Saneamento Como Importante Elemento do Direito à Cidade: Ponderações Sobre a Política Municipal de Saneamento em São Paulo

AutorJulia Azevedo Moretti - Ricardo de Sousa Moretti
CargoPontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil - Universidade Federal do ABC, Santo André-SP, Brasil
Páginas61-81
Saneamento Como Importante Elemento
do Direito à Cidade: Ponderações Sobre a
Política Municipal de Saneamento em
São Paulo
Julia Azevedo Moretti*
Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, São Paulo-SP, Brasil
Ricardo de Sousa Moretti**
Universidade Federal do ABC, Santo André-SP, Brasil
Introdução
O estabelecimento de diretrizes nacionais para o saneamento básico por
meio da Lei nº 11.445/07 ganha relevância em um contexto de profunda
desigualdade no acesso a recursos e serviços do meio ambiente urbano.
Essa injustiça ambiental na área do saneamento é evidenciada por estudos
que demonstram haver uma sobreposição das vulnerabilidades ambientais
e sociais que reforçam a desigualdade: estatísticas mostram um alarmante
universo de pessoas desatendidas, com a concentração do déf‌icit em abas-
tecimento e esgotamento sanitário nas faixas de menor renda domiciliar.
As políticas públicas de saneamento em um contexto de urbanização
acelerada, concentrada, desigual e excludente - marca do desenvolvimento
urbano nacional - devem estar articuladas com as políticas urbanas e cen-
tradas na af‌irmação do direito à cidade. O conceito de direito à cidade,
com suas dimensões participativa e distributiva, aplicado ao saneamento
pode contribuir para a concretização dos princípios, objetivos e diretrizes
Direito, Estado e Sociedade n.45 p. 61 a 81 jul/dez 2014
* Mestre pela University College London e Mestranda em Direito Urbanístico pela PUC-SP. Advogada.
E-mail: jamoretti@pucsp.br
** Professor titular da Universidade Federal do ABC com atuação no programa de pós-graduação em
Planejamento e Gestão do Território e nos cursos de graduação em Engenharia Ambiental e Urbana e no
Bacharelado em Planejamento do Território. E-mail: ricardo.moretti@ufabc.edu.br
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estatuídos na Lei nº 11.445/07, em especial a universalização, a integrali-
dade, a observância de peculiaridades regionais e locais, a articulação com
politicas setoriais e participação social.
Nesse sentido, interessa analisar a Política Municipal de Saneamento
na cidade de São Paulo a partir de instrumentos legais e contratuais vigen-
tes, confrontando-os com o conceito de direito à cidade. Pode-se, assim,
avaliar as bases existentes para coordenar os meios e atividades necessários
para programas de ação governamentais, conf‌igurando políticas públicas
de saneamento aptas a enfrentar desaf‌ios sociais sem perder de vista a sus-
tentabilidade econômica, assegurando, assim, um meio ambiente equili-
brado essencial à sadia qualidade de vida (art. 225, Constituição) e um
ambiente urbano apto a propiciar o bem-estar de seus habitantes (art. 182,
1. Saneamento como elemento do direito à cidade
1.1 O Direito à Cidade
Vive-se hoje num mundo urbanizado. Dados da Organização das Nações
Unidas (ONU) indicam que mais da metade da população mundial vive em
cidades. O Brasil, segundo dados recentes do Instituto Brasileiro de Geograf‌ia
e Estatística (IBGE), atingiu uma taxa de urbanização de aproximadamente
85% e em cidades como São Paulo a taxa de urbanização chega a 99%1.
Porém, o processo de rápida urbanização no Brasil, acompanhado por uma
industrialização com baixos salários (MARICATO, 1996), é marcado por
crescentes desigualdades e segregações socioterritoriais. Nesse cenário, a
informalidade estruturou a construção do espaço urbano e continua a afe-
tar parcela signif‌icativa da população.
Com efeito, a situação habitacional no Município de São Paulo, por
exemplo, é absolutamente precária: mais de 32% dos habitantes moram em
assentamentos informais, como favelas, loteamentos irregulares e cortiços2,
1 IBGE, Censo 2010.
2 Os números da própria Prefeitura indicam que, em 2007, 14,21% da população do município (1,5 milhões
pessoas) habitava em favelas, 16,46% (1,8 milhões) dos habitantes encontrava-se em loteamentos informais
e 5,95% (645 mil) tinha moradia em área de mananciais (SÃO PAULO, 2008). Dados recentes do IBGE,
divulgados no mapa de favelas publicado pelo jornal Folha de São Paulo indicam que a taxa de pessoas
morando em favelas é de 11,4% (FOLHA DE SÃO PAULO, 2013), dado compatível com a pesquisa municipal.
Julia Azevedo Moretti
Ricardo de Sousa Moretti

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