manifestação do Vice-Presidente da Associação
dos Empregados de Nível Universitário da CEDAE:3
[v]ale lembrar que a Cedae em 2016, além de bancar o término
das obras Olímpicas com recursos próprios, uma vez que o Estado
faltou com tais recursos, ainda conseguiu pagar ao seu acionista
majoritário, que é o Estado, mais de R$ 300 milhões. Vender
1 Cf. “Estado de calamidade pública no RJ é publicado no Diário Oficial”. G1, 09 de
novembro de 2016. Disponível online em http://g1.globo.com/rio-de-janeiro/
noticia/2016/11/estado-de-calamidade-publica-no-rj-e-publicado-no-diario-oficial.html.
2 Cf. Governo federal fecha acordo de ajuda financeira ao Rio de Janeiro. BRASIL: Palácio do
Planalto, disponível em http://www2.planalto.gov.br/acompanhe-planalto/
noticias/2017/01/governo-federal-fecha-acordo-de-ajuda-financeira-ao-rio-de-janeiro
3 “Privatização da Cedae vai afetar os mais pobres, diz representante da Aseac”. Jornal do
Brasil, 17 de fevereiro de 2017. Disponível online em http://www.jb.com.br/rio/noti-
cias/2017/02/17/privatizacao-da-cedae-vai-afetar-os-mais-pobres-diz-representante-da-
-aseac.

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